Título: Marcas da Perdigão devem sair de cena por 5 anos
Autor: Beck, Martha
Fonte: O Globo, 13/07/2011, Economia, p. 25

Fusão com a Sadia vai ser decidida hoje no Cade, que deve determinar também venda de algumas fábricas

BRASÍLIA. A marca Perdigão será tirada de circulação por cinco anos em parte dos 14 mercados considerados de extrema concentração na união com a Sadia, entre eles o de salsicha. O martelo foi batido ontem em reunião dos executivos e advogados da BRF-Brasil Foods - companhia resultante da fusão de Sadia e Perdigão - com representantes do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade). O órgão retoma hoje o julgamento da operação, e o acordo deverá selar sua aprovação.

Na reunião de ontem, faltava decidir quais dos 14 produtos terão que passar a ser vendidos sem a marca premium Perdigão. Além disso, estavam sendo definidas de quais outras marcas secundárias a BRF terá de se desfazer, já que o grupo é dono de vários produtos de apelo regional. Outra providência deve ser a venda de fábricas e centros de distribuição, com o objetivo de estimular maior concorrência.

Sadia será mantida por ter mais apelo no mercado

A suspensão temporária da marca Perdigão foi uma escolha da própria BRF, depois que o Cade deixou claro que não aprovaria a fusão se o grupo se desfizesse apenas de marcas secundárias e regionais, como Batavo, Rezende, Confiança, Wilson e Escolha Saudável. Os conselheiros exigiram que uma das marcas premium, Sadia ou Perdigão, saísse de circulação por um tempo. A BRF entende que a Sadia é o nome de mais apelo, dentro e fora do Brasil.

O julgamento está previsto para esta manhã e volta a ocorrer depois de o relator do processo, Carlos Ragazzo, ter rejeitado o negócio em voto de mais de 500 páginas e cuja leitura levou cerca de cinco horas. O conselheiro Ricardo Ruiz pediu vista logo em seguida e de um mês para cá vem negociando com Sadia e Perdigão um acordo que viabilize a operação.

Ontem, ao ser indagado em audiência pública sobre quais poderiam ser os efeitos de o Cade rejeitar a união entre Sadia e Perdigão, o vice-presidente de Assuntos Corporativos da BRF, Wilson Mello, demonstrou confiança.

- Como pessoa otimista, eu nem considero a possibilidade de reprovação dessa operação - afirmou.

Em audiência ontem, marcada para discutir os impactos da operação sobre os consumidores, a empresa ganhou o apoio da bancada ruralista na Câmara. Deputados de Santa Catarina, Paraná e Rio Grande do Sul defenderam a união, afirmando que ela é benéfica para a economia e que sua rejeição pode quebrar produtores que dependem dela nesses estados.

Mello aproveitou o apoio e assegurou que a operação não resultará na demissão de funcionários nem na elevação de preços.

- Vamos gerar cada vez mais empregos no Brasil. Temos 62 fábricas, sendo que 60 estão localizadas no Brasil. A fusão não traz essa preocupação - garantiu.

O deputado Valdir Colatto (PMDB-SC), por exemplo, disse que não tem simpatia pela fusão, mas defendeu que sua rejeição seria ainda mais danosa para o país:

- Não tenho simpatia pela fusão de empresas. Mas quando você tem a possibilidade de perder essas empresas no mercado, eu acho que o problema é grave. Haveria milhares de desempregados. Pior do que fusão seria não ter Sadia e Perdigão. Santa Catarina iria quebrar - disse.

A defesa das empresas levou o deputado Ivan Valente (PSOL-SP), autor do requerimento para a realização da audiência pública, a reagir:

- Essa audiência era para tratar dos interesses dos consumidores, mas eles não foram o foco principal.

Mello argumentou que no mercado de massas e congelados, por exemplo, existem produtos nos quais a participação da BRF varia de 12% a 15%. Nesses casos, afirmou, a empresa não tem margem de manobra para elevar preços, pois, além de terem participação pequena, esses produtos são de conveniência, ou seja, não são essenciais na mesa da população:

- Um mercado de conveniência e baixa penetração não me permite fazer o que eu quiser com preços.

Marfrig e Tyson podem ganhar espaço

Ao ouvir as preocupações de parlamentares de que pode não haver um concorrente com condições de fazer frente ao poder de mercado da BRF, Mello citou exemplos. Segundo ele, a Marfrig e a Tyson Foods têm condições de crescer no mercado doméstico.

- No mercado de massas, a BRF vai dominar 88%. No caso de carnes congeladas, a concentração vai ser de 70%. Não me parece que há argumento que mostre que a união de duas companhias fortes como essas possa beneficiar o consumidor - disse o deputado Reguffe (PDT-DF), que também foi autor do requerimento para a audiência pública.

Já Ivan Valente lembrou que, além de representar prejuízos potenciais ao consumidor, a fusão também pode acabar afetando os pequenos produtores, que ficariam nas mãos da BRF na hora de negociar preços:

- Os dados da monopolização são extensivos. Tem produtores estrangulados, dada a concentração brutal que existe em torno desse negócio.