Título: Brasil e Argentina cedem e começam a liberar produtos retidos na fronteira
Autor: Oliveira, Eliane; Figueiredo, Janaína
Fonte: O Globo, 20/05/2011, Economia, p. 27

Decisão é gesto de boa vontade para atenuar guerra comercial dos países

BRASÍLIA e BUENOS AIRES. Às voltas com uma guerra comercial sem precedentes, Brasil e Argentina decidiram ontem, como gesto de boa vontade, começar a liberar hoje produtos que estão sujeitos à licença prévia e se encontram retidos na fronteira entre os dois países. No caso brasileiro, os fiscais vão normalizar o desembaraço de automóveis fabricados pelos vizinhos. Já os argentinos devem concluir procedimentos de importação de calçados, baterias e pneus do Brasil.

A medida foi acertada em conversas telefônicas entre o secretário da Indústria argentino, Eduardo Bianchi, e o secretário-executivo do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior do Brasil, Alessandro Teixeira. A secretária de Comércio Exterior da pasta brasileira, Tatiana Prazeres, também participou das negociações. Na segunda e na terça-feira, Bianchi se reunirá com Teixeira em Buenos Aires para discutir a liberação de todas as mercadorias retidas.

De acordo com uma fonte do governo brasileiro, o acerto de ontem não significa o fim de todas exigências: a Argentina ampliou, em fevereiro, o número de produtos importados que perderam licença automática de 400 para 600, enquanto o Brasil respondeu, semana passada, com medida semelhante para automóveis, importante item da pauta de exportações do país vizinho.

Somente no primeiro trimestre deste ano, as importações de veículos argentinos ao mercado brasileiro atingiram US$857 milhões. O Brasil compra 80% dos carros que a Argentina produz para o exterior.

Na lista de produtos brasileiros que estão sendo afetados pelas restrições argentinas se destacam calçados, pneus e baterias, embora a exigência de licença prévia alcance industrializados em geral. Dados da Associação Brasileira da Indústria Calçadista (Abicalçados) mostram que, até uma semana atrás, estavam pendentes as licenças de nada menos que 660.713 pares de sapatos.

Outros conflitos comerciais se arrastam há meses

Segundo uma fonte do governo argentino, Bianchi prometeu aos negociadores brasileiros que a liberação de produtos retidos na alfândega de seu país começaria na noite de ontem.

- A Argentina se comprometeu a ter o gesto de boa vontade que os brasileiros estavam esperando - disse a fonte.

No encontro entre a ministra da Indústria da Argentina, Débora Giorgi, e o embaixador do Brasil, Enio Cordeiro, realizado na terça-feira passada, ele reclamou especificamente da demora na concessão de licenças não automáticas para pneus, baterias e calçados. A lista de setores da indústria brasileira que estão enfrentando dificuldades para entrar na Argentina é grande, mas os três itens mencionados por Cordeiro se encontram, na avaliação do Palácio do Planalto e de empresários, em situação crítica.

- Hoje mesmo (ontem) começaremos a assinar os pedidos de licença - disse a fonte do governo argentino, que participa ativamente das negociações.

A Casa Rosada espera que a reunião entre Bianchi e Teixeira sirva para resolver outros conflitos comerciais que estão se arrastando há meses e, em alguns casos, por anos. Do lado brasileiro, as barreiras aplicadas pela Argentina (não somente a suspensão de licenças automáticas, mas também a exigência de certificados sanitários) afetam produtos como alimentos, eletrodomésticos e máquinas agrícolas.