Título: O sonho da 'house' própria
Autor: Batista, Henrique Gomes
Fonte: O Globo, 04/07/2011, Economia, p. 18

Com dólar barato, dobra a compra de imóveis por brasileiros no exterior. Miami se destaca

Acombinação de dólar barato, preços baixos por causa da crise mundial e facilidade de financiamento em outros países está criando uma onda de brasileiros comprando imóveis no exterior. E ainda: a valorização dos imóveis brasileiros, especialmente no Rio, torna a casa própria no exterior um sonho a ser realizado - ao menos para quem tem uma poupança de, no mínimo, R$500 mil. Bancos veem o ritmo de negócios em velocidade duas vezes superior ao registrado há um ano, e corretores estrangeiros especializados nesse segmento contam que está sendo o melhor ano desde o Plano Real - superando os resultados de 1997, quando havia paridade na cotação entre as duas moedas. Negócios têm sido fechados sobretudo nos Estados Unidos, mas também na Europa e na América Latina. E o perfil do comprador tem mudado: além do investidor que quer diversificar sua carteira, há cada vez mais pessoas que compram casa de veraneio em outros ares.

Maria Eugênia López, diretora do Private Banking do Santander no Brasil, conta que a demanda está muito aquecida. Segundo a executiva, nos últimos 12 meses o número de brasileiros que compraram imóveis lá fora é o dobro do ano anterior. O carro-chefe é a cidade de Miami.

- Muita gente está comprando a primeira residência no exterior. Mas temos um cliente, por exemplo, que, de uma vez, comprou 18 casas na Flórida. Pegou um financiamento com juros baixos nos Estados Unidos e, com o aluguel, paga o financiamento.

Ela conta que a imensa maioria dos clientes desta divisão do banco - que precisam dispor de pelo menos R$3 milhões - busca imóveis para investir. A diretora acredita que, enquanto houver real valorizado, imóveis com preços depreciados em países ricos e bons juros no exterior, a compra de imóveis vai continuar.

Sócio do Sofi Property Group, corretora em Miami, Lipe Medeiros afirma que triplicou nos últimos meses o número de funcionários - todos brasileiros ou falando português.

- Existe um mercado emergente, principalmente em Miami. É uma cidade que atrai o brasileiro emergente que não fala bem o inglês, mas aqui pode se virar com o portunhol - afirma Medeiros.

O alvo dos brasileiros em Miami começa em US$250 mil, mas a média fica na faixa de US$1 milhão. Com uma quantia entre US$750 mil e US$1,2 milhão é possível comprar o tipo mais procurado pelas famílias brasileiras na cidade mais conhecida da Flórida: um apartamento de três quartos perto de praia e shopping.

- A impressão é que o brasileiro sai para comprar xampu na farmácia, passa na porta da corretora e compra um apartamento - diz Chris Brooks, corretora em Miami há 13 anos.

Hipoteca com prazo de 30 anos assusta

Rossana Duarte, sócia da área imobiliária do TozziniFreire, afirma que tem sentido um aumento de clientes do escritório que buscam orientação jurídica para compra de imóveis no exterior. A advogada diz que a compra de bens em outros países precisa considerar detalhes como o registro no Banco Central e o Imposto de Renda.

- Uma das coisas que sentimos é o interesse por imóvel de veraneio, de um público que não tem tanto dinheiro como o público que normalmente compra no exterior.

Chris Brooks confirma a busca por casas de veraneio. Há três anos na Flórida, ela diz que o mercado nunca esteve tão bom como agora:

- No último mês vendi seis casas a famílias de brasileiros. Há um ano, a média era de dois, três negócios por mês. Estamos com cerca de 30% mais negócios que em 1997, quando o real forte também incentivava as vendas.

Segundo Chris, os imóveis que os brasileiros buscam estão na faixa dos US$600 mil (cerca de R$930 mil). Ela conta que esse comprador normalmente fica com o imóvel para uso exclusivo por cerca de dois anos, a fase do "encantamento", e depois aceita alugar o bem por temporada ou emprestar para amigos:

- Uma casa de US$600 mil, por exemplo: se a pessoa der US$240 mil (R$372 mil), financia em 30 anos com juro anual de 5%, o que dá uma parcela mensal de US$1.932 (R$3.045).

Há muita procura também em Nova York, mas Marcos Cohen, vice-presidente executivo da corretora Douglas Elliman, diz que a proporção é de um comprador brasileiro na Big Apple para cada dez em Miami.

- O mercado de Nova York não é tão especulador quanto o de Miami. Muitos brasileiros vêm atrás de barganhas, mas elas quase não existem aqui - diz Cohen, que chegou ao posto de segundo melhor corretor entre os 3.200 da Douglas Elliman em 2010, por causa dos resultados obtidos com brasileiros, chineses e russos.

Segundo corretores, 80% dos brasileiros liquidam a compra à vista. Corretora em Nova York da imobiliária Corcoran, uma das gigantes do ramo, a paulista Daniela Sassoun diz que os brasileiros se assustam com uma hipoteca a ser paga em 30 anos.

- Meus clientes me dizem: "Não vou conseguir dormir devendo tanto dinheiro por tanto tempo" - conta a corretora, que vendeu a famílias brasileiras quatro apartamentos, de 240 metros quadrados cada, em prédio da Rua 66.

Para Lipe Medeiros, quem compra para investir consegue ter um retorno de rendimento do capital de 15% a 18% ao ano, e pode lucrar na revenda.

(*) Correspondente