Título: Emenda ameaça cem milhões de hectares
Autor: Vasconcelos, Adriana
Fonte: O Globo, 26/05/2011, O País, p. 12

Texto abre brecha para novos desmates em margens de rios, encostas e topos de morros

BRASÍLIA. O governo está preocupado com o impacto da nova redação do Código Florestal, aprovada ontem na Câmara, na conservação de áreas protegidas que se localizam dentro de propriedades privadas. Técnicos do Executivo estimam que a emenda do PMDB, aprovada ontem junto com o relatório de Aldo Rebelo (PCdoB-SP), deixe desprotegidos cem milhões de hectares (1 milhão de quilômetros quadrados) nas margens de rios, em encostas e topos de morros. Na legislação atual, essas localidades são consideradas Áreas de Preservação Permanente (APPs).

Atualmente, 40 milhões de hectares já teriam sido desmatados e teriam de ser reflorestados. A emenda 164 retira a previsão de reflorestamento e ainda abre brecha para que haja novos desmatamentos nessas áreas, ameaçando os 60 milhões de hectares que ainda estão preservados.

¿ Essa emenda vai descaracterizar a APP em área rural. Ela não pode prosperar. Vamos fazer uma guerra santa para que essa redação não seja mantida ¿ ameaçou o líder do PT na Câmara, Paulo Teixeira (SP).

Emenda pode levar à perda de reserva legal

A emenda 164 ¿ aprovada por grande parte da base aliada do governo, apesar da recomendação expressa de que a presidente Dilma Rousseff não concordava com ela ¿ legaliza todas as atividades agrossilvopastoris (agricultura, pasto e plantação de árvores para exploração madeireira) instaladas em APPs até julho de 2008. Ela permite ainda que os estados, por meio dos Programas de Regularização Ambiental (PRAs), também autorizem novas atividades que não se enquadrem nas chamadas agrossilvopastoris, como aquicultura.

Além disso, também haverá perdas de reserva legal, se virar lei o texto aprovado terça-feira. O Ministério do Meio Ambiente calcula que pelo menos 15 milhões de hectares (150 mil quilômetros quadrados) de reserva legal desmatados ilegalmente deixarão de ser reflorestados. Isso porque o texto de Aldo libera desta obrigação todos os produtores que tenham terras de até quatro módulos fiscais (de 20 a 400 hectares dependendo do município). A reserva legal foi idealizada na lei como um percentual da terra que todo produtor tem que manter preservado. Este percentual varia de acordo com a região. Na Amazônia, é 80%; em áreas de cerrado localizadas dentro da Amazônia Legal, é 35%; e nas demais regiões, 20%.

Infratores poderão ter punição anulada

O texto aprovado abre caminho para que 5,2 milhões de propriedades rurais ¿ a maioria das quais não consegue cumprir a atual lei ambiental ¿ possam se regularizar, como é de interesse do governo. O Ministério do Meio Ambiente chegou a lançar um programa de regularização, o Mais Ambiente, que não contou com a adesão dos produtores, que preferiram esperar a alteração da lei. Se vigorar o entendimento aprovado pelos deputados, todos aqueles que receberam multas por infrações ambientais poderão se inscrever no PRA e ver sua punição anulada, desde que cumpram um cronograma para recuperar o passivo ambiental causado.

No entanto, o governo defende que apenas a União possa elaborar o programa, para evitar a diminuição de áreas preservadas, como fez o estado de Santa Catarina. Prevaleceu, porém, o entendimento de que os estados poderão fazer seus PRAs.