Título: Diniz sem saída
Autor: Justus, Paulo; Batista, Henrique Gomes
Fonte: O Globo, 13/07/2011, Economia, p. 21

Empresário desiste de fusão com Carrefour, após rejeição de Casino e recuo de BNDES e BTG

Paulo Justus, Henrique Gomes Batista, Deborah Berlinck* e André de Souza

O empresário Abilio Diniz, do Grupo Pão de Açúcar, recuou da proposta de fusão com o Carrefour no Brasil. Ontem pela manhã, Diniz ainda demonstrava alguma esperança de levar o negócio adiante, mesmo depois de ouvir, em Paris, um "não" do Conselho de Administração do sócio francês Casino. No início da noite, porém, logo após o BNDES e o BTG Pactual comunicarem oficialmente a desistência de apoiar a empreitada, a família Diniz, representada pela holding Península, capitulou e admitiu a impossibilidade de prosseguir com o projeto atual de fusão.

"A Península reitera seu apoio à associação proposta entre o Pão de Açúcar e o Carrefour. Todavia, tendo em vista a decisão tomada nesta data (12/07) pelo Conselho de Administração do Casino, no sentido de rejeitar a proposta feita pela Gama 2 SPE Empreendimentos e Participações S.A., em 28 de junho de 2011, a Península reconhece que, nas presentes condições, não é factível prosseguir com essa proposta", afirma o grupo no comunicado em que também lamenta a decisão do Casino.

O BNDES, que entraria com até 2 bilhões (cerca de R$4 bilhões), já havia informado que só participaria do negócio se houvesse consenso entre as partes envolvidas. Ontem, após a rejeição pelo Casino, oficializou a decisão:

"Frente ao comunicado do Conselho de Administração do Grupo Casino, rejeitando a proposta de associação entre o Grupo Pão de Açúcar e o Carrefour, a Diretoria da BNDESPar vem a público informar que cancelou o enquadramento da operação solicitada pela Gama 2 SPE Empreendimentos e Participações S/A, em função do não atendimento às condições estabelecidas. Como reiterado em diversas oportunidades, o pressuposto da eventual participação da BNDESPar nesta operação era o entendimento entre todas as partes envolvidas", diz a nota, divulgada no mesmo dia em que a Comissão de Assuntos Econômicos do Senado (CAE) aprovara convite ao presidente do BNDES, Luciano Coutinho, para falar sobre a participação do banco no processo de fusão.

Veto à fusão foi unânime

Já o BTG Pactual afirmou, em nota que desistiu, ainda que "temporariamente", da proposta apresentada para a compra dos ativos do Carrefour no Brasil. O banco, que junto com a Estáter - butique financeira contratada por Diniz -, elaborou a estrutura financeira que previa a entrada do próprio banco e do BNDES como sócios do empresário no Carrefour, também usou como argumento a derrota do projeto no Conselho de Administração do Casino.

"A manifestação (...) nos leva a suspender temporariamente a proposta, com o firme propósito de manter um diálogo aberto", diz o texto. "Acreditamos que a associação entre Pão de Açúcar e Carrefour é excepcional para todos os públicos envolvidos e poderá ser reavaliada no futuro."

Em Paris, pela manhã, não houve chance de acordo entre Diniz e Jean-Charles Naouri, dono do Casino. Após duas horas e meia de reunião do Conselho de Administração, Diniz saiu isolado. Quinze dos 18 membros do conselho estavam presentes: 14 votaram contra a fusão enquanto Diniz se absteve. A conclusão foi de que a proposta é "hostil e ilegal".

Em comunicado, divulgado assim que Diniz deixou a empresa em Paris, o Casino reafirmou sua decisão estratégica de permanecer no Brasil: "O Conselho de Administração constatou unanimemente, à exceção do senhor Abilio Diniz, que o projeto (de fusão) é contrário aos interesses do GPA (Grupo Pão de Açúcar), de todos os acionistas e do Casino."

Encerrada a reunião, Diniz se encontrou a sós com Naouri, o que não acontecia desde o início do ano. No encontro de 40 minutos, o francês deu outro não a Diniz. Ele teria dito que sua posição já havia sido dada pelo conselho, que refutou o negócio. Mesmo assim, Diniz saiu sorridente, dizendo que foi "muito bem recebido" por Naouri. O empresário não perdeu o humor ao encontrar os repórteres e ser perguntado se agora só restaria "sentar e chorar na calçada", como afirmou em entrevista recente ao GLOBO:

- Não, não estou chorando na calçada. Fizemos uma reunião do conselho e vamos ver o que vai acontecer - disse, acrescentando, ao ser perguntado se haveria alguma brecha: - É o que espero: um acordo amigável. Mas, olha, às vezes a gente não vê (a brecha), mas continua tentando.

Mas na sede do Casino - que apostou no Brasil como um dos polos para sua expansão mundial e trava uma guerra por mercado com o arquirrival francês Carrefour - não havia motivo para bom humor:

- Como se pode imaginar que a empresa que controla 43% (do Pão de Açúcar) pode ser expropriada? Este homem (Diniz) provou sua desonestidade. Ele acha que está no Brasil do passado, quando os negócios eram feitos politicamente e Estado de direito não contava tanto. Mas este Brasil do passado terminou, o Brasil de Lula e da presidente (Dilma Rousseff) é um Estado de direito e seria grave em termos de imagem se esta história acabar de outra forma (com a fusão) - disse uma pessoa próxima do Casino.

Na reunião, o Casino destruiu o projeto de fusão, citando estudos que encomendou a vários bancos e consultorias. Segundo o grupo, o projeto de fusão se baseia em uma "visão errada de estratégia", com "riscos de execução significativos" e perdas para os acionistas. Em nota divulgada no início da tarde, em que minimizou a decisão do conselho do Casino, Diniz afirmou que os estudos apresentados foram "pouco consistentes e não retratam a realidade do setor de varejo brasileiro e mundial". Ele ressaltou que o foro para avaliar "os méritos da proposta" é a Wilkes - holding que reúne sua participação e a do Casino no Pão de Açúcar. Antes do anúncio da desistência de Diniz, executivos ligados ao empresário afirmaram que ele pretendia levar a discussão para a Câmara de Comércio Internacional.

Duas semanas após registrar uma alta de 12% na Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa), em meio ao anúncio da intenção de unir as operação da empresa com o Carrefour no Brasil, as ações preferenciais (PN, sem voto) do Pão de Açúcar recuaram ontem pelo sétimo pregão seguido e fecharam a R$65, baixa de 1,96%. Na Bolsa de Paris, as ações do Carrefour recuaram 2,68%, para 21,99. Os papéis do Casino avançaram 0,14%, para 63,49.