Título: O PAC e o vento
Autor: Branco, Gil Castello
Fonte: Correio Braziliense, 06/08/2009, Opinião, p. 23

Economista e um dos fundadores da ONG Contas Abertas.

Aprendi com o amigo Lars Grael que o bom velejador não reclama dos ventos; ajusta as velas. A receita deu ao Brasil duas medalhas olímpicas. Ajustar as velas é exatamente o que faz o governo federal com o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Após uma fase em que apenas reclamava das críticas em relação à velocidade com que navegava o programa, o governo decidiu enfrentar a calmaria. Prometeu bônus para aumentar os vencimentos dos servidores do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) ¿principal executor do PAC com recursos do orçamento da União ¿, contornou greves na Caixa Econômica Federal (CEF), diminuiu as contrapartidas de estados e municípios, criou facilidades para ampliação do capital de giro das empresas envolvidas, tem enfrentado as exigências do meio ambiente e, até, as do Tribunal de Contas da União (TCU) quanto às paralisações de obras irregulares.

Com esses ajustes, o governo federal pretende desfazer alguns nós que tanto afetaram planos anteriores como, por exemplo, o Avança Brasil e o Brasil em Ação, agilizando os atuais projetos. Nos primeiros sete meses de 2009, só com recursos do Orçamento Geral da União, foram aplicados R$ 6,5 bilhões no PAC, 27% a mais que em igual período do ano passado. Apesar dos primeiros resultados favoráveis, alguns problemas persistem, relacionados, sobretudo, às obras de saneamento e habitação. São dificuldades decorrentes, principalmente, da ausência ou da má formatação técnica dos projetos e dos limites de endividamento, já comprometidos, dos estados e municípios.

Assim sendo, já se vão dois anos e três meses do lançamento do PAC e apenas 7% das obras tocadas pelo governo central, estatais, municípios e iniciativa privada estão concluídas. Ao considerarmos o conjunto do programa ¿ inclusive os empreendimentos de saneamento e habitação ¿ estão em fase de obras 29% dos projetos. Paralelamente, não saíram do papel 64% das realizações previstas, que se encontram em estágios de contratação, licitação ou ação preparatória (estudo ou licenciamento). Os conceitos e dados são da própria Casa Civil da Presidência da República, consolidados pela ONG Contas Abertas a partir de informações recém-divulgadas pelo governo, atualizadas até abril de 2009.

Se excluídas as obras de saneamento e habitação, como faz o comitê gestor do PAC quando anuncia o índice de execução do programa, teremos 21% dos empreendimentos finalizados, o que altera a estatística global, mas não muda expressivamente o contexto. Nesse caso, restando 20 meses para o fim do governo, falta concluir 79% das obras do PAC.

Apesar do reconhecimento de que obras de grande porte possuem prazos dilatados de maturação, no preto no branco, até abril de 2009, 827 obras foram concluídas e 3.442 estão em andamento. Ainda nos preparativos existem 7.721 empreendimentos. O que acontece de melhor é realizado pela Petrobras. Com ou sem CPI, burlando ou não o Fisco, o fato é que a estatal continua batendo recordes de investimentos. No primeiro semestre de 2009, incentivada pelo governo ¿ preocupado com a crise e a adoção de política anticíclica ¿, o Grupo Petrobras aplicou R$ 26,7 bilhões nas obras do PAC e fora dele, mais do que o dobro de toda a administração federal direta dos Três Poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário), que investiu somente R$ 11,2 bilhões.

O problema é que o PAC não é só a Petrobras. A promessa foi ambiciosa ao prever aplicações de R$ 646 bilhões no período 2007¿2010 em um país que, há décadas, investe parcela insignificante do Produto Interno Bruto (PIB). Apesar das dificuldades, o governo já fala em lançar o PAC 2, muito embora já exista o Plano Plurianual (PPA), com objetivos, metas, programas e ações estipulados até 2011, conforme prevê a Constituição.

A população brasileira conhecerá no segundo semestre de 2010 os resultados técnico e político do PAC. Se até lá o país se transformar em enorme canteiro de obras e houver uma agenda diária de inaugurações, melhor para o Brasil e para a candidata do governo, que já parece definida. A oposição, provavelmente, vai cobrar o término de cada uma dos milhares de obras.

A lição de Grael, a de não reclamar dos ventos e ajustar permanentemente as velas, vale também para a vida e para o principal programa de investimentos do governo. A ministra Dilma terá que continuar ajustando as velas do programa, para que ele navegue com a maior velocidade possível, de forma que as obras e o slogan ¿a mãe do PAC¿ não se percam ao vento.