Título: Economist: briga no varejo revela regulação frágil
Autor: Berlinck, Deborah
Fonte: O Globo, 08/07/2011, Economia, p. 27

Governo se interessa mais em criar gigantes que respeitar regras, diz revista

A escalada belicosa entre as duas gigantes francesas do setor de varejo, Carrefour e Casino, para abocanhar o Pão de Açúcar, maior cadeia de supermercados do Brasil, revela que o sistema brasileiro de regulação da concorrência é frágil, apontou em sua edição impressa a revista britânica de finanças "The Economist". Segundo a publicação, se o acordo - contestado pelo Casino, atual sócio do grupo de Abilio Diniz - entre Pão de Açúcar e Carrefour for adiante, com aval financeiro do BNDES, o Brasil vai ganhar um gigante, com 27% do setor.

A revista lembra que recentemente o presidente do BNDES, Luciano Coutinho, afirmou que só apoiará a fusão se houver consenso entre as três partes. Porém, dado o tamanho do negócio e a concentração que ele pode gerar, a "Economist" se diz surpresa com o fato de que sua concretização esteja mais nas mãos do banco de fomento do que no próprio Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), o órgão regulador responsável por zelar pelo equilíbrio da concorrência no país.

"O resultado da briga poderá depender de uma série de fatores estratégicos, legais ou políticos", afirma a revista. "O bem-estar do consumidor, no entanto, não será um deles."

Atuação do Cade é limitada pela legislação

As políticas antitruste no Brasil sempre foram frágeis, aponta a "Economist". Ela lembra que, nos anos 90, o país começou a abrir sua economia e a privatizar, com o objetivo de melhorar sua capacidade de concorrência. Porém, a revista cita um estudo de 2007, realizado por Edmund Armann, da Universidade de Manchester, e Werner Baer, da Universidade de Illinois, para dizer que, 15 anos depois da abertura da economia brasileira, a participação de mercado das quatro maiores companhias nos principais setores se tornou ainda maior.

A revista afirma que o Cade é ineficiente, pois a legislação só permite que ele atue depois que os acordos já foram longe demais. A agência pode impor condições e até desfazer fusões, mas normalmente quando toma essa decisão já é tarde demais. A "Economist" lembra alguns casos. Em 2004, o Cade determinou que a Nestlé vendesse a Garoto, empresa que havia comprado anos antes. Até hoje, no entanto, isso não foi feito. A Nestlé está brigando na Justiça contra essa determinação.

Um projeto de lei que exigirá uma aprovação prévia do Cade para fusões consideradas nocivas à concorrência foi apresentado em 2005. Mas sua discussão está sendo bastante lenta, diz a revista. "E mesmo que o ritmo aumente, será muito tarde para o caso do acordo com o Pão de Açúcar."