Título: O vírus da inflação
Autor: Moraes, Diego
Fonte: Correio Braziliense, 19/08/2009, Brasil, p. 10

Variação no preço de produtos que ajudam a prevenir a transmissão da influenza A (H1N1) chega a 3.025% em farmácias do Distrito Federal

O empresário Jurandir Alves comprou duas caixas de máscaras para os 11 funcionários de sua prestadora de serviços

Em tempos de influenza A (H1N1), conhecida como gripe suína, virou cena comum ver pessoas mascaradas ou com frascos de álcool em gel em qualquer lugar. De acordo com os donos de farmácias, as vendas desses tipos de produtos aumentaram cerca de 30% desde o início da pandemia. E os preços também parecem estar mais salgados. A mesma máscara que numa drogaria custa R$ 0,16, é vendida por R$ 5 na concorrente: uma diferença de 3.025% (veja quadro), segundo levantamento divulgado ontem pelo Instituto de Defesa do Consumidor do Distrito Federal (Procon-DF).

Os fiscais do órgão percorreram farmácias no Plano Piloto, Guará, Cruzeiro, Candangolândia, Sobradinho, Taguatinga, Ceilândia, Gama e Recanto das Emas entre sexta-feira e ontem. ¿O consumidor deve ficar atento para não pagar mais caro¿, orienta o presidente do Procon, Ricardo Pires. Segundo ele, uma pesquisa de preços pode levar a uma economia considerável.

O frasco de 50g do álcool em gel, por exemplo, foi encontrado por R$ 1,80 em algumas farmácias, enquanto em outras o preço chegava a R$ 6,99, de acordo com a pesquisa do Procon. As caixas de máscaras com 100 unidades podem custar de R$ 22 a R$ 50, dependendo da drogaria onde forem compradas. ¿Antes, tínhamos menos fornecedores do que agora. Mesmo assim, a demanda não está sendo atendida¿, afirma o vice-presidente do Sindicato do Comércio Varejista de Produtos Farmacêuticos do Distrito Federal (Sincofarma), Álvaro Júnior. Ele diz que os estoques não foram suficientes para a demanda, o que contribuiu para elevar os preços.

Representantes do Ministério Público do Distrito Federal (MPDF), de donos de farmácia, da Secretaria de Saúde e do Procon se reuniram ontem, no fim da tarde, para discutir formas de evitar o desabastecimento nas drogarias e também a prática de preços aparentemente abusivos. Todos concluíram que, por enquanto, não é preciso restringir a venda de produtos usados como prevenção à nova gripe. Mas concordaram que é necessário informar melhor os consumidores.

¿A pessoa não precisa sair desesperada para comprar álcool em gel e a máscara só deve ser usada sob orientação médica. O problema é que as pessoas estão sem saber o que fazer e correm para as drogarias para estocar esses produtos, o que não adianta nada¿, afirma o promotor Paulo Binicheski, da Promotoria de Defesa do Consumidor do Ministério Público.

A dona de casa Cristina Medeiros, 57 anos, foi ontem à farmácia e comprou os três últimos frascos de álcool em gel da loja. Pagou R$ 20 por tudo. ¿Achei caro. Mas todo mundo diz que tem que usar, não é?¿, justifica. O empresário Jurandir Alves, 58 anos, também buscou uma prevenção por conta própria e comprou duas caixas de máscaras para os 11 funcionários de sua prestadora de serviços. Também reclamou do preço: R$ 34. ¿Acho que há muito alarde por causa desta doença. Mas é bom evitar correr riscos.¿

Especialistas explicam que a máscara só deve ser usada por quem está com sintomas de gripe, já que ela impede que o paciente espalhe secreções. Em quem não está doente, a eficácia é praticamente nula. E o álcool em gel pode ser substituído por água e sabão líquido. ¿O melhor mesmo é uma boa lavada nas mãos com água corrente e sabão líquido. O sabonete em barra não é tão bom porque acumula sujeira e bactérias. O álcool é indicado para limpar a mão quando não há água e sabão por perto¿, explica o infectologista Esper Kallas, da Universidade de São Paulo (USP).

