Título: Dilma não pode se curvar ao fisiologismo
Autor:
Fonte: O Globo, 09/07/2011, Opinião, p. 6

A resposta negativa do senador Blairo Maggi (PR-MT) ao convite da presidente Dilma para assumir o Ministério dos Transportes pode ter várias explicações não excludentes. Uma delas, que Maggi, um dos maiores produtores de soja do mundo, alvo preferencial de ambientalistas, não está disposto a colocar seu telhado de vidro vulnerável às pedras que zunem pelos ares de Brasília.

Sem apego a legendas - já foi do PPS, de oposição, e cultivou amizades no governo Lula -, Blairo, ao ser convidado, pediu tempo. De aliados recebeu o conselho de responder negativamente, para evitar ser a "bola da vez", devido a suas ligações com Luiz Pagot, o afastado diretor-geral do Dnit, o principal vagão do trem pagador de obras superfaturadas em que foi convertido o ministério. O próprio convite a Blairo causou ruídos no entendimento de que a presidente resolvera resgatar para valer o ministério do esquema de cobrança de pedágio a empreiteiros para abastecer, pelo menos, o caixa dois do PR. Assim como acabar com a liberação de emendas parlamentares em troca da adesão ao partido do beneficiário dos recursos.

Pagot foi secretário do governo de Blairo Maggi, responsável por Lula tê-lo colocado no Dnit ainda em 2007. O convite ao senador chegou a ser entendido como forma de atenuar a irritação dele com o afastamento do apadrinhado. Pode ser, também, que Blairo não tenha aceitado as supostas novas condições de operação do ministério, colocado sob supervisão direta do Palácio. Medida sensata da presidente, se não conseguir emplacar o nome preferido, Paulo Sérgio Passos, secretário-geral da Pasta, filiado ao PR, mas sem a confiança dos caciques do partido. (Há de ser por algum motivo favorável à biografia de Paulo Sérgio).

O jogo para o preenchimento da vaga, uma das mais bem localizadas nas proximidades do Tesouro, está pesado. Pagot, por exemplo, faz ameaças em tom de chantagem: diz que cumpriu ordens de petistas na execução de malfeitorias. É provável. O governo não pode imaginar a execução de algum movimento pela moralização da administração pública sem encontrar pela frente companheiros na farra do desvio de dinheiro do contribuinte.

Dilma, na verdade, se choca com o modelo lulopetista fisiológico de montagem de governo e manutenção do poder. Não é por acaso que, nos primórdios do mensalão, ainda na campanha de 2002, já esteja presente nos subterrâneos da baixa política Valdemar Costa Neto, hoje deputado pelo PR, naquela época PL, sigla modificada na fusão da legenda com o Prona. É parte da crônica daquele tempo a negociação de Costa Neto com José Dirceu para irrigar o caixa dois do PL com dinheiro sujo do PT, em troca de apoio à candidatura Lula. No primeiro governo petista, Lula não seguiu o conselho de Dirceu, manteve o PMDB ao longe e acercou-se de legendas menores. No final, explodiu o escândalo do mensalão. No segundo mandato, acrescentou o PMDB ao arco de alianças e sedimentou de vez a prática do toma lá da cá fisiológico.

É este o modelo herdado por Dilma. Ela chegou a indicar desejar implodi-lo. Não se sabe se conseguirá. Pode preferir manter as fundações do edifício, apenas cuidando para que não haja exageros como os do PR nos Transportes. Para manter a festa, os convidados precisam ter cuidado de não atear fogo no salão. Não é a melhor escolha.