Título: Donos da Copa e do Código
Autor: Braga, Isabel; Alencastro, Catarina
Fonte: O Globo, 29/05/2011, O País, p. 12

No comando de agenda polêmica, PCdoB diz que não traiu bandeiras comunistas

ALDO REBELO: ¿O Código Florestal é de interesse do país. Não tem conflito com a origem do partido¿

BRASÍLIA. Partido ideológico e tradicional, mas ausente de governos estaduais, com presença tímida nas prefeituras e dono de uma bancada de apenas 15 deputados federais, o PCdoB ganha destaque no cenário político com uma agenda controversa. Pelas mãos do governo do PT, partido com o qual mantém aliança há mais de 20 anos, chegou ao comando do Ministério dos Esportes em 2003 e conduzirá o processo governamental para a realização da Copa de 2014 e das Olimpíadas do Rio de 2016. Com um orçamento anual aprovado de R$2,470 bilhões e muitas polêmicas à vista.

Em outra frente, contrariando o PT e o governo, o seu deputado mais antigo, Aldo Rebelo (SP), ganhou as páginas do noticiário com o polêmico relatório sobre o novo Código Florestal e as disputas que se deram em torno dele.

Aldo e o único partido comunista que sobrevive no Brasil com este nome ganharam aplausos e apupos dos representantes dos grandes produtores agrícolas no Congresso. O PT, acompanhado apenas do PV e do PSOL, desferiram críticas pesadas à aliança feita pelo PCdoB para a aprovação do Código, com insinuações de que os comunistas estavam traindo suas causas tradicionais. Uma leitura considerada muito simplista pelos dirigentes e líderes do PCdoB e ainda em análise pelos cientistas políticos.

¿ O Código Florestal é matéria de interesse do país. O povo precisa de alimentos. A agricultura nacional enfrenta concorrência dos países ricos. O partido comunista está do lado dos agricultores. Não tem conflito com a origem do partido. Esses temas interessam ao povo, aos trabalhadores, e ajuda a economia nacional ¿ argumenta Aldo.

Quadro histórico do partido, a deputada Jandira Feghali (RJ) sai em defesa de Aldo e afirma que a bancada fechou com ele em torno do Código Florestal porque o texto é equilibrado. E atende principalmente a agricultura familiar.

¿ Eu me recuso a dizer que Aldo protegeu o grande produtor. Ele teve o mérito de trazer, para dentro do Código, a agricultura familiar e os pequenos produtores. Protegeu com solução que se encaixa no desenvolvimento sustentável. Não há mudança de postura. O PCdoB sempre defendeu os pequenos e continuará assim ¿ disse Jandira.

O presidente do PCdoB, Renato Rabelo, afirma que o partido toma atitude clara e que é abstração acusar a legenda de ficar ao lado dos ruralistas.

¿ O PCdoB está cumprindo seu papel. Aldo não se aliou aos ruralistas. Eles é que, por terem propriedade, engrossaram anseios dos pequenos e médios produtores ¿ disse Rabelo. ¿ Nos grandes problemas, somos chamados. Não pedimos para relatar o Código, buscaram o Aldo. Nas licitações, chamaram a Jandira. Na crise, o PT não tinha condição de concorrer à presidência (da Câmara), buscaram Aldo.

O professor da Universidade de Brasília Camilo Negri, que estuda o comportamento da esquerda, diz que não só no Brasil, mas em todo mundo há um deslocamento ideológico que substitui demandas de redistribuição, como a reforma agrária, por outras bandeiras, como a luta por mais direitos.

¿ Um reflexo desse deslocamento ideológico se dá até mesmo no leque de candidatos. A deputada Manuela (D'Ávila), por exemplo, é eleita com discurso para os direitos dos jovens, longe de bandeira antiga como a defesa do proletariado ¿ afirma o professor.

Também professor da UnB, Lúcio Rennó avalia que a mudança de postura ocorre quando se está no governo:

¿ O PCdoB está há oito anos no governo e isso modera atitudes. O partido aprende a dialogar para construir consensos e viabilizar projetos. Aldo já é líder no parlamento, foi presidente, tem diálogo com todas as correntes.

Militante do PCdoB na juventude, nos anos 80, o coordenador da Campanha Amazônia do Greenpeace, Márcio Astrini, pensa diferente e diz que o partido mudou muito de lá pra cá.

¿ O que me entristece é que quando pulava muro para fazer militância estudantil, sofria a acusação de ser comunista, estar contra o Brasil. Hoje eu ouço a mesma coisa da boca do Aldo, que porque eu sou ambientalista sou contra os interesses da nação ¿ diz Astrini.

Nos Esportes, além do orçamento anual aprovado de R$2,470 bilhões ¿ dos quais, R$869 milhões para despesas correntes e R$1,4 bilhão para investimentos, incluindo emendas parlamentares ¿ muito dinheiro estará em jogo para as grandes obras da Copa de 2014 e das Olimpíadas de 2016.

O governo se mobiliza para criar um regime especial de licitação para obras e garantir a realização dos dois eventos. Do outro lado, há preocupação dos órgãos de fiscalização, como o Tribunal de Contas da União e Ministério Público, com a forma como o governo irá controlar as ações do Ministério do Esporte. A pasta, já sob o comando do PCdoB no governo Lula, foi alvo de uma investigação de irregularidades do programa Segundo Tempo. Segundo as denúncias, recursos do programa foram desviados e repassados a entidades de fachada, núcleos esportivos fantasmas e pessoas ligadas ao filiados do PCdoB.