Título: Um crime contra nossos jovens
Autor: Barbosa, Adauri Antunes; Weber, Demétrio
Fonte: O Globo, 17/05/2011, O País, p. 3

Procuradora da República prevê ações contra uso de livro com erros pelo MEC; autora se defende

Adauri Antunes Barbosa e Demétrio Weber

SÃO PAULO e BRASÍLIA

Diante da denúncia de que o livro ¿Por uma vida melhor¿, da professora Heloísa Ramos ¿ que foi distribuí- do a 485 mil estudantes jovens e adultos pelo Programa Nacional do Livro Didático, do Ministério da Educação ¿, defende o uso da linguagem popular e admite erros gramaticais grosseiros como ¿nós pega o peixe¿, a procuradora da República Janice Ascari, do Ministério Público Federal, previu que haverá ações na Justiça. Para ela, os responsáveis pela edição e pela distribuição do livro ¿estão cometendo um crime¿ contra a educação brasileira.

¿Vocês estão cometendo um crime contra os nossos jovens, prestando um desserviço àeducação já deficientíssima do país e desperdiçando dinheiro público com material que emburrece em vez de instruir.Essa conduta não cidadã é inadmissível, inconcebível e, certamente, sofrerá ações do Ministério Público ¿ protestou a procuradora da República em seu blog.

Anteontem, o livro já tinha sido duramente criticado por educadores e escritores. O MEC confirmou que não pretende retirar a publicação das escolas, alegando que não tem ingerência sobre oconteúdo das obras. Afirmando que se manifestava como mãe e sem analisar o aspecto jurídico da questão, Janice disse que ficou chocada com as notícias sobre olivro com erros aprovado e distribuído pelo MEC. Os autores defendem que essa linguagem coloquial não poderia ser classificada de certa ou errada, mas de adequada ou inadequada.

¿Ainda não estou refeita do choque sofrido com as notícias sobre o conteúdo do livro aprovado pelo MEC, no qual consta autorização expressa para que os alunos falem¿Nós pega o peixe¿, ¿Os livro mais interessante estão emprestado¿ e por aí vai. Não, MEC e autores do livro, definitivamente isso não é certo enem adequado ¿ disse Janice Ascari.

Para MEC, debate é nas universidades

O MEC confirmou ontem que não cogita alterar o processo de seleção e avaliação de livros didáticos. As obras são lidas por professores de universidades públicas, a quem cabe selecionar os títulos que farão parte do catálogo nacional de livros. É combase nesse catálogo que escolas de todo o país escolhem as coleções que receberão gratuitamente, distribuídas pelo Programa Nacional do Livro Didático. O MEC diz que o debate sobrea adequação ou não de uma obra didática deve ocorrer nas universidades, como é no sistema atual, e não dentro do ministério. Do contrário, segundo o MEC, haveria o risco de direcionamento político na escolha das obras a serem aprovadas para uso em sala de aula.

A professora Heloísa Ramos, autora do livro, discorda de que seja preciso modificar qualquer trecho. Ela argumenta que a frase discutida em seu livro trata de linguage moral, e não escrita. E que a norma popular da língua é diferente da norma culta, mas não necessariamente errada, no caso da linguagem oral.

¿Eu não admito mais que alguém escreva que o nosso livro ensina a falar errado ou que não se dedica a ensinar anorma culta ¿disse Heloísa.

¿Por que, em educação, todo mundo acha que conhece os assuntos e pode falar com propriedade? Este assunto é complexo, é para especialistas.

Professora aposentada de língua portuguesa da rede estadual de São Paulo, Heloísa presta serviços de consultoria e escreve uma coluna na revista ¿Nova Escola¿, dedicada a tirar dúvidas de professores. Segundo ela, o livro ¿Por uma vida melhor¿ é pioneiro ao destacar a importância da norma popular da língua, o que considera um avanço, no sentido de não menosprezar a fala da população menos instruída.