Título: Armas: Tráfico internacional abastecia o Alemão
Autor: Éboli, Evandro
Fonte: O Globo, 29/04/2011, Rio, p. 22

Relatório indica que 77% do armamento apreendido nos complexos da Penha e de Ramos vieram de fora do país

BRASÍLIA. Um relatório oficial e detalhado das forças de segurança que atuaram no Complexo do Alemão e na Vila Cruzeiro revela que, das 289 armas apreendidas nestas localidades, 172 delas (60% do total) são de uso restrito de militares e policiais. O documento aponta que 222 (77%) são de fabricação estrangeira. A maioria do armamento, 160 unidades (56%), é composta de fuzis ou metralhadoras.

Do total apreendido, 20 armas (7%) pertenciam a forças armadas estrangeiras: 14 da Bolívia, três da Argentina, duas do Paraguai e uma da Venezuela. Outras quatro têm como procedência o Exército brasileiro, quatro são identificadas como pertencentes ao governo do Brasil, duas da PM do Rio e uma da Polícia Civil.

O levantamento contém detalhes do armamento - tipo, modelo, fabricante, calibre, país de origem e número de série -, se é de uso restrito ou não e até o número da etiqueta e do laudo da apreensão. E também o item marca de prova, como o Brasão da República na culatra.

Na lista dos armamentos apreendidos há 121 fuzis, 80 pistolas, 23 submetralhadoras, 21 espingardas, 18 revólveres, 16 metralhadoras. Constam também uma arma artesanal, uma pistola de paint ball, uma quebrada (apenas uma peça) e dois armamentos falsos (réplicas).

O relatório chegou às mãos do deputado Francisco Francischini (PSDB-PR), que é delegado da Polícia Federal e leu trechos do documento na reunião de ontem da Comissão de Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado da Câmara. O parlamentar afirmou que o levantamento comprova a presença do tráfico internacional de armas no Brasil e, para ele, desmente estatísticas e a argumentação de que a campanha do desarmamento resolve o problema da circulação de armas no país:

- A campanha de desarmamento não resolve o problema do tráfico internacional. Não atinge essas armas.

Na lista de países fabricantes, o Brasil aparece como o principal fornecedor do narcotráfico, com 67 unidades apreendidas (23%). Na relação, aparecem outro 18 países: Estados Unidos, com 64 armas (22%); Alemanha, Áustria e Bélgica, com 15 armas cada (5%); República Tcheca, 13 armas (4%) e Israel e Itália, dez armas (3%).

Para Francischini, há duas ações possíveis para o governo apreender o armamento estrangeiro: aumentar o orçamento e ampliar a vigilância nas fronteiras e incluir na campanha do desarmamento gratificação para policiais civis, militares, federais e municipais que recolherem o armamento importado.

- Isso diminui a corrupção e vai estimular o policial. O governo estará pagando por produtividade. Em quatro ou cinco anos, ele consegue dobrar seu salário. Os policiais sabem onde estão essas armas e, quando as apreenderem, com o pagamento, não vão repassar a bandidos - afirmou Francischini, que defende gratificações de R$300 a R$600.

A campanha pagará indenização de R$100 a R$300 para o cidadão que entregar sua arma.

A Comissão de Segurança Pública realizou ontem audiência pública com entidades para discutir o desarmamento. O coordenador do programa de controle de armas do Movimento Viva Rio, Antônio Rangel, disse que o contrabando não é o principal abastecedor das ações criminosas:

- Entre 7% e 10% das armas apreendidas no Brasil são estrangeiras. Vamos acabar com esse mito de que o que nos atinge são armas estrangeiras.

O dirigente do Viva Rio citou o massacre ocorrido em Realengo como o exemplo de que são brasileiras as armas de usadas pela criminalidade. Os dois revólveres utilizados por Wellington Menezes foram fabricados no Brasil.