Título: Tortura: enfim processo disciplinar é aberto
Autor: Goulart, Gustavo
Fonte: O Globo, 26/05/2011, Rio, p. 18

Até agora, Justiça não julgou pedido de prisão contra cinco policiais acusados

A VÍTIMA dos policiais: ela não pode voltar para casa e vive com medo

Mais de um mês depois de ter vindo à tona a denúncia de tortura de um homem dentro da 10ª DP (Botafogo), a Corregedoria Geral Unificada (CGU) abriu um processo administrativo disciplinar (PAD) que poderá levar à prisão os cinco policiais acusados do crime. O procedimento foi instaurado no dia 16 deste mês e publicado no Diário Oficial do estado na segunda-feira. Os policiais estão soltos. Até hoje, o Tribunal de Justiça não julgou um pedido de prisão preventiva apresentado contra os policiais pelo Ministério Público estadual.

Segundo a denúncia, o grupo de policiais infringiu várias normas do regimento de conduta da Polícia Civil que tratam das garantias aos direitos individuais. A vítima acusa os servidores, que eram lotados na unidade, de uma série de agressões e de terem usado um alicate para apertar seu pênis.

A chefe de Polícia Civil, delegada Martha Rocha, elogiou a decisão da corregedoria.

¿ A corregedoria fez muito bem. Da minha parte, coube apenas referendar a decisão. As ações (da Polícia Civil e da Justiça) são independentes. Foi decretada a prisão temporária dos acusados (que já saíram da cadeia) e, aí, o processo entrou em discussão de competência da Justiça. A corregedoria entendeu que não cabia aguardar a decisão judicial e abriu o processo administrativo ¿ disse Martha.

O homem que acusa o grupo de policiais era funcionário de um ferro-velho em Araruama, na Região dos Lagos. No dia 24 de março, ele foi levado para a 10ª DP, onde relatou ter sido forçado a incriminar seu patrão, dizendo que ele pertencia a uma quadrilha de ladrões de carros da Zona Sul do Rio. Dois assaltantes haviam sido presos dias antes e, segundo os policiais, o dono do ferro-velho teria envolvimento com eles. O proprietário do estabelecimento, no entanto, nega a acusação.

Ontem, a vítima da tortura se disse arrependida de ter denunciado o crime, porque estaria vivendo de forma subumana.

¿ Estou sem trabalhar e vivo da ajuda dos outros. E não posso voltar para casa ¿ disse a vítima. ¿ Minha mulher me diz todos os dias que não era para eu ter feito isso. Além de toda a violência que sofri, hoje vivo com o medo.

O deputado Marcelo Freixo (PSOL), presidente da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa, criticou o Tribunal de Justiça:

¿ É um absurdo, um desserviço à luta contra a tortura. Os acusados podem interceder nas investigações e estão soltos. Os magistrados não estão tendo a metade da coragem que a vítima teve para fazer a denúncia.

Os policiais Jorge Alessandro Xavier Pereira, Rodrigo Soares de Assis Mariz, Thiago Santos Castro Del Rio, Antônio Carlos Nogueira Moraes Cardoso e Marcelo Xavier da Silva ficaram presos por 15 dias, mas deixaram Bangu 8, no dia 21 de abril, quando expirou o prazo da prisão temporária.