Título: O desaparecimento do relator
Autor: Alencastro, Catarina
Fonte: O Globo, 12/05/2011, O País, p. 4

Aldo passa o dica com Vaccarezza costurando acordos Fábio Fabrini BRASÍLIA Os deputados passaram mais de dez horas em plenário discutindo um texto que, na prática, desconheciam.E pressionados por manifestantes que lotavam as galerias. Pouco depois das 9h desta quarta-feira, quando começou o duelo entre ruralistas e ambientalistas na tribuna, esperava-se que o relator, Aldo Rebelo (PCdoB-SP), chegasse com a versão final do projeto que altera o Código Florestal por volta de meio-dia. À medida que as negociações com o governo avançavam a portas fechadas, sem nenhuma sinalização aos parlamentares, Aldo começou a ser tratado como desaparecido. -Será que sequestraram ou abduziram o deputado Aldo Rebelo? Já são sete horas e 40 minutos aguardando - reclamou Chico Alencar (PSOL-RJ) às 16h40m, uma hora depois de o presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS), aparecer no Salão Verde e anunciar que em poucos minutos a agonia acabaria. - Soltem o Aldo! - apelou Nelson Marchezan Júnior (PSDB-RS), enquanto, na galeria, o público exibia cartazes pedindo "habeas corpus" para o relator.

Passava das 20h e o deputado comunista permanecia preso no gabinete do líder de governo, Cândido Vaccarezza (PT-SP), na tentativa de costurar um acordo. Durante o dia, deputados contrários às mudanças tentaram duas vezes retirar o projeto de pauta, argumentando que não fazia sentido debater propostas em aberto.Mas foram derrotados pelos ruralistas. -Estamos discutindo o vazio, porque até este momento não chegou nada -protestou o verde Roberto de Lucena (PV-SP). - Há 12 anos esta matéria está aqui.Se não discutiram, é problema de cada um - rebateu Onofre Agostini (DEM-SC), levantando um tijolaço de papel com todas as sugestões já apresentadas na Casa. Até o início da noite, mais de 40 deputados se inscreveram para falar na tribuna.De cada lado, predominavam os ataques.

Nas galerias, representantes de produtores rurais estavam em vantagem.Cada manifestação da bancada ambientalista precedia uma sonora vaia, o que irritou deputados. Alfredo Sirkis (PV-RJ) se queixou dos "barrigudinhos engravatados" que insistiam em interrompê-lo. No gramado do Legislativo, um cartaz dava o recado do agronegócio: "ONGs, cuidem do seu quintal. Lá não tem APP (área de preservação permanente)". A mensagem rivalizava com um imenso balão, em forma de filtro, montado pela ONG WWF com o propósito de alertar sobre o possível impacto das regras na qualidade das águas do país. Os ativistas do meio ambiente levaram faixas, algumas em provocação ao relator."Muda, Aldo", apelava um deles. -Ainda dá tempo de ele atuar, de fato, como um relator, ouvindo os dois lados e incluindo propostas de ambos.Até agora, tem sido um relator dos ruralistas -criticou o superintendente do WWF, Carlos Scaramuza. Próximo ao Anexo 4 da Câmara, 13 índios também fizeram um breve protesto.

-Esse pessoal que faz relatório é esquisito, né? Será que querem fazer tudo debaixo dos panos? questionou o líder guajajara Adrim Urumã, do Maranhão. Só a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag) levou cerca de 200 representantes à Casa, devidamente empenhados em conversar e sensibilizar os parlamentares para suas reivindicações.