Título: Todos os políticos brasileiros faziam
Autor: Amorim, Silvia; Jungblut, Cristiane
Fonte: O Globo, 09/07/2011, O País, p. 10

A uma rádio de SP, Valdemar Costa Neto fala de mensalão e barganha por cargos

SÃO PAULO. Desde 2005, o deputado federal Valdemar Costa Neto, secretário-geral do PR e quem manda de fato no partido, não fala com o que chama de imprensa nacional, escaldado com as denúncias de formação de quadrilha, corrupção passiva e lavagem de dinheiro que resultaram de seu envolvimento no mensalão. Mas, quando conversa com a imprensa de sua base eleitoral, Mogi das Cruzes, Região Metropolitana de São Paulo, descobre-se que "Boy", como é conhecido na região do Alto Tietê, não pretende renunciar ao cargo, pois acha que a principal acusação que recai sobre ele - a movimentação de recursos de campanha sem o devido registro, ou caixa dois - caracteriza um crime eleitoral que já prescreveu.

Na última sexta-feira, um dia antes de a revista "Veja" denunciar um suposto esquema de superfaturamento no Ministério dos Transportes em grandes obras, orquestrado por Valdemar e pessoas-chave do ministério, todas do PR, o deputado deu uma entrevista de quase duas horas à jornalista Marilei Schiavi, da Rádio Metropolitana de Mogi das Cruzes, à qual O GLOBO teve acesso. Ali, ele fala do mensalão, diz que todos os políticos trabalhavam com caixa dois na época do mensalão e, às vésperas do escândalo que derrubaria o próprio ministro dos Transportes, Alfredo Nascimento, admite que barganha cargos no governo em troca de apoio político.

"O que eu cometi foi um crime eleitoral por quê? Porque movimentei recursos sem contabilizar. Vamos falar claro: movimentei o caixa dois da campanha. Isso, todos os políticos brasileiros faziam. Todos. Se um camarada falar que não fazia isso antes, é um covarde, porque todos os políticos faziam isso. Depois disso, passaram a prestar contas direitinho. Então, este crime já está prescrito. O que é isso? Ele tem prazo de validade de cinco anos. Se você não for condenado em cinco anos, você não pode ser condenado. Só que, como a opinião pública estava toda contra a gente, o que aconteceu? Eles enquadraram a gente em outros crimes, que não têm provas contra nós, contra mim pelo menos. E eu devo ser absolvido", disse Valdemar.

Na conversa, o deputado diz que a renúncia lhe trouxe muita vergonha e que, desta vez, não pretende renunciar, já que percebe não haver provas nas acusações que faz a Procuradoria Geral. O deputado afirma que o processo do mensalão deverá demorar um ano em tramitação no STF e que só no início de 2013 começariam a ser proferidas as primeiras sentenças.

Ainda sem ter a noção do turbilhão político que o engolfaria nos dias seguintes à entrevista e acusado de supostamente usar o ministério para beneficiar financeiramente políticos e partidos, Valdemar Costa Neto explica que acertou com o então chefe da Casa Civil, Antonio Palocci, a formação do bloco de apoio que reúne 64 deputados de oito partidos (PR, PRB, PTdoB, PRTB, PRP, PHS, PTC, PSL), mas que a moeda de troca seriam cargos na administração pública que facilitassem o financiamento de projetos desses deputados.

"O nosso ministro (Alfredo Nascimento) chegou na Dilma (Rousseff) outro dia e falou: olha, o Valdemar está com um problema com o bloco, porque ele fez o bloco e acertou com o Palocci para aumentar o espaço do partido no governo. Nós já temos muito espaço, mas nós precisávamos aumentar o espaço do bloco, que tem 24 deputados a mais. E o que é que eu quero? Eu quero uma diretoria na Caixa Econômica Federal, no Banco do Brasil. Para quando precisar de alguma coisa, por exemplo, eu consigo um empréstimo para (a cidade de) Santa Isabel, de R$2 milhões, que o Helio Buscarioli (prefeito da cidade, do PSDB) está precisando como ele precisa do ar para respirar. Porque ele está trabalhando bem, mas ele precisa pavimentar a cidade, que tá um caos. O dinheiro não sai na Caixa. Eles não assinam coisa na Caixa. Eu tendo um diretor, sai na hora. Quer dizer, eu cuido do camarada", diz o deputado.

Na rádio local, Valdemar garante que os projetos de interesse da cidade estão garantidos, por conta do seu poder de influência no governo federal. Influência que ele diz ter a qualquer custo.