Título: Impunidade agrava situação dos marcados para morrer
Autor: Tinoco, Dandara; Fabrini, Fábio
Fonte: O Globo, 05/06/2011, O País, p. 3

IMPASSE NO CAMPO

Listados pela Pastoral da Terra, ameaçados de morte relatam medo

Viúva do presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Rondon do Pará, José Dutra da Costa, o Dezinho, morto por um pistoleiro em 2000, Maria Joel Dias da Costa, de 48 anos, virou alvo de ameaças e, mesmo sob proteção, diz que tem "medo de sentar numa igreja e falar com Deus". A sensação de insegurança é agravada pela de impunidade: apesar de condenado, o pistoleiro que matou Dezinho fugiu da cadeia, e o principal mandante ficou preso apenas por 13 dias.

Relatos de agressões e mortes sem punição são repetidos por lideranças, trabalhadores rurais, ambientalistas, quilombolas e sem-terra de 16 estados que, assim como Maria, integram a lista de 125 nomes da Comissão Pastoral da Terra (CPT) como ameaçados de morte em 2010. Segundo a Pastoral, de 1.580 assassinatos entre 1985 e 2010 por causa de conflitos no campo, somente 91 chegaram a julgamento. Foram condenados 21 mandantes e 73 executores. Apenas Vitalmiro Bastos de Moura, o Bida, mandante da morte da missionária americana Dorothy Stang, está preso.

Na semana seguinte à execução dos extrativistas José Cláudio Ribeiro da Silva e Maria do Espírito Santo, O GLOBO ouviu histórias de quem vive sob temor e insegurança desde que teve a morte anunciada. A execução do casal, que denunciava a ação de madeireiros no Pará, aumentou essa sensação. José Cláudio e Maria constavam da lista de pessoas que foram intimidadas. Agora engrossam a relação de assassinados. Entre os ameaçados, há casos de perseguições, espancamentos e gente que precisou abandonar a casa para escapar das ameaças. E sobretudo de quem viu amigos e parentes serem assassinados, e os culpados, quando presos, soltos em seguida.

- Os problemas ocorrem desde a investigação até o julgamento - lamenta Isolete Wichinieski, coordenadora da CPT. - Os casos de José Cláudio e Maria não são isolados. A CPT denuncia, o Estado não toma providências, e o fato se consuma. Recebemos a notícia dessas mortes com tristeza e indignação.

Na semana passada, a comissão entregou ao governo uma lista com 1.850 nomes de pessoas ameaçadas entre 2000 e 2011. Na ocasião, a Secretaria Nacional de Direitos Humanos reconheceu não ter condições de garantir a segurança de todos que correm risco.

Pará e Amazonas lideram a lista de estados com relatos de ameaças, com 30 casos cada. São seguidos pelo Maranhão, com 27. Além de denúncias de extração ilegal de madeira, disputas fundiárias e impactos ambientais de grandes projetos empresariais motivam os conflitos.

Apesar de viverem sob precária ou nenhuma segurança, grande parte dos ameaçados de morte não escondeu o rosto para as fotos da reportagem.

*Enviado especial