Título: Oposição questiona prazo para regresso de Chávez
Autor: Figueiredo, Janaína
Fonte: O Globo, 02/07/2011, O Mundo, p. 39
Vice diz que presidente pode se ausentar da Venezuela por até seis meses; confirmação de câncer não ameniza incertezas
janaina.figueiredo@oglobo.com.br
BUENOS AIRES. A confirmação de que o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, foi operado e está sendo tratado em Cuba de um tumor cancerígeno não acalmou o nervosismo que há quase um mês predomina em seu país. Ontem, o vice-presidente, Elías Jaua, assegurou que Chávez "está em pleno exercício de suas competências físicas e mentais" e lembrou que a Constituição permite ao presidente ficar até seis meses no exterior, interpretação questionada pela oposição e por analistas políticos. A confusão é cada vez maior, e os venezuelanos continuam sem saber quando Chávez retornará ao país e se a doença diagnosticada pelos cubanos lhe permitirá continuar governando e, sobretudo, disputar um novo mandato nas eleições presidenciais de 2012. O vice-presidente insistiu em defender a decisão de Chávez de não delegar o poder.
- O presidente da República Bolivariana está no comando do governo da Venezuela, nunca deixou de estar e continuará estando - declarou Jaua.
Segundo Carlos Romero, da Universidade Central da Venezuela (UCV), os 180 dias de ausência são concedidos quando o presidente solicita uma autorização para estar fora do país e afastar-se do cargo, coisa que Chávez nega-se a fazer.
- A situação do presidente é absolutamente irregular: ele está fora, doente e insiste em continuar exercendo o governo - argumentou Romero.
Para ele, "Chávez deveria pedir autorização para ausentar-se do cargo e do país e aí sim teria seis meses de prazo". Até agora, o governo solicitou à Assembleia Nacional apenas uma permissão de ausência presidencial, primeiro por cinco dias (durante a viagem ao Brasil, Equador e Cuba) e depois por tempo indeterminado.
- Vamos continuar pedindo que o governo seja assumido pelo vice, desejamos melhoras a Chávez, mas o presidente não pode continuar à frente do Executivo - declarou o deputado Eduardo Gómez, da bancada dos 67 deputados opositores.
Pouco depois da coletiva convocada por Jaua, o governo divulgou novas imagens do presidente em Havana, desta vez em uma reunião de trabalho com o ministro das Relações Exteriores, Nicolás Maduro. Um pouco mais animado que na gravação de quinta-feira à noite, quando confirmou ter sido operado de câncer (segundo rumores que circularam em Caracas, o tratamento de quimioterapia já teria começado), Chávez agradeceu ao povo pelos gestos de carinho e por terem "assumido uma dificuldade que lamentavelmente tivemos de admitir". O presidente tentou mostrar-se ativo e acabar com as pressões para a entrega do poder ao vice.
Ontem, Chávez apareceu novamente e disse à Telesur que não conseguiu se livrar dos "olhos de águia de Fidel":
- Se não fosse Fidel não sei em que labirinto estaria.
A oposição adotou tom cauteloso de solidariedade ao líder, evitando o combate.
- A oposição continuará insistindo em que Jaua deve assumir o poder, mas será mais cuidadosa - disse Luis León, diretor da Datanálisis.
Dilma deseja pronto restabelecimento
Segundo ele, "a primeira reação deve ser mesmo a solidariedade, porque ninguém quer se arriscar a criticar um presidente doente já que essa atitude poderia ser mal vista pela população". Até mesmo jornalistas vinculados à oposição como Nelson Bocaranda, um dos primeiros a informar sobre o câncer de Chávez, escreveu ontem: "Peço a Deus por sua saúde e por seu retorno para comandar um governo que se sente acéfalo, cheio de contradições, com os demônios em seu interior e com as brigas entre seus seguidores para ver quem ostenta mais méritos para transformar-se em herdeiro da revolução".
Os boatos sobre uma incipiente guerra entre os chavistas pela sucessão são cada vez mais intensos. Na visão de José Vicente Carrasquero, da Universidade Simón Bolívar, a Venezuela tem um regime personalista e não existe plano B. Para ele, o Partido Socialista Unido da Venezuela (PSUV) é como um arquipélago e o único que mantém todas as ilhas unidas é o presidente.
- Neste momento a confusão é grande e ainda desconhecemos quais serão as consequências para o país.
Em nota, a presidente Dilma Rousseff - que já foi vítima de câncer - desejou "pronto restabelecimento" a Chávez. "Em nome do governo brasileiro, quero enviar-lhe votos de um pronto restabelecimento. Nos momentos difíceis pelos quais todos passamos é importante não só os cuidado dos médicos, como nossa coragem pessoal e a solidariedade dos amigos", diz.