Título: No adeus a empresa, executivos levam bônus milionários e até carro blindado
Autor: Rosa, Bruno; Nogueira, Danielle
Fonte: O Globo, 29/05/2011, Economia, p. 38
Em 20% a 30% dos casos, divergências de valores vão parar na Justiça
As mudanças cada vez mais frequentes no comando das companhias no Brasil revelam movimentos milionários. Ao deixarem a empresa, presidentes e diretores recebem uma espécie de reconhecimento pelo trabalho, o chamado bônus de saída, que, na maioria dos casos, fica na casa dos milhões de reais. Foi o que aconteceu em diferentes corporações recentemente, como Vale, Oi, Vivo e Google. Mas nem sempre os executivos se satisfazem com a bolada que recebem e acabam recorrendo à Justiça. Estimativas de escritórios de advocacia mostram que entre 20% e 30% deles partem para a briga nos tribunais.
Pela praxe do mercado, o valor recebido pelos profissionais no momento em que eles deixam a empresa equivale a meio ou um salário mensal multiplicado pelo total de anos trabalhados na companhia. Há também a quantia relativa à quarentena ¿ na qual o executivo se compromete a não trabalhar na concorrência ¿, que costuma durar até um ano. Em geral, as empresas mantêm a remuneração dos executivos por todo esse tempo.
Considerando essas práticas, a estimativa de consultores é que o ex-presidente da Vale Roger Agnelli ¿ que deixou a empresa no último dia 20 ¿ tenha acertado uma quantia que beira os R$30 milhões. O cálculo se baseia no salário anual estimado em R$15 milhões e no tempo de casa, de dez anos. No caso de Roberto Lima, que deixa o comando da Vivo no próximo mês, estima-se que os ganhos possam ser superiores a R$6 milhões.
Oi e Google também pagam bônus de entrada
O pacote de benefícios pós-emprego costuma incluir ainda carros, extensão de planos de saúde, bolsas de estudo no exterior e contratação de consultorias para a recolocação profissional. No setor financeiro, é comum também a manutenção da segurança pessoal por certo tempo, incluindo veículos blindados. Cada executivo, porém, tem um contrato diferenciado, que, em 90% dos casos, é negociado quando da contratação.
¿ No escritório, meus clientes, que são presidentes e diretores de primeiro nível, estão em vias de receber só este ano cerca de R$60 milhões. São empresas de infraestrutura, tecnologia e alimentos. É um aumento considerável em relação ao ano passado ¿ disse um advogado de uma das principais bancas do país que atua no segmento.
Mas nem todos ganham bônus de saída. Marcelo Ferrari, diretor de Negócios da Mercer, ressalta que a ¿indenização¿ é destinada a grandes executivos:
¿ As maiores empresas do país, líderes em suas áreas, pagam meio salário por cada ano trabalhado como reconhecimento. O Brasil hoje está alinhado com a prática internacional, principalmente, os EUA.
Além da Vale e da Vivo, chama a atenção o caso de Luiz Eduardo Falco, que deixa a Oi no fim de junho. Há dez anos na companhia, Falco é presidente desde julho de 2006, com salário estimado entre R$7 milhões e R$8 milhões. Antes, comandava a divisão móvel. Segundo especialistas, neste caso, como o profissional cresceu na companhia, é possível que a empresa negocie um bônus de saída menor. Segundo fontes do setor, o valor seria superior a R$6 milhões.
Há casos ainda em que as companhias pagam o bônus de entrada, geralmente uma quantia similar ao que o executivo iria receber caso fosse demitido da empresa onde está empregado. Foi o que fez o Facebook para tirar Alexandre Hohagen, que era vice-presidente da Google para América Latina. É o mesmo que fará a Oi para levar Francisco Valim, hoje na Experian.
¿ Há quem ainda, ao entrar na companhia, já coloque no contrato multas, caso seja dispensado antes de três anos. A política de remuneração está sendo foco das companhias porque o mercado está muito competitivo ¿ afirmou José Augusto Figueiredo, diretor da DBM Brasil e América Latina.
Briga de Landim com Eike é de quase R$500 milhões
De acordo com Euclydes Mendonça, do escritório especializado em causas trabalhistas Mendonça e Rocha Barros Advogados e vice-presidente do Instituto dos Advogados de São Paulo, o número de ações na Justiça questionando o valor das indenizações é crescente. Ele estima que 20% a 30% dos diretores e presidentes que perdem o posto recorrem ao tribunais.
¿ O sentimento do executivo, ao ser desligado de forma unilateral, não é diferente de outro funcionário. Há natural sentimento de perda e, mesmo com todo este pacote, não é mais incomum que, muitas das vezes, tais executivos busquem na Justiça o recebimento de uma indenização maior ¿ diz.
A ex-diretora de Recursos Humanos e Serviços Compartilhados da Vale Carla Grasso foi uma das que vivenciou uma discordância de valores devidos. Nos seus cálculos ela teria direito a R$17 milhões, e a mineradora teria proposto R$13 milhões. Os mandatos tanto de Carla como de Agnelli expiraram este mês. Os contratos de ambos, porém, iriam até dezembro de 2012. A Vale não comenta.
Outro exemplo de desentendimento, desta vez, com briga na Justiça é entre Rodolfo Landim e o grupo EBX, de Eike. Landim, que deixou a empresa em abril de 2010, após faturar R$165 milhões em quatro anos, busca na Justiça o direito a 1% da Centennial (empresa que está acima da holding) que Eike lhe prometera, quando trabalhava para ele.
A promessa foi feita em um bilhete escrito, de próprio punho, por Eike. A briga envolve R$493 milhões, segundo fontes. A sentença deve sair após 1º de junho. Procurada, a EBX afirmou que ¿todos os acordos foram integralmente cumpridos¿.