Título: MP quer apurar elo entre obra e senador
Autor: Torres, Izabelle
Fonte: Correio Braziliense, 06/08/2009, Política, p. 5

Construção de prédio em Belém é suspeita de irregularidades por ocupar área de marinha. Flexa Ribeiro, fundador da Engeplan, empresa responsável por obra.

O Ministério Público do Pará instaurou procedimento administrativo para apurar a legalidade da construção de um prédio luxuoso na orla de Belém pelo grupo empresarial ligado ao senador Flexa Ribeiro (PSDB-PA). A obra está prevista para ser executada em um terreno de marinha, cuja licença de ocupação foi concedida há mais de 10 anos para a construtora Engeplan, empresa fundada e administrada até 2004 pelo parlamentar tucano. Reportagem do Correio publicada no último domingo revelou a relação do empreendimento com o parlamentar.

De acordo com alguns vendedores do luxuoso empreendimento de 19 andares, o senador será o proprietário da cobertura do prédio. Graças ao prestígio do parlamentar na prefeitura e em órgãos públicos de Belém, as licenças para o início da construção estão sendo concedidas, apesar de ainda haver uma discussão sobre a responsabilidade pela área. Discute-se se as autorizações caberão ao municipal ou à União, que é dona do terreno.

Diante das dúvidas e da polêmica em torno da construção de um prédio tão alto às margens da Baía de Guajará, a Promotoria de Justiça de Meio Ambiente e Patrimônio Cultural do MP paraense pediu informações para as secretaria municipais de Meio Ambiente e de Urbanismo. Pretende saber se já foram concedidas licenças ambientais e urbanísticas e, em caso positivo, questiona quais foram os critérios adotados para a concessão das permissões. O caso está sendo investigado pela promotora Daniella Dias e os órgãos terão até o próximo dia 15 para responder às questões levantadas pelo MP.

Prestígio e influência

A edificação que está prestes a ser construída no Bairro do Telégrafo, uma região de baixa renda da capital paraense, é a única que beira a Baía do Guajará a conseguir autorizações de órgãos municipais para a construção de um prédio de 19 andares. A Secretaria de Patrimônio da União (SPU) pediu aos responsáveis pela obra que apresentem um estudo de impacto ambiental. Mesmo sem atender ao pedido até o momento, o grupo empresarial ligado ao senador já começou a vender apartamentos duplex no suntuoso prédio.

Como o Correio contou no último domingo, a empresa responsável pela obra é a Premium incorporações, que pertence ao filho do sócio antigo do senador na Engeplan, Antonio Fabiano Coelho. ¿É tudo o mesmo grupo. As empresas são ligadas ao senador. A que vai construir é do filho do sócio do senador e a dona do terreno é a que foi fundada por ele. É tudo a mesma coisa¿, resumiu uma das vendedoras do luxuoso imóvel em uma conversa gravada com a reportagem.

Localizado em área de marinha, a região está registrada na SPU há mais de 10 anos em nome da Engeplan. O registro é bem anterior ao ano de 2004, quando o senador doou suas cotas para o sócio Antonio Fabiano Coelho.

A assessoria do senador afirmou que Flexa Ribeiro tem conhecimento da polêmica em torno do prédio, mas, como deixou oficialmente a administração da empresa no fim de 2004, não tem ligação com o empreendimento. O ex-sócio do parlamentar e atual dono da Engeplan, Antonio Fabiano Coelho, disse que o terreno foi repassado para a empresa do seu filho, a quem caberá a execução da obra. Fabiano afirmou também que o empreendimento possui as licenças municipais necessárias para o início das obras.

Memória Prisões e afastamento

A Engeplan foi fundada pelo senador Flexa Ribeiro (PSDB-PA) na década de 1970. Famosa no Pará pelo número expressivo de obras públicas que executava, a empresa também encheu o currículo de denúncias e tornou-se personagem de inquéritos policiais. Em fevereiro de 2005, a Operação Caronte da Polícia Federal prendeu o sócio da empreiteira Antonio Fabiano Coelho, sob acusação de fraudes em certidões negativas de débitos da Previdência.

À época, Flexa Ribeiro afirmou que não tinha nada com a prisão de Coelho, pois havia deixado o quadro societário da empresa em dezembro de 2004. Sua saída ocorreu exatamente um mês depois de também ser preso. Dessa vez, durante a Operação Pororoca, que prendeu uma quadrilha acusada de fraudar o Sistema de Acompanhamento de Gastos Federais (Siafi) e subornar servidores. Flexa foi liberado rapidamente e assumiu o cargo de suplente de senador meses depois.

Apesar do afastamento oficial da Engeplan, o tucano continua ligado ao grupo empresarial. Há duas semanas, o Correio visitou Belém e o local onde o MP hoje questiona a legalidade de um empreendimento prestes a ser construído. Entre conversas com vendedores, funcionários da Engeplan e moradores do Bairro do Telégrafo, a reportagem constatou que a influência e o prestígio do senador estão em toda parte, sempre ligados aos empreendimentos do grupo empresarial. Tanto que a autorização da União para a ocupação da área de terreno de marinha onde está prevista a construção do prédio foi dada ao parlamentar anos atrás, mas quem vai executar a obra é a empresa do filho do seu ex-sócio. O senador, por sua vez, deve tornar-se proprietário da cobertura do prédio. Um jogo truncado e cheio de elos que o MP ensaia desvendar.