Título: Concessão nos aeroportos é passo inicial
Autor:
Fonte: O Globo, 28/04/2011, Opinião, p. 6
Se ainda é acanhada a decisão do governo federal de bater o martelo pela concessão parcial à iniciativa privada dos cinco principais aeroportos do país, também é inegável que o movimento deve ser saudado como passo fundamental para desbloquear gargalos. O dogma petista de administrar o sistema aeroportuário do país com obsessões ideológicas, em lugar de ações efetivas para melhorar e aumentar a capacidade operacional dos terminais, bloqueou desde o primeiro governo Lula quaisquer atos que afastassem a paquidérmica máquina estatal da Infraero do setor.
Deu no que deu: apagões aéreos, com filas nos guichês, atrasos nos voos, serviços ineficientes e desconforto nos saguões. Ao aumento da demanda de passageiros não correspondeu, em igual escala, o desenvolvimento da malha aeroportuária, a ponto de o radar do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) detectar nuvens pesadas na cabeceira de nove dos 13 aeroportos das cidades que vão sediar jogos da Copa em 2014. Segundo o órgão, mantido o atual ritmo da planilha de obras, sete deles só ficarão prontos em 2017, e dois em 2016 - fora do prazo para o Mundial, e mesmo para as Olimpíadas. O estudo chama a atenção para o problema do monopólio da Infraero na administração dos terminais. Ela teria de passar por um choque de gestão para comandar os investimentos no setor, e não há mais tempo para isso.
Espera-se que as preocupantes previsões sejam afastadas com a decisão da presidente Dilma de definir os modelos de concessão para Guarulhos, Viracopos e Brasília, e ainda com a conclusão imediata de estudos para estender o projeto a Confins e ao Galeão. No entanto, a mudança de rumo que se desenha, por si só, não acaba com os riscos de colapso do sistema aeroportuário. Corrigiu-se a rota, mas é fundamental que o governo dê demonstrações de ter capacidade gerencial de agilizar os procedimentos que, de fato, possam atrair a iniciativa privada.
Este é o lado preocupante da equação: antes tarde do que nunca, quebrou-se o dogma, mas como a decisão veio tarde (deve-se lembrar que o projeto de abertura da participação da iniciativa privada nos aeroportos ficou relegado às gavetas de Dilma Rousseff quando ela era a poderosa chefe da Casa Civil), o governo petista precisa mostrar uma agilidade gerencial que não apresentou nos oito anos de administração Lula, para o projeto de concessões parciais ser executado a tempo. E não só devido aos dois grandes eventos esportivos internacionais: o próprio crescimento do mercado interno exige soluções urgentes para atender a uma demanda que se revela bem maior que a atual capacidade operacional dos terminais. Desmanchar esse nó implica necessariamente rever o papel da Infraero no desenvolvimento do setor no país.
Criada durante o ciclo militar com a promessa de funcionar com menos de mil empregados, a estatal transformou-se numa estrutura com 20 mil funcionários - um cabide de empregos inchado ao extremo, onde sobram vagas para apaniguados de Brasília e falta eficiência (do que o caos no gerenciamento da malha aérea do país é prova inconteste). Portanto, deve-se saudar a mudança de hábito no Planalto em relação à política aeroportuária, mas é fundamental que, dado o primeiro passo, o governo seja ágil e eficiente para evitar o desastre de pôr a perder a oportunidade de modernizar os aeroportos.