Título: Quando a inflação cair, a Bolsa vai subir
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Fonte: O Globo, 29/05/2011, Economia, p. 41
Gestor da BlackRock, que administra US$3,6 tri no mundo, espera que Bovespa, hoje em 64 mil pontos, encerre o ano em 85 mil
WILLIAM LANDERS: "O Brasil não precisa de um choque
Gestor da carteira dos fundos de ações da BlackRock (administradora mundial de recursos) para a América Latina, William Landers acredita que a Bolsa brasileira deve avançar no segundo semestre e prevê que o Ibovespa chegue a 85 mil pontos no fim do ano, à medida que se observe uma desaceleração da inflação nos próximos meses. Landers, um brasileiro que mora desde os 14 anos nos Estados Unidos, tem aproveitado os recuos da Bovespa ao longo de 2011 para ampliar a participação dos ativos do Brasil nos fundos que administra. Hoje, 73% dos US$10 bilhões dos fundos da BlackRock destinados à América Latina estão alocados no Brasil. A gestora tem US$3,6 trilhões de ativos no mundo.
Ele se diz parte de uma minoria que aprova a condução da política monetária do Banco Central (BC) e espera que a inflação chegue à meta em 2012. E, ainda que o momento atual não seja tão favorável para investir em empresas de varejo por causa dos juros altos, afirma que o setor tem forte potencial a médio e longo prazos.
- Na história do crescimento da classe média brasileira, ainda tem muito o que vir por aí - afirma Landers.
Lucianne Carneiro
A Bovespa registra uma queda expressiva no ano e está muito atrás de outras Bolsas. Quais são as razões para isso?
LANDERS: Há fatores externos que pressionam o mercado acionário mundo afora, mas a Bovespa tem tido performance pior. Continua a questão da recuperação mundial, se os EUA já chegaram ao pico, e o endividamento na Europa. Isso tudo deixa o mercado nervoso. No Brasil, há um pouco de incerteza se o BC já fez o suficiente para trazer a inflação para dentro da meta de 2012 e se virão outras medidas macroprudenciais. É essa preocupação que tem segurado um pouco a Bolsa, principalmente os papéis domésticos, sensíveis a mudanças na taxa de juros. Esse questionamento do crescimento global tem pressionado ações de empresas ligadas a commodities. E, por último, a operação da Petrobras no ano passado indicou que o governo pode querer uma interferência maior em algumas companhias. Nesse sentido, a mudança na presidência da Vale também não ajudou.
"Tendo a acreditar mais no BC do que no mercado"
Qual é a sua avaliação sobre a política do BC?
LANDERS: Sou da minoria que acha que o Banco Central está fazendo a coisa certa. O Brasil não precisa de um choque que vá causar uma desaceleração grande e desnecessária. Claro que a economia pode desacelerar, o crescimento de 7,5% que se viu no ano passado era muito rápido e não há ainda infraestrutura e logística para esse ritmo todos os anos. Mas, se olharmos as estimativas do mercado para o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB), veremos que já houve queda. Para 2012, a estimativa, que era de 4,5% até março, agora é de 4,1%. E para este ano também caiu, de quase 5% para 4%. Ou seja, as estimativas do mercado para o crescimento estão caindo, enquanto as de inflação ainda não recuaram. Há uma desconexão entre os modelos usados pelo mercado. E o que a gente viu na última década é que os modelos do BC têm trabalhado relativamente bem. Então, tendo a acreditar mais no taco do BC que no do mercado.
Então o senhor acredita que a inflação vai recuar?
LANDERS: Acho que, em 2012, é possível chegar abaixo de 5%. A trajetória está do lado certo e mostra que as medidas e a desaceleração econômica foram suficientes para trazer a inflação para dentro da meta. Houve outras coisas, como pressões de alimentos e de commodities, que não ajudaram, mas são temporárias e sazonais.
Qual é o cenário que o senhor vê para a Bolsa nos próximos meses?
LANDERS: Temos uma estimativa de 85 mil pontos para o Ibovespa no fim do ano e não vejo razão para mudá-la (na sexta-feira, fechou a 64.294). Acredito que a Bolsa tem sido punida demais, e vários setores, especialmente domésticos, estão apanhando muito, alguns sem merecer punição, outros sendo punidos demasiadamente. Acho que o segundo semestre será melhor que o primeiro para a Bolsa. Quando começarmos a ver essas inflações passadas em um nível mais baixo, o mercado vai se acalmar um pouco. Passando o medo de que o Brasil vai voltar a ter inflação alta, a Bolsa tem tudo para subir.
Que setores estariam sendo exageradamente punidos?
LANDERS: Os resultados dos bancos têm sido muito mais consistentes que o desempenho das ações. Obviamente, o setor foi visado pelo governo para diminuir o crescimento da economia, então há sempre o medo de mais medidas. Mas acho que os bancos têm se mostrado bem resilientes e continuam a registrar bons desempenhos. O setor imobiliário também apanhou bastante com o medo de as taxas de juros altas diminuírem a demanda por imóveis. A realidade é que a demanda não tem caído, porque o emprego e a renda continuam fortes, e as hipotecas são baseadas na taxa Taxa Referencial (TR). Algumas ações caíram porque as empresas estão administrando um negócio muito maior que no passado e têm dificuldades. Mas é um setor que tem muito a crescer.