Título: Pressão agora é por lei que criminaliza homofobia
Autor: Freire, Flávio; Farah, Tatiana
Fonte: O Globo, 06/05/2011, O País, p. 9

STF FAZ HISTÓRIA

Para especialistas, decisão do STF pode acelerar tramitação no Congresso do projeto que pune ofensas a gays

SÃO PAULO. Ao mesmo tempo que comemoraram efusivamente o reconhecimento legal da união entre pessoas do mesmo sexo, representantes da comunidade gay avaliaram que a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) pode ainda acelerar a tramitação, no Congresso, do Projeto de Lei Complementar 122, que criminaliza a homofobia. Para especialistas, os parlamentares precisam entender a sinalização do Judiciário e criar leis para pôr na cadeia quem ofender gays, lésbicas, transexuais e outros integrantes da comunidade.

- A decisão do STF vai ser amplamente comemorada na Marcha Nacional contra a Homofobia, que acontece no Rio daqui a duas semanas. O Congresso precisa aprovar a PLC urgentemente, o que protegeria os gays, assim como a Lei Afonso Arinos protege os negros, a Lei Maria da Penha protege as mulheres e aí por diante - disse o presidente da Parada do Orgulho Gay de São Paulo, Iberaldo Luiz Beltrane, para quem os votos favoráveis dos ministros se transformaram em um "divisor de águas" para a comunidade.

- O julgamento deu dois sinais claros: tirou a pauta da discussão moral e religiosa e também mostrou que o Congresso precisa mudar sua postura em relação a diversos temas da sociedade - disse ele.

O ativista Beto de Jesus, presidente do Instituto Edson Neris, também não poupou críticas à atuação do Congresso na discussão do tema:

- Essa decisão jurídica parece que foi a única saída contra um Legislativo conservador e preconceituoso, que parece querer criar expectativas fundamentalistas religiosas contra um Estado laico.

Para Jesus, o fato de homossexuais não terem os mesmos direitos civis que os heterossexuais "é uma vergonha". Para ele, a ideia de que família deve ser aceita apenas se criada por homens e mulheres é um equívoco:

- Quer dizer que, se o homem casa com uma mulher, perde essa mulher e passa a viver apenas com o filho, então significa que os dois não formam uma família porque são dois homens? - indagou.

Diretor da Faculdade de Direito da FGV, Oscar Vilhena atuou como advogado de um dos grupos que propuseram a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI), o Conectas. Ele festejou ontem a decisão do Supremo e afirmou que os ministros garantiram um direito que "é cristalino" na Constituição.

- Todos são iguais perante a lei, e o Código Civil tratava apenas da união entre homem e mulher. Agora, isso será equiparado. Essa decisão é universal, estende-se a todos os que queiram manter uma união homoafetiva.

Vilhena disse que o STF seguiu as decisões que têm se espalhado pelo "mundo democrático, onde essa questão tem sido solucionada em diversos países". Ele negou que a medida do Judiciário se sobreponha a uma iniciativa que deveria partir do Legislativo.

- No caso das células-tronco e do desarmamento, o Judiciário tem defendido o avanço dos legisladores. Mas, nessa questão das relações homoafetivas, os legisladores não haviam avançado porque os homossexuais são um grupo minoritário, e essa não é uma causa simpática. Mas o STF não está inventando nenhum direito. Ele está fazendo valer a Constituição.

Para Angela Ro Ro, decisão do STF é muito bem-vinda

O coro de elogios à postura da Suprema Corte também contou a voz grave da cantora e compositora Angela Ro Ro:

- Tudo o que gera bem-estar, conforto, saúde, estabilidade, direitos e, especialmente, facilita a adoção, acho muito produtivo. Não vejo nada de errado em dois homens ou duas mulheres terem os mesmos direitos de um casal hétero. Acho muito bem-vinda (decisão do STF). Não é porque sou gay. Mesmo que fosse heterossexual, eu concordaria. É mais humano.