Título: Acordo deve reduzir esqueleto
Autor: Allan, Ricardo
Fonte: Correio Braziliense, 04/08/2009, Economia, p. 15

Governo federal negocia com exportadores para evitar ter que desembolsar R$ 288 bilhões com o pagamento do crédito-prêmio do IPI

Caberá ao ministro da Fazenda, Guido Mantega, convencer os empresários a abrir mão de parte do crédito do imposto

O governo e os representantes dos exportadores buscam um acordo para encerrar, ainda nesta semana, a novela do maior esqueleto fiscal da história do país, o crédito-prêmio do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI). Para evitar que uma das partes arque sozinha com uma conta que pode chegar a R$ 288 bilhões, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva determinou ontem ao ministro da Fazenda, Guido Mantega, que procure o setor e negocie ¿exaustivamente¿ até encontrar uma solução. Caso não se chegue a uma proposta que reduza o impacto financeiro nos cofres do Tesouro Nacional, a intenção de Lula é vetar a emenda incluída na Medida Provisória (MP) 460.

O presidente da Câmara, Michel Temer (PMDB-SP), deve pôr em votação o texto aprovado no Senado até quinta-feira. O Palácio do Planalto já dá como certa uma segunda aprovação do dispositivo, inserido pela senadora Lúcia Vânia (PSDB-GO) a pedido da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp). Ao mesmo tempo, aumenta a expectativa de que o Supremo Tribunal Federal (STF) defina o assunto ao julgar um caso representativo e fixar o entendimento a ser aplicado em todos os outros processos sobre o tema. ¿O ideal seria compatibilizar a decisão da Justiça com a do Congresso. Isso dá segurança jurídica ao país¿, afirmou ontem o diretor de Comércio Exterior da Fiesp, Roberto Giannetti da Fonseca.

Principal negociador dos empresários, Giannetti acredita que um acordo pode ser alcançado, com Lula vetando alguns pontos do texto aprovado no Congresso. Esses dispositivos seriam reformulados e apresentados como emenda a uma outra MP em tramitação. A Fiesp, com o apoio das federações industriais de Santa Catarina, Rio Grande do Sul e Paraná, aceita abrir mão de compensar o crédito-prêmio entre 2003 e 2009, num valor de até R$ 110 bilhões. De 1983 a 1990, o benefício já foi usado quase integralmente. De 1991 a 2002, o acumulado seria de R$ 70 bilhões ¿ o ressarcimento soma R$ 50 bilhões, faltando ainda R$ 20 bilhões a serem compensados. ¿É sobre esses valores que estamos falando na verdade¿, disse.

A controvérsia gira em torno de quando o benefício aos exportadores de produtos manufaturados foi extinto. Para a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN) e a Receita Federal, ele não vale mais desde 1983. As empresas afirmam que nenhuma medida o revogou explicitamente. Por isso, o incentivo ainda estaria em vigor. Segundo Giannetti, o governo inflou o valor da conta a ser paga, caso perca, para convencer os ministros do Supremo e ¿comover¿ a opinião pública. ¿A Receita Federal não explica como chegou a esse número de R$ 288 bilhões. Se a tese das empresas perder, o valor atualizado e com multas que elas terão de pagar será de cerca de R$ 200 bilhões¿, disse.

Calibragem Na avaliação do diretor da Fiesp, uma derrota poderia inviabilizar muitas companhias, inclusive com ações negociadas em bolsa. Elas ficariam com o patrimônio líquido negativo, sem bens suficientes para honrar todos os compromissos. Nesse caso, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) poderia obrigar os acionistas a colocar mais dinheiro na companhia. ¿É uma irresponsabilidade deixar esse esqueleto se agigantar. Os empresários fizeram as compensações amparados pela Justiça. A melhor saída é buscar um acordo. O Supremo poderia calibrar a decisão para ter os mesmos efeitos de um acerto no Congresso¿, disse.

Uma solução para facilitar o entendimento poderia ser vincular o uso do benefício a investimentos das empresas, sugeriu Giannetti, ex-secretário executivo da Câmara de Comércio Exterior (Camex) no governo Fernando Henrique Cardoso. Outra possibilidade seria fazer um encontro de contas entre o que as companhias teriam a receber com o que precisarão pagar por causa da decisão judicial de um outro caso rumoroso, o do crédito presumido do IPI para aqueles que pagavam alíquota zero. Essa conta é de cerca de R$ 100 bilhões. A Fazenda negociou os termos da emenda aprovada no Senado, mas recuou por medo de enfraquecer a tese de defesa da PGFN no Supremo.

