Título: Salários cortados
Autor: Gomes, Marcus Vinicius
Fonte: O Globo, 07/06/2011, Economia, p. 25

Greve na Volks já dura 34 dias e para produção de autopeças no Paraná. Mais de 3 mil ficam sem receber

A greve na fábrica da Volkswagen em São José dos Pinhais, na região metropolitana de Curitiba, que entra hoje em seu 34º dia, começou a doer no bolso dos metalúrgicos. A montadora suspendeu o pagamento de cerca de 3.100 funcionários referente à folha de maio, que deveria ter sido feito até a última sexta-feira. Como alternativa, o Sindicato dos Metalúrgicos de Curitiba e Região determinou a distribuição de mil reais a cada trabalhador grevista, usando recursos provenientes do fundo de greve da entidade. No total, foi repassado às contas bancárias dos operários o equivalente a R$3 milhões.

Esta é a mais longa paralisação em uma unidade da montadora alemã em todo o mundo. Os trabalhadores reivindicam uma Participação nos Lucros e Resultados (PLR) de R$12 mil, com o pagamento da primeira parcela no valor mínimo de R$6 mil. É o mesmo valor conquistado pelos metalúrgicos da Renault/Nissan no Paraná. Também no Paraná, a Volvo ficou parada por três dias até a montadora acertar o pagamento de R$15 mil. Como contraproposta, a Volks propôs uma primeira parcela de R$4.600. Posteriormente, diante da resistência do sindicato, elevou sua oferta para R$5.200. Mas condicionou o pagamento de uma eventual segunda parcela a uma nova negociação, em setembro, data-base da categoria.

Está marcada para hoje uma nova rodada de negociações. Diante do corte nos salários, o sindicato não quer só o PLR nas exigências para volta ao trabalho. Nas reivindicações, entra agora o pagamento dos dias parados.

Os metalúrgicos realizaram ontem à tarde nova assembleia em frente ao pátio da montadora para avaliar os rumos da greve, sem promover deliberações. Além do presidente do sindicato local, Sérgio Butka, também participaram da manifestação o deputado federal e presidente da Força Sindical, Paulo Pereira da Silva (PDT-SP), e o presidente da Federação dos Metalúrgicos de São Paulo, Miguel Torres.

Montadora calcula prejuízo de R$1,1 bi

Depois de 34 dias de greve, cálculo da diretoria financeira da Volks estima que o prejuízo já chega a R$1,1 bilhão. A montadora produz 840 carros/dia dos modelos Golf, Cross Fox e Fox, cujo preço médio nas concessionárias é de R$40 mil por unidade. Problema também para as empresas que dependem da montadora. O presidente da seção Paraná do Sindicato Nacional de Componentes para Veículos Automotores (Sindipeças), Benedito Kubrusly, avaliou que o longo tempo de greve pode provocar uma tsunami, levando as empresas de autopeças a fecharem as portas.

Há duas semanas, ao menos 5 mil trabalhadores do setor no estado estão em férias coletivas, aguardando uma solução para a paralisação na Volks. Boa parte desses trabalhadores opera para a empresa alemã no sistema just in time, ou seja, fornecem os componentes na medida em que os automóveis entram na linha de montagem.

Só no Parque Industrial de Curitiba, o número de trabalhadores que entraram em férias coletivas é de 1.800. Das 16 empresas de autopeças localizadas nas imediações da Volkswagen, apenas duas atendem a outras montadoras. Entre as marcas, estão a Benteler, que fabrica componentes mecânicos para a Volks, e a Metagal, responsável por retrovisores e tanques de combustível.

Kubrusly não se arrisca a calcular o prejuízo das empresas de autopeças, mas enumera problemas relacionados à logística e à mão de obra, que, segundo ele, podem inviabilizar a permanência de empresas no estado.

Caso não haja acordo entre a empresa e o sindicato, o dissídio coletivo está marcado na Justiça do Trabalho apenas para o dia 20 deste mês, o que somaria 47 dias de paralisação. Segundo a assessoria de imprensa do órgão, a data só pode ser antecipada se for convocada uma reunião extraordinária da Sessão Especializada, composta por 13 desembargadores, que julga os dissídios coletivos.

O secretário de Indústria e Comércio do Paraná, Ricardo Barros, disse que a falta de diálogo entre o sindicato e a empresa pode tornar hostil o ambiente para a instalação de seis montadoras com as quais o governo do estado negocia.

- É fundamental assegurar as conquistas do trabalhador, desde que isso não tire a competitividade do Paraná. Esse filme já foi visto. Não pode ocorrer aqui o mesmo que ocorreu no ABC paulista na década de 80, quando as constantes greves de metalúrgicos acabaram afastando as montadoras da região.

Butka, do sindicato dos metalúrgicos, voltou a culpar a Volks pelo longo período de paralisação:

- Na primeira reunião de conciliação na Justiça do Trabalho, a empresa mostrou-se inflexível, talvez prevendo que a adesão à greve não ocorreria. Nossa capacidade de mobilização mostrou que eles estavam enganados.

Ainda no início da paralisação, o presidente da Volks no Brasil, Thomas Schmall, afirmou em nota que as reivindicações ameaçavam a sustentabilidade da fábrica e colocavam em risco a manutenção dos empregos. Schmall dissera ainda que a montadora tem "o claro objetivo de negociar com o sindicato". Segundo a nota, "a negociação de uma PLR com base na realidade do mercado e do desempenho da fábrica é fundamental para as decisões de investimento futuro, bem como da manutenção do nível de emprego". À época, a empresa argumentou também que, no intervalo de quatro anos, o volume de produção de suas unidades de São Bernardo do Campo, no ABC paulista, e Taubaté, no interior de São Paulo, havia crescido 42%, contra apenas 3% na fábrica do Paraná.

Paraná passou de oásis a problema

No início da década de 90, o Paraná foi considerado uma espécie de oásis para as montadoras que pretendiam escapar das negociações duras com os sindicatos do ABC paulista. Com incentivos fiscais oferecidos pelo governo do estado e um sindicato metalúrgico de pouca representatividade, instalaram-se na região da Grande Curitiba empresas como Renault, Volkswagen, Volvo e Audi, que posteriormente fundiu-se com a Volks.

COLABOROU Adauri Antunes Barbosa