Título: Um empresário bem-sucedido que coleciona polêmicas
Autor: Ribeiro, Fabiana
Fonte: O Globo, 29/06/2011, Economia, p. 26

Da pequena loja de doces ao império do varejo, Diniz terá que convencer governo e sociedade sobre consequências da fusão

ABILIO DINIZ (à direita) acompanha padre, que benze loja em São Paulo

O EMPRESÁRIO aparece na janela do cativeiro onde ficou durante seu sequestro

ARTHUR SENDAS e Diniz anunciam a compra da tradicional rede pelo Pão de Açúcar

MICHAEL KLEIN cumprimenta o empresário no anúncio da fusão das duas empresas

Gilberto Scofield Jr. gils@oglobo.com.br

SÃO PAULO. Há quem diga que o projeto do dono do Pão de Açúcar, Abilio Diniz, 74 anos, de se associar ao gigante francês Carrefour não terá que superar apenas a barreira de suas desavenças com o sócio Jean-Charles Naouri, do Casino. Diniz terá que provar ao Cade que a fusão não é concentradora no varejo, prejudicando o consumidor. E ainda terá que convencer boa parte dos brasileiros de que o bilionário financiamento ¿ usando dinheiro público ¿ é de vital interesse do país, não apenas dele próprio. A tarefa parece hercúlea, mas o histórico de embates pessoais e profissionais de Diniz ¿ que inclui outras disputas com sócios, uma gigantesca briga familiar e até um sequestro ¿ o credenciam para a nova empreitada, que parece estar apenas começando.

Em 1948, o português Valentim dos Santos Diniz abriu a loja de doces Pão de Açúcar e, a partir de 1959, o comércio ganhou ares de grupo, quando Seu Diniz fundou o primeiro supermercado, tendo o filho como seu maior colaborador. Durante os anos 80, a empresa passou a barreira do bilhão de reais de faturamento e abrigava interesses em vários setores (de turismo a frigoríficos).

Na mesma década, a decisão do patriarca de doar 38% das ações a seus cinco filhos com base no quanto cada um se envolvia com os negócios foi o estopim da crise familiar. Abilio ganhou 16% dos papéis, seus irmãos Alcides e Arnaldo, 8% cada, e as três mulheres, 2% cada uma. Alcides, falecido em 2006, não se conformou. Para evitar que o grupo fosse fatiado, Abilio convenceu a família a vender para ele suas partes na rede. Em 1992, tornou-se dono do Pão de Açúcar, em sociedade com a caçula Lucilia, que decidiu manter seus 2%.

Nesse meio tempo, outro desafio, bem mais perigoso. Em 11 de dezembro de 1989, Abilio foi sequestrado pelo grupo terrorista chileno Movimiento de Izquierda Revolucionaria, mas o episódio só foi revelado após a libertação do executivo, no dia 16 de dezembro, véspera do segundo turno da primeira eleição direta para presidente no Brasil, quando a polícia estourou seu cativeiro em meio a uma negociação de resgate de R$30 milhões. Nada que o impedisse de retomar as rédeas do Pão de Açúcar e empreender um dos mais radicais programas de reestruturação do país, com a demissão de metade dos empregados e o fechamento de um terço das lojas.

As compras de outros grupos, como Sendas (em 2003, Diniz adquiriu 60% da rede) ou Casas Bahia (em 2009), não correram sem atritos. Em 2005, quando Diniz fechou com o Casino, os Sendas decidiram recorrer a uma Corte de Arbitragem exigindo revisão do valor do negócio com base nos números fechados com os franceses, além de solicitarem que o Pão de Açúcar comprasse os 40% restantes, conforme firmado em memorando. No caso das Casas Bahia, Michael Klein ameaçou derrubar a fusão se Diniz não pagasse ¿o justo¿.

¿ Do ponto de vista empresarial, Diniz é um trator ¿ diz o economista e professor da Faculdade e Economia e Administração da USP Nelson Barrizzelli, especialista em Finanças e Marketing. ¿ É conhecido por ser um administrador agressivo, que gosta de ter o comando dos processos e não mede consequências na busca de seus objetivos.

Apesar da idade, dedica-se a atividades físicas, que pratica diariamente. Pelo seu histórico de brigas entre irmãos e separações, família para ele são os quatro filhos ¿ Ana Maria, 49 anos, João Paulo, 47, Adriana, 45, Pedro Paulo, 40 ¿ e os netos. Possui como hobby esquiar, e desde o sequestro todos andam de carro blindado e seguranças pessoais.