Herança militar O crédito-prêmio do IPI foi criado pelo regime militar em 1969, pelo então ministro da Fazenda, Delfim Netto. A intenção era estimular o crescimento das exportações de produtos manufaturados, diminuindo a dependência nacional das vendas de commodities agrícolas e minerais. Com a medida, os empresários puderam compensar o custo dos tributos indiretos, acumulados no preço dos bens destinados ao mercado externo, no montante a ser pago em IPI.(RA)

Colaborou Daniel Pereira

E EU COM ISSO

O trabalhador brasileiro pode sair prejudicado qualquer que seja a solução para o imbróglio do crédito-prêmio do IPI. Se o governo for derrotado, o impacto multibilionário da decisão pode prejudicar ainda mais o equilíbrio das contas públicas. Em última análise, isso pode forçar o Banco Central a subir os juros para evitar um surto inflacionário, o que encarece os financiamentos de empresas e pessoas físicas, além de prejudicar o crescimento da economia. Para restaurar a saúde fiscal, a equipe econômica pode aumentar outros impostos para reduzir o rombo. Se as empresas exportadoras perderem, os reflexos negativos nos seus balanços serão grandes. Para minimizar os danos causados pelo pagamento da dívida e das multas, elas podem ser obrigadas a demitir funcionários ou aumentar os preços de seus produtos para compensar as perdas. De uma forma ou de outra, o bolso do contribuinte pagará a conta.(RA)

Dólar em queda livre Robson Fernandjes/AE - 15/3/01

Só com a queda de R$ 0,30 nos últimos meses, o país deve perder R$ 48 bilhões em receitas de exportações neste ano¿ Roberto Giannetti da Fonseca, presidente da Funcex

Para desespero dos exportadores, o dólar continua em queda livre. Ontem, a moeda fechou o dia cotada a R$ 1,835, numa forte desvalorização de 1,61%. Esse foi o menor valor desde 25 de setembro do ano passado, quando os mercados financeiros começavam a sofrer os efeitos negativos do pânico que se seguiu à quebra do banco norte-americano Lehman Brothers. Com o agravamento da crise, a divisa chegou a encostar em R$ 2,50 no Brasil, mas recuou vertiginosamente com a entrada maciça de recursos no país.

¿Infelizmente, a situação tende a piorar, com o dólar ficando abaixo de R$ 1,70 ou R$ 1,60. Só com a queda de R$ 0,30 nos últimos meses, o país deve perder

R$ 48 bilhões em receitas de exportações neste ano¿, calcula o presidente da Fundação Centro de Estudos de Comércio Exterior (Funcex), Roberto Giannetti da Fonseca. A queda de ontem esteve relacionada ao bom humor dos investidores, animados pela divulgação dos números da indústria norte-americana, que vieram melhores do que o esperado.

Giannetti acredita que esse novo fortalecimento do real frente ao dólar vai reduzir o superávit comercial brasileiro, que foi de US$ 2,928 bilhões em julho, para algo entre US$ 1 bilhão e US$ 1,5 bilhão mensalmente. O empresário já levou a preocupação do setor exportador ao ministro da Fazenda, Guido Mantega, que sempre foi contra um câmbio valorizado como o atual. ¿O problema é que ninguém trata da estabilidade cambial no país. A Fazenda diz que o assunto não é com ela. O Banco Central diz o mesmo. É preciso evitar oscilações muito fortes em pouco tempo e a sobrevalorização da moeda nacional por fatores especulativos, mesmo mantendo o câmbio flutuante¿, afirma.

Segundo ele, as empresas precisam traçar pelo menos três cenários cambiais, o que dificulta muito o planejamento anual. ¿Não temos uma política de incentivo à atividade exportadora. Há 25 anos, Brasil e China vendiam US$ 25 bilhões por ano. A China aumentou para mais de US$ 1 trilhão e é responsável por 7% do comércio mundial. Nós crescemos para US$ 160 bilhões, com uma participação sempre em torno de 1%¿, lamenta. (RA)