Título: Na pauta, Lina Maria
Autor: Brito, Ricardo
Fonte: Correio Braziliense, 12/08/2009, Política, p. 4

Oposição quer ouvir ex-titular da Receita na CPI. Mas governo tenta impedir convocação

Cartaxo não soube explicar se a manobra tributária da Petrobras foi ilícita

O esquema de guerra montado pelo Ministério da Fazenda para blindar o secretário interino da Receita Federal, Otacílio Cartaxo, no depoimento de ontem à CPI da Petrobras, não funcionou. E os esclarecimentos de Cartaxo reforçaram ¿ ao menos para a oposição ¿ a necessidade de a ex-titular do Fisco Lina Maria Vieira prestar contas ao Senado. Com declarações técnicas, mas pouco esclarecedoras, Cartaxo não explicou por que a antecessora questionou, em nota à imprensa, uma manobra tributária que teria resultado numa compensação de R$ 4,3 bilhões para a Petrobras em 2008. Na CPI, a base aliada descarta convocar Lina Maria, mas governistas admitem que ela pode ser chamada por outra comissão da Casa.

Durante a sessão, Cartaxo, auxiliado por 10 pessoas, entre técnicos e assessores, disse que a Receita Federal ainda não sabe se a estatal compensou indevidamente os bilhões de reais por causa de ganhos decorrentes de uma medida provisória editada em 2001. A MP permitiu a empresas alterar, durante um determinado ano, a forma de cobrança de impostos com o câmbio para amenizar os efeitos da crise cambial da época. A Petrobras alterou no ano passado a forma de apuração de ganhos cambiais, o que resultou numa economia de R$ 1,14 bilhão. A estatal se defendeu, alegando que a decisão tem amparo legal. ¿A matéria não possui entendimento pacificado dentro da Secretaria de Receita Federal¿, endossou Cartaxo.

Minutos depois, porém, o interino do Fisco não soube explicar por que em 11 de maio, ainda na gestão de Lina Maria, a Receita emitiu nota à imprensa em que criticava a mudança fiscal. A nota foi lida pelo senador Álvaro Dias (PSDB-PR), durante o depoimento. Esse teria sido o motivo da demissão de Lina Maria, mês passado, pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega. ¿A Receita Federal não anuncia suas posições por meio de notas de esclarecimento¿, chegou a afirmar Cartaxo.

Dilma Entretanto, Cartaxo não convenceu os oposicionistas, que viram na falta de clareza no caso da Petrobras mais um motivo para convocar Lina Maria. Além de esclarecer o caso da suposta manobra contábil, a oposição deseja ouvir a ex-titular da Receita sobre as declarações dadas por ela à Folha de S. Paulo no domingo. Em entrevista ao jornal, Lina Maria disse que se reuniu a sós com a ministra Dilma Rousseff em dezembro do ano passado. A titular da Casa Civil e escolhida pelo presidente Lula para sucedê-lo no Planalto teria pedido para Lina Maria ¿agilizar¿ uma investigação fiscal contra o empresário Fernando Sarney, filho do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), um dos principais aliados de Lula no Congresso. A então titular da Receita recebeu a solicitação como um pedido para encerrar as apurações.

A oposição queria ouvi-la já amanhã na CPI, mas a base aliada descartou a convocação. ¿Não vejo nenhuma necessidade de ouvir a Lina¿, disse o relator da CPI e líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR). Pela manhã, Jucá se reuniu com senadores da CPI, que concordaram com a ida de Lina Maria para outra comissão. A oposição divide-se entre convocá-la na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), ou na Comissão de Assuntos Econômicos.

Caso Lina Maria confirme as declarações, os oposicionistas apostarão na convocação da ministra Dilma Rousseff. Querem criar um desgaste em ano pré-eleitoral, mas a convocação de Dilma é inegociável em qualquer comissão, segundo aliados. ¿Há coisas que a gente não afirma, prova¿, desafiou Rousseff, mais uma vez, negando que tenha tido um encontro com a ex-secretária de Receita.

Colaborou Deco Bancillon

Investigações

O pedido de instalação da CPI da Petrobras pede a apuração dos seguintes fatos: Steferson Faria/Agência Petrobras/Divulgação

Licitações para reforma de plataformas de exploração de petróleo apontadas pela Operação Águas Profundas, da Polícia Federal;

Contratos de construção de plataformas e superfaturamento na construção da refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, detectados pelo Tribunal de Contas da União;

Desvio de dinheiro dos royalties do petróleo, apontado pela Operação Royalties, da Polícia Federal;

Pagamentos, acordos e indenizações feitos pela ANP a usineiros, como apontaram investigações do Ministério Público Federal;

Uso de artifícios contábeis que resultaram na redução do recolhimento de impostos e contribuições no valor de R$ 4,3 bilhões;

Uso de verbas de patrocínio da estatal.