Título: Portas fechadas a Assad na UE
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Fonte: O Globo, 24/05/2011, O Mundo, p. 22

Bloco europeu adota sanções diretas contra ditador sírio, cassando vistos e congelando bens

BRUXELAS e DAMASCO

À sombra de 900 mortes na repressão aos protestos por democracia, o governo da Síria tenta se equilibrar entre a retórica desafiadora e o reconhecimento de que novas sanções econômicas ferem os interesses do país ¿ que já vive, desde 2004, sob um pesado embargo americano. Ontem, após semanas de consultas em Bruxelas, os ministros do Exterior da União Europeia, decidiram, enfim, fazer coro aos Estados Unidos e punir pessoalmente o presidente Bashar al-Assad pela violência. Tão logo foi feito o anúncio de que, além do congelamento de bens, Assad e outros nove funcionários do governo terão vistos cassados e a entrada proibida nos 27 países do bloco europeu, o chanceler sírio, Walid al-Muallem, acusou o Ocidente de interferir nos assuntos internos do país.

¿ Essas medidas vão ferir os interesses da Síria e da Europa também ¿ admitiu Muallem, que não se intimidou. ¿ A História prova que a Síria não sucumbe à pressão. Vamos sair fortalecidos da crise. Vamos melhorar também nossas relações com Rússia, China, Malásia e a América Latina para provar que o mundo é grande e não está restrito apenas aos EUA e à Europa.

No início do mês, a UE decretou um embargo à venda de armas e suspendeu a ajuda ao desenvolvimento da Síria. Mas, apesar de os EUA já terem aplicado sanções contra Assad, a medida vinha dividindo a Europa ¿ que questionava a eficácia de punir pessoalmente o presidente. Os nomes de Assad e outras nove autoridades se somam agora a uma primeira lista de 13 figuras proeminentes do regime ¿ incluindo o irmão do presidente, Maher al-Assad ¿ cujos bens foram congelados e que também tiveram a entrada proibida no território da UE.

¿ Ele (Assad) precisa fazer uma escolha agora ¿ intimou o chanceler britânico, William Hague.

Turquia, jogador de peso na mediação

A punição é considerada grave por analistas, uma vez que a família Assad mantém fortes laços com a Europa ¿ além de o presidente ter estudado e vivido em Londres por muitos anos, foi lá que conheceu sua mulher, Asma al-Assad, filha de sírios radicados no Reino Unido. Apesar do cerco ao governo de Damasco, fontes diplomáticas garantem que Bruxelas ainda não considera a adoção de sanções gerais contra a Síria. Oficiais do Partido Baath, em condição de anonimato, também minimizaram a condenação, exaltando a posição estratégica do país no Oriente Médio.

¿ Autoridade sírias não têm contas ou bens na Europa. Se nos impedem agora de ir à Europa, logo os próprios europeus virão a nós, implorar por nossa ajuda no Iraque, no Líbano e no processo de paz ¿ disse a fonte.

A secretária de Estado americana, Hillary Clinton, voltou a condenar o que chamou de crueldade na Síria.

¿ Parem as matanças, os espancamentos, as prisões, libertem todos os prisioneiros políticos. Comecem a responder às demandas que estão diante de vocês por um processo de mudança democrática de credibilidade ¿ disse Hillary.

Apesar do debate internacional sobre a eficácia de sanções econômicas ¿ que não funcionaram, por exemplo, no Iraque ou mesmo no Irã ¿ as opções diplomáticas para resolver a questão Síria permanecem incertas.

Analistas apostam numa solução impulsionada pelo desgaste do próprio governo sírio com aliados como a Arábia Saudita, de quem Assad vinha se reaproximando, e a Turquia. Na semana passada, o premier turco, Recep Tayyip Erdogan, chegou a dizer que ¿a crise síria era um assunto interno turco¿. O exagero se deve ao fato de os dois países terem um acordo de isenção de vistos ¿ levando Ancara a temer uma onda de refugiados em seu território. Além disso, a turbulência síria atrapalha a chamada política ¿zero problemas com os vizinhos¿ ¿ principal plataforma de Erdogan, fechando, também, uma importante plataforma de projeção externa à Turquia, responsável, até 2008, pela intermediação da paz entre sírios e israelenses.