Título: Derrota esteremece governo de Berlusconi
Autor: Araújo, Vera Gonçalves de
Fonte: O Globo, 31/05/2011, O Mundo, p. 29

Centro-esquerda conquista Milão, reduto do premier, e outras cidades em resultado que pode antecipar pleito nacional

SIMPATIZANTES DO candidato Giuliano Pisapia comemoram em Milão, centro do império de Berlusconi

ROMA. O primeiro-ministro italiano, Silvio Berlusconi, prometeu reagir à derrota que sua coalizão de centro-direita sofreu no segundo turno das eleições locais de ontem e de domingo e que aprofundam divisões na aliança. Milão e Nápoles ¿ no voto mais importante desta rodada eleitoral ¿ escolheram dois candidatos de esquerda como prefeitos, assim como outras cidades do Norte, Sul e Centro da Itália, num pleito que o próprio Cavaliere descrevera como um plebiscito de seu governo e de sua liderança.

A Liga do Norte, vital para a sobrevivência da estreita maioria do governo no Parlamento, também teve grandes perdas, como as cidades de Novara e Pavia, acendendo um alerta sobre a ligação com o polêmico premier ¿ que enfrenta 24 acusações de corrupção e prostituição de menores. Para o ministro do Interior, Roberto Maroni, da Liga, o resultado foi ¿um tapa na cara¿.

¿ Foi uma grande derrota e o grande derrotado é o premier ¿ disse Leonardo Boriani, editor do ¿La Padania¿, jornal da Liga.

Partido Democrata também deverá rever estratégia

Quase sete milhões de italianos votaram. O peso da eleição não estava só na escolha de 88 prefeitos e seis governadores, e certamente afetará o governo nacional. O ex-ministro da Cultura Sandro Bondi, um dos coordenadores do Povo da Liberdade (de Berlusconi), pediu demissão, e vários deputados estariam prontos a virar a casaca.

A derrota mais significativa ocorreu em Milão, capital financeira do país, em mãos da direita desde 1994. O advogado Giuliano Pisapia, um ex-deputado do partido da Refundação Comunista, foi apoiado por todos os partidos de centro-esquerda, vencendo com 55% dos votos. Milão é a cidade natal de Berlusconi, é a sede do seu imenso império de finanças e mídia, além de ser um bastião da Liga.

Em Nápoles, outra cidade estratégica, o candidato de Berlusconi perdeu por 30 pontos percentuais. Para o Cavaliere, a vitória do ex-juiz Luigi De Magistris, com 65% dos votos, traz o cheiro da incapacidade do seu governo de resolver o problema do lixo e reflete o peso que o crime organizado tem no seu partido, com a imposição de um candidato suspeito de ligações com a Camorra, a máfia napolitana. Além disso, foi escolhido um ex-juiz ¿ apesar da campanha de ódio lançada por Berlusconi contra a magistratura, acusando-a de persegui-lo.

Esta é a primeira derrota desde que a coalizão assumiu o governo e pode, segundo analistas, antecipar seu fim.

¿ Esses resultados tornam as eleições antecipadas mais prováveis, possivelmente no próximo ano. E não vejo chances de reformas econômicas significativas serem implementadas por um governo em fim de mandato ¿ avaliou Maurizio Pessato, do instituto de pesquisas de opinião SWG.

O governo prepara planos para combater o déficit orçamentário de US$57 bilhões. No mês passado, o governo Berlusconi reduziu em dois décimos a previsão de crescimento para este ano, passando para 1,1%,

A oposição também não pode comemorar tranquila. Muitos dos vencedores não pertenciam ao principal partido de centro-esquerda, o Partido Democrata (PD). Os eleitores preferiram candidatos novos, mais ligados à sociedade e aos movimentos de cidadania do que os velhos políticos profissionais. E muito mais de esquerda do que a cúpula do PD ¿ que será obrigado a rever a estratégia de aliança com os moderados do centro católico e com ex-berlusconianos. Como resumiu Enrico Mentana, diretor do telejornal La7:

¿ Os italianos decretaram a derrota da velha política. Querem caras novas, mãos limpas e uma primavera que se inspire nos grandes movimentos dos países árabes e de outros vizinhos europeus, como a Espanha dos jovens indignados.

Berlusconi admitiu a derrota, mas negou que haverá consequências para o governo:

¿ Temos que manter os nervos firmes, o governo vai adiante. A coalizão está unida e determinada. E eu, cada vez que sou derrotado, triplico meus esforços ¿ disse, em Bucareste, onde está em visita oficial.

Com agências internacionais