Título: Bancos com sede de crédito
Autor: Duarte, Patrícia
Fonte: O Globo, 17/05/2011, Economia, p. 17

Enquanto governo tenta esfriar economia restringindo empréstimos, instituições fazem ofensiva para atrair clientes

BRASÍLIA

O governo tem um ¿inimigo¿ cada vez mais evidente na guerra que trava para segurar a inflação: a vontade dos grandes bancos de emprestar . As instituições estão se desdobrando para atrair novos clientes, principalmente os que têm menor risco de calote. A estes, oferecem condições melhores, como juros diferenciados. Os resultados são evidentes. Segundo levantamento da Austin Asis, as receitas com a concessão de créditode cinco grandes do mercado ¿ Banco do Brasil (BB), Itaú Unibanco, Bradesco, Santander e Caixa Econômica Federal ¿cresceram 21,1% entre janeiro emarço sobre igual período de 2010, contra teto de 15% considerado ideal pelo Banco Central (BC) e 13,1% de expansão no primeiro trimestre de 2010. Nem o cenário de jurosmaiores e as medidas oficiais que buscam inibir os empréstimos estão resfriando o ímpeto das grandes instituições.

¿ Os bancos estão garimpando mais as oportunidades, ampliando a base de clientes. Tembanco no qual dois terços dos clientes ainda não tomaram crédito. Isso mostra um potencial enorme ¿ conta um alto executivo de um grande banco, lembrando que os ganhos com crédito são uma das principais fontes que garantem bons resultados para as instituições. A carteira de crédito desses cinco bancos, no fim do trimestre passado, avançou 22,4%, frente aos 17% vistos entre janeiroemarçode 2010, e chegou a R$ 1,269 trilhão. O movimento foi mais intenso que oda média do mercado que, no período, cresceu 20,7%, segundo dados mais recentes do BC. Os números mostram que o apetite dos bancos não diminuiu, mesmo com todas as ações do governo para segurar os empréstimos.Aintenção é que, com menos crédito, o consumo caia e, com ele, a pressão sobre a inflação.

Peso do segmento é de 46%do PIB

Especialistas consultados pelo GLOBO concordam que, daqui para frente, ocrescimento do crédito no país deve perder força, por causa das medidas já adotadas pelo governo e as que ainda virão. Alertam, porém, que elas podem não ser suficientes para segurar a inflação.

¿Esse apetite é umfator de risco e pode até estourar o teto da meta de 6,5% pelo IPCA no fim do ano se a demanda não for moderada. Isso pesa em 2012 ¿ diz o economista-chefe da Máxima Asset Management, Elson Teles, que prevê o IPCA a 6,40% em 2011 e a 5,50% no ano que vem. O BC tem dito que a inflação, que hoje já bate 6,50% anualizados, vai convergir para o centro da meta, de olho apenas em 2012. Para tanto, deixou claroque o ciclo de aperto monetário será ¿por um período suficientemente prolongado¿. O analista da Austin Asis Luís Santacreu argumenta que as ações adotadas pelo governo ¿como as de dezembro, que encareceram elimitaram o crédito de longo prazo voltado a bens de consumo¿ainda não surtiram efeito total no mercado, o que deve acontecer mais nitidamente apenas no segundo semestre.

Ele lembrou, no entanto, que o peso do crédito na economia e, consequentemente, na inflação, é muitomaior hoje do que há cinco anos. Atualmente, o crédito corresponde a 46,4% do Produto Interno Bruto (PIB, conjunto de bens e serviços produzidos no país), enquanto no fim de 2005 representava apenas 28,3%.

¿ O crédito ainda mostra que está estimulando aeconomia e, por isso, o governo ainda vai ter de tomar medidas para segurar o movimento ¿ afirma Santacreu, citando, como exemplo, mais altas nos juros básicos. A Selic está em 12% ao ano e, segundo a pesquisa Focus, o mercado prevê que ela irá a 12,50% até julho. Mas não é difícil encontrar quem aposte mais alto, chegando a 13%anuais.O BC estima que, neste ano, o volume total de empréstimos no país crescerá 13%, muito abaixo dos 20% vistos agora. Uma indicação éque, em março, a média das concessões diárias cresceu 3,5% sobrefevereiro, mostrando desaceleração. No trimestre, o avanço acumulado foi de 4%.

Apesar desses sinais de esfriamento, os bancos não vão ceder tão facilmente. O BB, por exemplo, anunciou na semana passada que passará a adotar taxas de juros diferenciadas para seus clientes com bom histórico. As instituições financeiras também querem investir no segmento de empresas e imobiliário. E toda essa estratégia serve também para evitar que a inadimplência ¿ que, nos casos com prazos mais curtos, já deu alguns sinais de elevação ¿ saia do controle.

¿ Os bancos estão mais eficientes na concessão de crédito. Isso ajuda a melhorar os ganhos ¿ diz Aloísio Lemos, analista da corretora Ágora.