Título: Corrida do poder
Autor: Rothenburg, Denise
Fonte: Correio Braziliense, 10/08/2009, Política, p. 4

Estamos em agosto. Até agora, os ¿coronéis e cangaceiros¿, para relembrar as palavras com que Renan Calheiros e Tasso Jereissati se apresentaram, não se mexeram nem cobraram atitude firme na prevenção de um novo surto de dengue que fatalmente virá no verão.

Enquanto o mundo político volta suas atenções para a crise do Senado, corre nos bastidores do governo e do Congresso uma guerra pelo poder de dar as cartas no uso dos recursos na exploração de petróleo da camada pré-sal. Semana passada, em entrevista ao jornal Valor Econômico, a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, deu a entender ¿ pelo menos aos políticos que não tiram os olhos deste assunto ¿ a sua vontade de não deixar tudo nas mãos da futura ¿Petrosal¿.

Na entrevista, Dilma deu duas informações que deixaram de cabelo em pé o PMDB, que não vê a hora de controlar a futura Petrosal : 1) A Agência Nacional do Petróleo (ANP) pesquisará o potencial do pré-sal, o que não foi apenas um reforço, já que esta atribuição está na lei do petróleo. 2) A agência terá recursos para essa análise geológica e o apoio da Petrobras, que poderá ficar com os blocos mais promissores sem licitação. Sobre a Petrosal, Dilma afirmou que terá um corpo técnico e coisa e tal.

Para o leitor comum, as declarações podem representar mais do mesmo. Mas, para os políticos, antenados na disputa de poder e acostumados a ler os meandros de qualquer declaração, ela deu uma volta no PMDB do ministro de Minas e Energia, Edison Lobão.

Até então, todos diziam que a Petrosal seria uma espécie de ¿o cara¿ da exploração das novas descobertas, detentora da voz de comando. E, agora, Dilma informou que esse papel caberá à Petrobras. É como se Lobão apostasse num novo astro, como os meninos de High School Musical, para essa perfomance exploratória, e Dilma, na hora de levar o projeto ao Congresso, escolhesse alguém mais experiente, como um George Clooney, no caso, a Petrobras.

Os aliados do governo vão debater esse ponto por uma questão muito simples: geralmente, o comando da Petrobras fica com o partido do presidente da República, enquanto o titular do Ministério de Minas e Energia costuma ser alguém da base, que não jogue apenas para o Planalto. O mesmo pode ocorrer com a chamada Petrosal.

Outro ponto que a oposição promete debater em profundidade na hora de discutir o pré-sal é o fundo a ser criado para servir de berço aos recursos arrecadados. A ideia é canalizar essa verba para saúde e educação. Ok, mas por que um novo fundo, se já existe um fundo nacional de educação e outro de saúde?

Nos tempos do governo Fernando Henrique Cardoso, o sucesso do programa Bolsa-Escola fez crescer os olhos dos políticos. Foi uma corrida do ouro pelo vale-isso, vale-aquilo. Da área de Minas e Energia, veio o vale-gás; da Saúde, surgiu o vale-nutrição. O país se viu coberto de bolsas. Lula juntou tudo no Programa Bolsa Família, e deixou nas mãos do PT, do ministro do Desenvolvimento Social, Patrus Ananias.

Agora, está aberta a temporada de proliferação dos fundos que prometem mais do mesmo, ou seja, recursos para saúde e educação. No meio político, a explicação para justificar a criação de mais um fundo fica na divisão mais equânime do poder, ou seja, quem está na saúde já cuida do Fundo Nacional de Saúde, a educação administra o seu. Quem estiver na Petrosal, ou no Ministério de Minas e Energia, terá o comando desse novo fundo. E a negociação da lei desse novo fundo, calculam os analistas, provocará uma verdadeira corrida entre os partidos dentro do Congresso.

Se o dinheiro for aplicado onde deve, menos mal. Afinal, o brasileiro está cansado de ver o ministro da Saúde, José Gomes Temporão, reclamando da falta de dinheiro para controle da gripe suína. E olha que, no momento, ninguém está falando da dengue, uma doença que mata mais e que, no verão, estará de volta. Estamos em agosto. Até agora, os ¿coronéis e cangaceiros¿ ¿ para relembrar as palavras com que os senadores Renan Calheiros (PMDB-AL) e Tasso Jereissati (PSDB-CE) se apresentaram um ao outro ¿ não se mexeram nem cobraram uma atitude firme na prevenção de um novo surto de dengue que sempre aparece em dezembro e janeiro.

Seria maravilhoso se alguém estivesse preocupado com a população em vez de ficar apenas na disputa do poder que envolve o Senado, o pré-sal, os fundos, 2010 e o que mais chegar. Só que, até agora, nada indica que isso vai mudar. É uma pena.