Título: Para OAB, STF defende liberdade de expressão
Autor:
Fonte: O Globo, 17/06/2011, O País, p. 10

Decisão de liberar Marcha da Maconha é elogiada pela Ajufe; especialistas destacam que promover o debate é positivo

BRASÍLIA e SÃO PAULO. A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e a Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) elogiaram a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de permitir manifestações favoráveis à descriminalização do uso da maconha. Segundo o presidente nacional da OAB, Ophir Cavalcante, o STF agiu de acordo com a Constituição ao defender a liberdade de expressão. Já o presidente da Ajufe, Gabriel Wedy, disse que a Corte está atenta à evolução cultural da sociedade brasileira.

- O Supremo Tribunal Federal teve uma decisão de acordo com a Constituição Federal, defendendo a liberdade de expressão, sem permitir o uso de drogas, que é crime. Isso ficou muito claro no julgamento - afirmou Cavalcante, acrescentando: - A questão está posta em nível mundial. A descriminalização está sendo tratada no mundo inteiro por especialistas como um problema de saúde pública. O Supremo garantiu o debate.

Supremo enfrentou "ranço cultural"

Wedy também elogiou o STF, que, segundo ele, assume um papel importante na defesa de garantias institucionais e no fortalecimento do estado de direito no Brasil:

- A Corte não se manifestou favorável à liberação das drogas no Brasil, e sim à observância da garantia constitucional das liberdades de pensamento, expressão e de reunião de setor da sociedade que quer aprofundar o debate sobre a legalização da maconha para determinadas finalidades - disse.

Para o jurista Walter Maierovitch, ex-secretário Nacional Antidrogas no governo Fernando Henrique Cardoso, o ponto mais positivo da decisão do Supremo foi o de enfrentar o que chama de "ranço cultural" criado em torno desse debate. Segundo ele, essa é uma consequência do modelo americano criminalizante adotado no Brasil:

- Há um ranço cultural criado, a partir do modelo americano criminalizante, apesar do grande empenho do governo Fernando Henrique que, mesmo assim, acabou sucumbindo a isso. As bancadas católica e evangélica não permitiram que não mais se criminalizasse o porte de drogas - disse Maierovitch.

Ele lembrou ainda que também o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, mesmo tendo prometido, em 1998, descriminalizar o porte da maconha para uso próprio, não conseguiu convencer as bancadas ligadas às igrejas.

- Ele só tirou a pena de prisão e manteve a posse da droga como crime.

Maierovitch disse que, há dois meses, a União Europeia recomendou que os países daquele continente sigam o exemplo de Portugal, que adotou uma nova legislação sem punição para o porte da droga para consumo próprio:

- O resultado dessa nova lei é que houve uma redução significativa do consumo, que chegou a quase 30%.

Decisão do STF é "teoricamente correta"

Na avaliação do jurista Antonio Cláudio Mariz de Oliveira, a decisão do STF "foi corajosa e teoricamente correta", de ponto de vista da liberdade de expressão. Mas frisou que há um risco a ser enfrentado, já que o uso da maconha continua sendo crime:

- Ao lado do ato de coragem e de correção teórica, é uma decisão que vem acompanhada de risco porque o uso da maconha é crime. E no aspecto da cultura imperante na sociedade, houve uma contradição, já que não se pode, não se admite fumar maconha - analisou o jurista.

Outro aspecto que Mariz considerou positivo é a abertura de uma discussão que, para ele, começa tardiamente:

- É preciso rediscutirmos o uso não só da maconha, mas dos tóxicos de modo geral. E essa decisão permite que essa discussão venha à lume para chegarmos aos caminhos para a solução do problema. Todos sabemos que o combate da forma atual é como enxugar gelo, além de existirem grandes interesses financeiros nesse combate. E não tem havido diminuição do uso desses tóxicos.