Título: Investimento puxa o PIB
Autor: Ribeiro, Fabiana ; Spitz, Clarice
Fonte: O Globo, 04/06/2011, Economia, p. 33

País cresceu 1,3% no 1º trimestre, mas, com inflação, famílias reduziram consumo

Aeconomia brasileira avançou no primeiro trimestre. O crescimento foi de 1,3% frente aos últimos três meses de 2010 e de 4,2% contra janeiro a março do ano passado. Mas o número expressivo esconde uma desaceleração significativa no consumo das famílias, que subiu apenas 0,6% contra 2,3% do trimestre anterior, sofrendo os efeitos das medidas de contenção do crédito tomadas pelo Banco Central e da inflação que corroeu o poder de compra da população. O investimento teve o maior impulso, com alta de 1,2%. Nos últimos quatro trimestres, a economia cresceu 6,2%, abaixo dos 7,5% recordes do ano de 2010. Com o consumo menor, houve acúmulo de estoques, indicador que também faz o Produto Interno Bruto (PIB, conjunto de bens e serviços produzidos no país) subir e o que explica a taxa alta do PIB, mascarando o ritmo mais lento da economia. Daqui para a frente, no entanto, analistas acreditam que a economia deve arrefecer.

- O consumo das famílias sofreu o efeito das medidas macroprudenciais do Banco Central, afetando setores que dependem de financiamento, como veículos, e com o aumento das exigências de crédito para pessoa física. O emprego e os rendimentos cresceram menos também - afirmou Rebeca Palis, gerente de Contas Nacionais Trimestrais do IBGE.

O crescimento menor fica mais claro quando se exclui o acúmulo dos estoques. Pelos cálculos do economista-chefe da LCA Consultores, Bráulio Borges, o PIB, sem os estoques, teria crescido apenas 0,7%:

- O resultado do consumo das famílias foi o mais fraco desde o início de 2009 (ano da recessão de 0,6%). Houve um acúmulo de estoques indesejado, o que explica a queda da produção industrial em abril (recuo de 2%). Com estoques altos, a indústria produziu menos.

Borges cita o exemplo das montadoras, com pátios cheios, suficientes para 30 dias de vendas, contra o prazo ideal de 20 a 25 dias. No setor siderúrgico, outro acúmulo: estoque para mais de quatro meses. O setor costuma estocar produção para 2,6 meses:

- Diante disso, o investimento pode até ser negativo no segundo trimestre - diz Borges.

Crédito menor afeta resultado de bancos

A intermediação financeira, ramo econômico que tem se mantido na liderança da expansão, ficou menor no primeiro trimestre. A queda foi de 0,4%, a primeira desde o tombo na economia do fim de 2008, no auge da crise global. A supervisora de call center Kátia Cristina Brito é um exemplo desse freio no crédito. Depois de enfrentar uma dívida que crescia como bola de neve, Kátia fala hoje o que mulher nenhuma imagina pronunciar um dia na vida:

- As vitrines são feias. Todas são feias. E minhas filhas e meu marido não precisam, não querem e não gostam de nada disso que estou vendo!

Encantada com a facilidade de crédito, só percebeu o estrago financeiro quando veio a fatura do cartão com os juros.

- O cartão de crédito estourou, a conta do banco estourou e eu não sabia o que fazer. Fiquei apavorada, com uma dívida total de R$5 mil.

Para Eduardo Velho, economista-chefe da Prosper Corretora, o consumo das famílias continua em rota de desaceleração nos próximos trimestres.

- O cenário está em linha com o Banco Central. Uma desaceleração da economia pressiona menos a inflação e retira a necessidade de novas medidas que envolvam compulsórios ou IOF. E dá espaço para apenas mais duas subidas de juros, ou, como já se fala no mercado, apenas mais uma neste ano - comenta Velho, acrescentando que a inflação foi um freio mais forte no consumo do que a contenção de crédito.

Outro indicador que mostrou a economia mais contida foram as importações. Houve queda de 1,6%, algo que não era visto nas contas nacionais desde o primeiro trimestre de 2009. Até mesmo o investimento, a vedete deste PIB, com a maior alta, teve um desempenho abaixo do esperado. O crescimento foi de 8,8% contra o primeiro trimestre de 2010, bem abaixo das projeções que giravam entre 12% e 15%. E a taxa de investimento (a parcela do PIB destinada a aumentar a capacidade produtiva do país) ficou em 18,4%, superior à de 2010 de 18,2%, mas ainda ligeiramente abaixo do período anterior à crise, quando o indicador chegou a 18,5% em 2008.

Segundo Fernando Puga, diretor do BNDES, o crescimento dos investimentos deve ser de duas vezes a expansão do PIB neste ano. E isso mesmo num cenário em que o Programa de Sustentação do Investimento (PSI), que representa cerca de 40% dos recursos do banco de fomento, teve redução no volume de desembolsos e os juros ficaram mais altos.

- Há uma tendência nítida de continuidade dos investimentos.

Cresce imposto com importação

Na oferta de produtos, a indústria (2,2%) e agricultura (3,3%) tiveram os melhores desempenhos contra o último trimestre de 2010. Contra o início do ano passado, os serviços se destacaram com expansão de 4%.

Os impostos, ainda amparados pelas importações que ficaram positivas frente ao início de 2010, subiram 6,5%, bem acima dos 4,2% da economia como um todo.

Diante do número do primeiro trimestre, cada vez mais bancos e consultorias estão acreditando que a economia crescerá menos de 4% este ano. Um freio considerável frente aos 7,5% de 2010. As projeções estão entre 3,6% e 4,7%. De oito bancos e consultorias, seis estão com previsões abaixo de 4%. Para o período de abril a junho, as expectativas são de que o ritmo da economia continue lento.

- O resultado do segundo trimestre me parece mais relacionado a fatos atípicos, como a indústria sofrer consequências da tsunami japonês e das greves em maio, do que a um resultado das politicas do governo - disse Sérgio Vale, economista-chefe do MB Associados.

No primeiro trimestre, o PIB ficou em R$939,6 bilhões.

COLABOROU: Adauri Antunes Barbosa