Título: Sob pressão, Dilma suspende kit contra homofobia
Autor: Damé, Luiza
Fonte: O Globo, 26/05/2011, O País, p. 9

Presidente recua após ataques de bancadas de religosos, que chegaram a ameaçar ajudar a convocar Palocci

BRASÍLIA. Pressionada pela bancada religiosa no Congresso - que ameaçou até ajudar a aprovar a convocação do ministro Antonio Palocci para explicar seu aumento de patrimônio -, a presidente Dilma Rousseff mandou suspender a produção e a distribuição de vídeos e cartilhas contra a homofobia, organizados pelos ministérios da Educação e da Saúde. A decisão foi anunciada ontem pelo ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Gilberto Carvalho, em reunião com deputados das bancadas evangélica, católica e da família, que ameaçaram obstruir as votações de interesse do governo e convocar, além de Palocci, o ministro da Educação, Fernando Haddad, caso o material fosse distribuído a escolas. Segundo Carvalho, que recebeu os parlamentares no Palácio do Planalto, Dilma considerou inadequado o kit anti-homofobia.

- O governo mantém sua posição clara contra qualquer tipo de homofobia, e as bancadas também se declararam contra a homofobia. Mas o governo achou prudente não editar esse material que estava sendo preparado no MEC. A presidente decidiu a suspensão desse material e do vídeo produzido por uma ONG. O governo decidiu também suspender a distribuição desse material.

"Não se trata de uma posição só de aparências"

Segundo Carvalho, Dilma "assistiu ao vídeo e não gostou":

- Ela acha que o vídeo era impróprio para o seu objetivo. Não se trata de uma posição só de aparências. A presidente tem as suas convicções e acha que o material é inadequado. Ela foi muito clara nesse sentido e determinou que esse material não circule oficialmente por parte do governo - disse, negando que a decisão seja um retrocesso:

- O que o governo está fazendo é aprofundando o diálogo. Se você produz um material que sofre uma tamanha contestação, o objetivo para o qual ele está destinado é prejudicado. É preferível que você produza um material com mais diálogo para atingir o objetivo. Não se trata de recuo, mas de um processo mais aprofundado de diálogo.

Os próprios parlamentares reconheceram que o kit não está sendo distribuído às escolas, mas que os vídeos vazaram na internet. Mesmo assim, ameaçaram atrapalhar o governo no Congresso, caso não houvesse uma revisão do material. O ministro negou que a decisão da presidente vise a proteger Palocci, alvo de ações da oposição no Congresso, por causa da evolução de seu patrimônio.

- Nós oferecemos o diálogo, e eles que tomassem a atitude que achassem consequente. Eles que decidiram suspender aquela história que estavam falando. Não tem toma lá dá cá - disse.

O governo também atendeu ao pedido da bancada religiosa de ser ouvida na produção de material contra a homofobia. Segundo o ministro, a partir de agora todo material sobre costumes será feito depois de consultas mais amplas à sociedade e às bancadas, com a da educação, a da família e as religiosas. A presidente, disse ele, vai também conversar com os ministros Haddad e Alexandre Padilha (Saúde) sobre a produção do material:

- Qualquer outro material, daqui para a frente, sobre a questão de costumes passará pelo crivo amplo da sociedade e das bancadas interessadas.

O líder do PR na Câmara, Lincoln Portela (MG), disse que a preocupação das bancadas religiosas é com a "didática do material". Na avaliação desses parlamentares, o kit induz à homossexualidade:

- A didática é muito agressiva. Às vezes, é preciso ser mais agressivo, mas também é preciso ter cuidado. Estamos preocupados com a maneira virulenta com que esse material está sendo apresentado.

O deputado Anthony Garotinho (PR-RJ) participou também do encontro no Planalto. Na véspera, durante a votação do Código Florestal , ele era um dos mais exaltados na pressão contra o governo.

- A bancada evangélica vai votar o Código, mas depois disso entrará em obstrução. Não votamos mais nada - ameaçou.

O Ministério da Educação não quis se manifestar.