Título: Nas escolas, entre o descaso e o comprometimento
Autor: Suwwan, Leila
Fonte: O Globo, 05/06/2011, O País, p. 12
Você disse que é preciso acabar com a ideia de ¿sacerdócio¿ do professor, mas, em Goiânia, disse que a diretora era ¿heroína¿. É preciso ser heróico?
IOSCHPE: Depois que falei isso, me arrependi. Justamente porque reforça o estereótipo na coisa sobrenatural. Estava num estado de ¿depressão educacional¿, depois de ver tanta escola ruim e aluno abandonado. Era o terceiro dia e tínhamos passado antes na escola ruim, que era algo de doer na alma. Tinha acabado de ver que, para o aluno pobre e analfabeto, a aula de reforço era taekwondo. Chamar de heroína foi um equívoco. O que ela estava fazendo é ser profissional. Ela era muito boa diretora, muito comprometida.
O que mais chateou?
IOSCHPE: Foi na escola do Pará, que teve paralisação. Um aluno comentou: mais vai ¿grevar¿ de novo? Ou seja, eles até inventaram um verbo. Mas o mais grave é que os alunos nem foram avisados. É um descaso tão grande! Na escola de Goiânia, estava conversando com uma professora no fim do recreio e passou um menino, que tinha cortado o pé, estava sangrado. Ela mandou ir para a aula, e ele cuspiu no pé, para ¿limpar¿ a ferida e foi assim para a classe.
Você falou sobre a ¿cultura de aceitação do fracasso¿. Pode explicar?
IOSCHPE: É essa ideia de que é esperado e obrigatório que aquele aluno vai fracassar na educação, não vai dominar todo o conteúdo, não vai ser aprovado em todas as séries e vai eventualmente abandonar a escola. São escolas que não acreditam que seus alunos possam ser doutores, engenheiros. Isso acaba permeando a cultura da escola, gera menos cobrança e uma certa arrogância no trato com as famílias. Gera uma cultura de aceitação do fracasso, considera isso o normal. Isso acaba afetando até o professor motivado.
A variação de salários tinha efeito na motivação?
IOSCHPE: O que a pesquisa empírica sugere é que não há relação entre o salário do professor e o aprendizado do aluno. Vimos isso muito claramente no ¿JN no Ar¿. Tirando uma escola militar em Belém, onde os alunos pagavam mensalidade, vimos escolas da mesma cidade, da mesma rede, onde professores ganham o mesmo salário. E há diferenças abissais em aprendizado. Os professores não gostam quando falo que não há relação entre salário e aprendizado, mas falo. E com pesar, porque seria uma solução mais simples. Mas o professor está despreparado, está cheio de abobrinhas ideológicas sobre o que é seu papel, está inserido em um sistema que não está se preocupando com o aprendizado. Pagar melhor é vantagem para o professor, mas, para o aluno, não.