Título: Exército contra desmatamento
Autor: Alencastro, Catarina; Braga, Isabel
Fonte: O Globo, 20/05/2011, O País, p. 3

Militares participarão de operações na Amazônia, e mais nove municípios vão para lista suja

Um dia depois de anunciar crescimento de 27% no desmatamento da Amazônia, o governo decidiu mobilizar o Exército na estratégia de combate à devastação, que cresce muito rapidamente, principalmente no Mato Grosso. A decisão foi tomada pelo gabinete de crise, que reuniu ontem, por mais de duas horas, cinco ministros: Izabella Teixeira (Meio Ambiente), José Eduardo Cardozo (Justiça), Nelson Jobim (Defesa), Fernando Bezerra (Integração Nacional) e o general José Elito Carvalho Siqueira (Gabinete de Segurança Institucional). Izabella Teixeira não quis revelar detalhes das novas operações com a presença de militares do Exército, para evitar que os desmatadores se preparem para reagir à ofensiva.

- Sufocar o desmatamento ilegal é ordem da Presidência. Todas as instituições estão voltadas para sufocar o desmatamento na Amazônia. A determinação é ir para acabar com o desmatamento ilegal. Teremos ação do Exército. Todo o governo federal estará com esforço concentrado para combater o crime ambiental - disse a ministra.

Nove municípios serão incluídos na lista dos que mais desmatam a floresta amazônica. A lista suja hoje conta com 22 municípios, que estão proibidos de conceder novas autorizações de desmatamento.

Izabella classificou de inaceitável o desmatamento registrado em Mato Grosso, que teve 733 quilômetros quadrados de floresta derrubados. Para lá, já foram deslocados mais de 500 homens de Ibama, Força Nacional de Segurança e Polícia Federal. Ela não quis estabelecer nenhuma relação entre o enorme aumento da devastação e a iminência da reforma do Código Florestal, que está prestes a ser votada na Câmara.

Aldo culpa fiscalização

Segundo Izabella, a Secretaria de Meio Ambiente de Mato Grosso está preparando um relatório sobre possíveis causas do aumento das infrações. No entanto, fiscais que estão em campo disseram que o desmatamento foi feito às pressas por produtores que esperam ver essas novas áreas abertas legalizadas, após a mudança da legislação. ONGs ambientalistas também disseram haver clara ligação entre a perspectiva de impunidade que a votação do Código tem provocado e os dados divulgados na quarta-feira.

O relator do projeto na Câmara, Aldo Rebelo (PCdoB-SP), refutou esta interpretação, afirmando que o desmatamento ocorreu porque a fiscalização do Ibama contra o crime ambiental é ineficaz. Ele desafiou Izabella a encontrar a justificativa para explicar o que aconteceu na Amazônia, onde o desmatamento vinha caindo desde 2008:

- Espero que ela (Izabella) arranje uma resposta cabível e que o Ibama se torne uma burocracia mais eficaz para fiscalizar desmatamento ilegal, o que não tem conseguido. O que aconteceu na Amazônia é que há um órgão responsável pela fiscalização que, lamentavelmente, não tem eficácia para coibir o desmatamento ilegal, que ele sabe aonde acontece todo ano. Um órgão que, em vez de fiscalizar o desmatamento ilegal, está mais preocupado em multar pequenos agricultores, que sobrevivem de seu trabalho.

A ministra evitou polemizar com Aldo, com quem ainda negocia o Código Florestal. Mas negou que o Ibama falhe em combater o problema:

- Dizer que o governo não agiu está errado, tanto que o desmatamento foi localizado, concentrado em áreas privadas. Saímos de um desmatamento de 24 mil quilômetros quadrados (em 2003 a taxa superou 25 mil quilômetros quadrados) para seis mil quilômetros quadrados em 2010. O Brasil tem um Plano de Combate às Mudanças Climáticas que vem sendo cumprido.

Os dados do Ministério do Meio Ambiente dão conta de que nos últimos nove meses houve um incremento de 27% no desmatamento da Amazônia Legal, que compreende oito estados de Norte, Nordeste e Centro-Oeste. Segundo o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, foram derrubados pelo menos 1.848 quilômetros quadrados de floresta - área maior do que a da cidade de São Paulo.

Com relação ao Código Florestal, ontem prosseguiram as conversas sobre o texto que deverá ser votado na terça-feira. Em nome da base aliada do governo, o PMDB fechou um acordo com a oposição sobre o destaque que será apresentado ao texto do relator. Ficou acertada, com o consentimento de Aldo, uma emenda que possibilita a manutenção de uma série de atividades agropecuárias em Áreas de Preservação Permanente (APPs) e ainda dá aos estados a prerrogativa de fazer novas concessões. O Programa de Regularização Ambiental (PRA), que define regras sobre onde pode haver pastos e lavouras e como recuperar o que continua proibido, deixa de ser exclusividade da União, como o governo queria, e passa a poder ser elaborado também pelos estados.

- A emenda passou a ser da oposição e da base - explicou Aldo.

A ministra do Meio Ambiente evitou comentar o acerto fechado na Câmara, argumentando desconhecer a emenda acordada entre os parlamentares:

- Estou mergulhada no gabinete de crise. Não sei o que está acontecendo no Congresso.

Embora já haja acerto, o líder do governo, deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP), afirmou que o governo continuará tentando convencer a base aliada de que o melhor é a aprovação do texto apresentado pelo relator. Na versão do relatório apresentada em plenário no último dia 11, não constavam esses pontos. A emenda vem sendo chamada pelo Greenpeace como "emenda da anistia".