Título: Valor da obra afasta pequenos e atrai perdedores de leilão para Belo Monte
Autor: Tavares, Mônica; Oswald, Vivian
Fonte: O Globo, 26/05/2011, Economia, p. 26

"Darwinismo" no consórcio não assusta governo, que não dará mais benefícios

BRASÍLIA. As piores previsões se confirmaram e assustaram os sócios minoritários da Hidrelétrica de Belo Monte, que já iniciaram uma debandada, antes mesmo do início das obras de construção da usina, que devem ser autorizadas até amanhã pelo Ibama. As construtoras de menor cacife, com 5% do empreendimento, acompanham a decisão do grupo Bertin e já caçam substitutos, diante da previsão de que a obra pode chegar a R$35 bilhões - quase o dobro dos R$19 bilhões estimados oficialmente e R$6 bilhões acima dos R$29 bilhões já consolidados pelo consórcio Norte Energia.

Com a reestruturação, pouco a pouco, os perdedores do leilão de 20 de abril de 2010 - que brigaram com o governo - vão marcando sua posição no consórcio que executará o empreendimento. A Vale já abocanhou a participação de 9% do Bertin e a Andrade Gutierrez é uma das candidatas aos 5% que devem ficar sem dono. Já negociam sua saída as empreiteiras Galvão Engenharia, Serveng, Cetenco e Contern (também do Bertin). A J.Malucelli e a Mendes Jr., 5ª maior do mercado, também estariam para deixar a obra e detêm, hoje, 2,25% do capital. Se saírem, a parcela total que se abriria no consórcio é de 7,25%.

Segundo uma fonte, está "todo mundo em pânico" com os números consolidados para os investimentos e já se fala que, se o governo não der mais benesses, as empresas deixarão o negócio. O problema é que não há como a União oferecer mais e as estatais não podem se prejudicar.

- Nós, concessionários, preferimos não ter construtoras (pequenas) no grupo, isto já tinha sido colocado. E agora as oportunidades estão surgindo (...). Por enquanto estamos conversando, temos muita gente interessada - disse José Ailton, integrante do conselho de administração da Norte Energia.

Dentro do governo, no entanto, a movimentação não pareceu surpreender. Fala-se em "darwinismo" e que apenas os mais fortes permanecerão no grupo. A avaliação é compartilhada por especialistas que acompanham de perto Belo Monte, que ainda lembram que, muitas vezes, construtoras de pequeno porte entram no consórcio para poder garantir seus interesses no consórcio dos executores da obra ou para ter acesso a informações privilegiadas e participar dos processos decisórios.

No mercado, a avaliação é a de que Belo Monte é o único empreendimento que não tem a construtora líder do projeto no grupo dos investidores, o que só aumenta especulações sobre a participação da Andrade Gutierrez no grupo. Mesmo assim, na lista dos interessados estaria também a Neoenergia - que detém distribuidoras e é liderada pela Iberdrola, a Previ (fundo de pensão dos funcionários do Banco do Brasil) e braços e fundos de participação do BB.

A Neoenergia já possui 10% do Norte Energia por intermédio da Bolzano Participações. Os sócios desistentes podem negociar ainda suas participações com os fundos de pensão dos funcionários da Petrobras (Petros) e da Caixa Econômica Federal (Funcef), com 10% e 2,5% do empreendimento, respectivamente.

AGU reclama de "assédio moral" de procuradores

E diante das sucessivas quedas de braço fora da arena jurídica entre procuradores do Ministério Público (MP) e as grandes obras do governo, a Advocacia Geral da União (AGU) encaminhou ontem pedido de providências ao Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) - órgão de controle do MP - para que a entidade se pronuncie sobre os limites de atuação dos procuradores. O advogado geral da União, Luis Inácio Adams, fala em abusos, intimidação e até mesmo em "assédio moral" para interferir no andamento das obras.

Desde o ano passado, a AGU se queixa da atuação de procuradores que acabam adiando processos de licitação e licenciamento ambiental. O pedido da AGU tem 39 itens e se apoia na defesa de que "recomendação" é "sugestão" e não ordem, portanto, os procuradores não podem acompanhá-la de ameaças.

- Não se pode usar a instituição da recomendação, que o MP exerce de maneira colaborativa, em que expressa a sua opinião jurídica, como ameaça e meio de intimidação - diz.

Adams destaca - e o documento cita os procuradores do Pará - o caso de Belo Monte. Os excessos teriam prejudicado ainda a licitação das usinas de Jirau e Santo Antonio, obras da Copa e sob coordenação do Departamento Nacional de Infraestrutura do Transporte (Dnit).

O CNMP não se pronunciou sobre o pedido da AGU, que vai virar um processo e será distribuído a um relator.