Título: BNDES: operação sem benefícios claros
Autor: Melo, Liana
Fonte: O Globo, 29/06/2011, Economia, p. 24

Economistas criticam banco estatal no negócio Pão de Açúcar/Carrefour

Henrique Gomes Batista

RIO e ASSUNÇÃO. Em um momento de necessidade de investimentos em infraestrutura e carência de recursos, a atuação do BNDES na operação entre Pão de Açúcar/Carrefour foi duramente criticada por economistas. Muitos acreditam que o negócio não justifica a utilização de até 2 bilhões (cerca de R$4,5 bi) de um banco público, que pode até prejudicar consumidores e fornecedores das redes. A falta de transparência do banco de fomento, que se recusou a dar detalhes da operação - a quinta maior do BNDES - também foi criticada por especialistas.

O Pão de Açúcar afirmou que o BNDES entrará com 1,7 bilhão (cerca de R$3,9 bilhões), mas a nota do banco afirma que está avaliando o projeto "de até 2 bilhões", ou R$4,534 bilhões. O BNDES não detalhou a operação, sob o argumento que está em análise, mas disse na nota diz que ela "abre caminho para maior inserção de produtos brasileiros no mercado internacional".

Para Armando Castelar, economista da Fundação Getúlio Vargas, o fato de existir sigilo bancário não impediria o BNDES de explicar os motivos do negócio. Ele afirmou que o argumento de abrir caminho para produtos brasileiros não é factível, pois há outras maneiras de promover a exportação:

- O banco poderia, respeitando o sigilo bancário, explicar em que isso favorece a sociedade, além de beneficiar o Carrefour e a família Diniz.

Além de contar com dinheiro do FAT, desde 2008, o BNDES recebeu empréstimos de R$231 bilhões do Tesouro, que aumentou o endividamento do país. Para Carlos Lessa, ex-presidente do banco, o BNDES está se transformando no "banco das multinacionais":

- O apoio do banco a projetos no exterior deveriam ser avaliados com muita parcimônia e em casos excepcionais e não como estratégia, como vem ocorrendo. O Brasil sempre foi um grande exportador, não precisa ser sócio minoritário de um supermercado na França para garantir mercado lá fora.

Para o professor Antônio Corrêa de Lacerda, da PUC-SP, a participação do banco estatal só se justificaria se houvesse ampliação da atividade econômica e dos empregos no país ou facilitação de acesso de produtos brasileiros a outros países:

- A internacionalização, em si, não é justificativa para o apoio do BNDES. Mas temos que lembrar de casos como a Metal Leve e a Cofap, que não foram apoiadas, acabaram compradas e o Brasil perdeu este ativo.

O ministro da Fazenda, Guido Mantega, disse ontem à noite no Paraguai considerar legítima a possibilidade do BNDES aportar recursos na operação:

- O BNDES financia recursos para todos os grandes privados do país e o Ministério da Fazenda não fica fazendo fiscalização - disse ele, tratando a questão como "uma questão comercial".

COLABOROU: Flávio Freire