Título: Governos decidem virar página
Autor: Duarte, Fernando
Fonte: O Globo, 12/05/2011, O Mundo, p. 32

Colômbia espera que livro não afete relações. Correa nega doação

BOGOTÁ

Colômbia, Venezuela e Equador decidiram ontem ¿virar a página¿ e não caírem em novas polêmicas, diante das revelações contidas nos emails de Raúl Reyes, um dos líderes das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia. A chanceler colombiana, María Ángela Holguín, foi enfática ao destacar que o governo ¿não fará comentários¿ sobre o livro ¿Dossiê das Farc: os arquivos secretos de Venezuela, Equador e Raúl Reyes¿. Para a Venezuela, o documento poderia se converter numa arma contra o país. Já o presidente equatoriano, Rafael Correa, afirmou ontem que jamais aceitou dinheiro da organização. Em entrevista a uma rádio colombiana, María Ángela disse ter conversado com o chanceler venezuelano, Nicolás Maduro, e que ambos decidiram virar a página. ¿ Não vamos comentar esse informe ¿ declarou, dizendo esperar que o livro ¿não danifique o caminho¿ traçado com os países vizinhos. María Ángela reforçou, assim, a declaração da véspera do vice-presidente, Angelino Garzón, que assegurou que a Colômbia não tem ¿por que responder por algo que não escreveu¿. Garzón havia destacado ainda que ¿a postura do presidente Juan Manuel Santos é fortalecer as relações da Colômbia com Venezuela e Equador¿.

Para Correa, as Farc foram enganadas O livro, de 240 páginas, foi apresentado na terça-feira em Londres pelo Instituto de Estudos Estratégicos Internacionais (IISS). Ele compila mensagens dos computadores de Reyes, apreendidos no bombardeio a um acampamento das Farc no Equador, em 2008, e que resultou na morte do guerrilheiro. O dossiê, que usou ainda outras fontes, acabou por respingar em Correa. Segundo o depoimento de um guerrilheiro desmobilizado, Correa teria pedido pessoalmente e recebido US$ 400 mil das Farc e aliados para a campanha presidencial de 2006. ¿ Nunca conheci alguém das Farc. Jamais aceitei 20 centavos de uma organização dessa natureza, e jamais permiti que fossem recebidos 20 centavos ¿ disse o presidente equatoriano. ¿ Se alguém em nome da campanha de Rafael Correa pediu dinheiro, então as Farc foram enganadas. O ataque do Exército colombiano que matou Reyes ocorreu em território equatoriano e levou Correa a romper as relações diplomáticas. Os vínculos só foram restabelecidos plenamente em novembro passado, após a posse de Santos. Na terça-feira, a Embaixada da Venezuela em Londres rejeitara o dossiê, dizendo que ¿poderia se converter em uma ferramenta de propaganda agressiva contra a Venezuela, justamente quando as relações entre Caracas e Bogotá alcançaram um nível de cooperação estável e de diálogo amistoso¿. Nos últimos anos, as relações entre os dois países foram afetadas por denúncias de que Caracas protegia guerrilheiros das Farc, além da decisão colombiana de permitir o uso de algumas de suas bases militares pelos Estados Unidos. Com o fim do mandato de Álvaro Uribe, Santos buscou uma reaproximação com a Venezuela, retomando o diálogo diplomático. Para a venezuelana María Teresa Belandria, especialista em direito internacional, a Colômbia manterá a linha para que nada perturbe as boas relações com Chávez, e ressalta: ¿ Santos segue com seus planos de expansão de influência regional e deixa o governo da Venezuela submetido ao escárnio.