Título: Exportadores no fio da navalha
Autor: D'Elia, Mirella; Pereira, Daniel
Fonte: Correio Braziliense, 14/08/2009, Política, p. 7

Governo vence guerra sobre a vigência do crédito-prêmio do IPI e indústrias podem ter que devolver pelo menos R$ 50 bilhões

O ministro Lewandowski relatou a matéria que pode comprometer a saúde financeira de indústrias exportadoras

O governo conquistou uma vitória bilionária no Supremo Tribunal Federal (STF). Por unanimidade, o tribunal decidiu ontem que a vigência do crédito-prêmio do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) deixou de existir em 1990, como defendia o Ministério da Fazenda. Empresas exportadoras queriam que o STF dissesse que o benefício, criado em 1969 para incentivar as vendas para o exterior, não foi extinto ¿ o que, estima a União, poderia gerar um prejuízo aos cofres públicos de até R$ 288 bilhões. O valor corresponde a 45% dos investimentos previstos no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) até 2010.

A decisão era o passo que faltava para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva vetar emenda incluída por parlamentares na Medida Provisória 460, que estendeu, até 2002, a vigência do crédito-prêmio de IPI. A MP foi aprovada na semana passada. Desde então, está à espera da sanção presidencial. ¿A regra fica agora claramente inconstitucional¿, disse o procurador-geral da Fazenda Nacional, Luís Inácio Adams, referindo-se à emenda. Além de arquivar o maior esqueleto tributário do país, o STF garantiu ao governo o direito de tentar recuperar na Justiça os créditos de IPI aproveitados pelos exportadores nos últimos anos. Foram pelo menos R$ 50 bilhões, segundo a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp).

Se o dinheiro tiver que ser devolvido, alega a entidade, ficará ameaçada a saúde financeira de grandes exportadores brasileiros, como Sadia, Perdigão e Hering. Foi em nome dessas empresas que a líder do governo no Congresso, senadora Ideli Salvatti (PT-SC), apresentou a emenda do crédito-prêmio de IPI. Procurada pelo Correio, a Fiesp não quis comentar o caso.

Batalha

O posicionamento do Supremo deu um ponto final a uma longa batalha jurídica (leia para saber mais). No julgamento de ontem, os ministros entenderam que o crédito-prêmio do IPI deixou de vigorar dois anos após a promulgação da Constituição Federal de 1988. Relator da matéria, o ministro Ricardo Lewandowski explicou que o artigo 41 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (o ADCT diz como a nova Constituição deve receber atos fundamentos na Constituição anterior, de 1967) determinou que os incentivos de natureza fiscal que não fossem revalidados por leis aprovadas até 1990 acabariam.

A Corte negou recursos que discutiam a extinção do crédito-prêmio, seguindo entendimento do relator. Em seu voto, ele considerou que, como o incentivo encerrou-se em 1990, o prazo para entrar com ações na Justiça pedindo restituição de créditos decorrentes do incentivo terminaria em 1995. O Supremo confirmou uma decisão tomada anteriormente pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ).

A defesa das empresas envolvidas na discussão alegou que a exportação não poderia ser considerada um incentivo de natureza setorial. Isso faria com que o crédito-prêmio não fosse enquadrado no ADCT. Mas os ministros discordaram. ¿Entendo que o crédito-prêmio não foi extinto em 1983, mas que deveria ter sido confirmado por legislação dois anos após a edição da Constituição, o que não ocorreu. Assim, foi extinto em 5 de outubro de 1990¿, ressaltou Lewandowski.

Entendo que o crédito-prêmio não foi extinto em 1983, mas que deveria ter sido confirmado por legislação dois anos após a edição da Constituição, o que não ocorreu¿

Ricardo Lewandowski, ministro do STF

O número R$ 288 bilhões Estimativa do prejuízo que seria gerado aos cofres públicos caso o STF tivesse decidido pela não extinção do benefício

Para saber mais Briga longa na Justiça

A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) termina com um imbróglio jurídico que se arrastava havia mais de duas décadas. Em 1983, o governo federal declarou extinto o crédito-prêmio de IPI, incentivo criado em 1969 a fim de estimular as exportações. Mas as empresas recorreram da decisão. Durante anos, conseguiram sentenças favoráveis em primeira e segunda instâncias. A queda de braço foi parar no Superior Tribunal de Justiça (STJ). De início, o STJ negou os recursos da Fazenda. Depois, as turmas da Corte se dividiram a respeito do tema. Até que, recentemente, o STJ admitiu a vigência do crédito-prêmio de IPI, só que até 1990. Resultado: a pendenga foi parar no STF. Ontem, a mais alta Corte de Justiça do país manteve o entendimento do STJ. A decisão foi unânime.