Mortes A Secretaria de Saúde do Mato Grosso do Sul confirmou ontem a primeira morte por gripe suína no estado ¿ uma mulher de 24 anos que morava em Três Lagoas. Ela morreu em 3 de agosto, mas o órgão aguardava o resultado do exame laboratorial, feito pelo Instituto Adolfo Lutz, em São Paulo. O governo do Rio de Janeiro também confirmou ontem mais quatro mortes pela doença. No Rio Grande do Sul, houve mais oito vítimas, enquanto o Paraná divulgou novas 28 fatalidades.

O último boletim do Ministério da Saúde, divulgado na terça-feira, informa 368 óbitos no país, com base em dados repassados pelos órgãos estaduais até 15 de agosto. Desse total, 46 eram gestantes e 50,3% eram pessoas com fatores de risco. A maior proporção de casos graves para a nova gripe foi observada em pessoas com idade entre 15 e 49 anos, enquanto na gripe comum ocorre entre 30 e 49 anos.

No entanto, as secretarias de Saúde contabilizavam, ontem, até o fechamento desta edição, 384 mortos. O estado com mais mortes é São Paulo (134), seguido pelo Paraná (107), e pelo Rio Grande do Sul (78). O Ministério da Saúde informou que os dados serão incluídos no próximo boletim.

ANVISA ENQUADRA DROGARIAS As farmácias de todo o país não poderão mais deixar medicamentos ao alcance dos clientes ¿ nem mesmo os que não precisam de prescrição médica. Os remédios agora terão que ficar atrás do balcão, acessíveis só para os funcionários da drogaria. Apenas remédios fitoterápicos, pomadas ou sujeitos a notificação simplificada, como água oxigenada, poderão ficar ao alcance dos clientes. Os estabelecimentos terão seis meses para cumprir a resolução, publicada ontem no Diário Oficial da União. A nova regra estabelece, ainda, que somente farmácias poderão fazer vendas de remédios por telefone e pela internet, além de oferecer serviços como aferição de pressão arterial e aplicação de medicamentos por injeção. Por outro lado, esses estabelecimentos ficam proibidos de vender produtos como sorvete e carne, por exemplo.

Reforço no atendimento

Após uma reunião no Ministério Público, ontem, diretores das quatro faculdades de medicina do Distrito Federal concordaram em iniciar, esta semana, a qualificação dos alunos internos para que eles possam reforçar o quadro de profissionais no atendimento a casos de gripe suína na rede pública. Eles farão nova reunião hoje à tarde para decidir de que forma será feito o recrutamento desses estudantes.

¿A ideia é, na medida em que houver necessidade, recrutar esses alunos para ajudar na atenção primária, na triagem e na emergência, principalmente dos postos de saúde¿, afirma o promotor Diaulas Ribeiro, da Promotoria de Defesa dos Usuários de Serviços de Saúde (Pró-vida). Os internos são estudantes de medicina que, embora ainda não tenham concluído o curso, fazem estágio supervisionado em hospitais.

Pelas contas das faculdades e do Ministério Público, a medida pode representar o reforço de cerca de 750 pessoas na rede pública. ¿A Secretaria de Saúde está disposta a usar esse efetivo neste momento¿, reforçou Ribeiro. Ele afirmou, ainda, que a ideia é incluir os internos que trabalham em hospitais na primeira leva de vacinados contra a nova gripe no ano que vem, com os profissionais de saúde.

Funcionários dos hospitais públicos também sinalizam estar dispostos a usar as horas de folga para ajudar no atendimento e desafogar parte da demanda. A Associação dos Profissionais de Saúde Pública do Distrito Federal sugeriu colocar os filiados na emergência dos centros de saúde para orientar pessoas que chegam com sintomas de gripe.

¿É um trabalho voluntário. Temos mais de 300 pessoas e poderíamos montar equipes de cinco a 10 integrantes, com efermeiros, psicólogos e médicos. A meta é montar tendas em frente aos hospitais e poderíamos começar já nesta semana¿, afirma o presidente da associação, Helvécio Ferreira.

A subsecretária de Vigilância à Saúde, Disney Antezana, afirma que se reuniu com representantes da entidade na semana passada para discutir o assunto. Ela diz que a proposta é bem-vinda, desde que o grupo aguarde a devida orientação da Secretaria de Saúde para iniciar o trabalho. ¿A colaboração deve ser organizada e ainda não houve uma definição. Essas pessoas precisam ser capacitadas antes de mais nada.¿ (DM)