Título: Urbanização muda perfil da migração no país
Autor: Rodrigues, Karine
Fonte: O Globo, 16/07/2011, O País, p. 10

Brasileiro percorre distâncias mais curtas em busca de oportunidades; Sudeste já não é o único polo de atração

APÓS 20 ANOS no Rio, o porteiro Antônio vai retornar para Croatá, no Ceará: "lá agora está muito melhor"

As transformações causadas pelo desenvolvimento econômico e a modernização nos últimos 15 anos está mudando a dinâmica migratória no país. As levas de pessoas que tentavam a sorte em regiões distantes estão mais reduzidas, principalmente quando o destino é Rio ou São Paulo, onde a queda chegou a pouco mais de 50%. O brasileiro agora percorre trajetos mais curtos, dentro da mesma região, ou retorna ao lugar de origem, pois percebeu que a interiorização da urbanização expandiu as oportunidades para além das metrópoles, principalmente nas cidades com até 500 mil habitantes, onde surgiram novos polos de desenvolvimento.

As novas configurações no movimento migratório no país estão na publicação "Reflexões sobre os Deslocamentos Populacionais no Brasil", uma análise de dados do Censo 2010 e da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios de 2004 e 2009), divulgada ontem pelo IBGE.

Segundo o pesquisador Antônio Tadeu, um dos organizadores da coletânea, como o componente econômico é o que mais costuma pesar na decisão de migrar, as mudanças no mundo do trabalho e na infraestrutura das regiões estão provocando uma retenção da população em suas regiões de origem.

- As pessoas mudam em busca de melhoria de vida. E como houve um espraiamento das oportunidades para as cidades de médio porte, elas deixam de migrar ou vão para lugares mais próximos, que agora já oferecem melhores condições de vida - observa Tadeu.

Pesquisadora do Núcleo de Estudos de População da Unicamp, Rosana Baeninger explica que, até os anos 80, a migração se dava da área rural para a urbana. Mas hoje, com a interiorização da urbanização, houve uma mudança:

- O migrante não está mais saindo de uma área rural, precária, para uma área urbana. Ele se desloca de ambientes que já são urbanos. É um novo brasil urbano. Os destinos não são mais direcionados apenas pela industrialização, há também os setores de serviço e comércio.

As novas oportunidades estão atraindo muita gente para suas cidades de origem. Do total de 5 milhões de pessoas que trocaram de estado no período 1995-2000, pouco mais de 1 milhão fez o caminho de volta para casa. Na década seguinte, esse movimento permaneceu intenso, especialmente em estados do Sul e Sudeste - onde mais de 20% do total de imigrantes eram de retorno.

Antônio Bezerra da Costa, de 43 anos, saiu de Croatá, no interior do Ceará, em 1987. Conseguiu emprego três dias depois de chegar ao Rio. De lá para cá, nunca ficou desempregado, amealhou recursos e comprou dois terrenos na cidade em que nasceu. Em um deles, construiu uma casa de dez cômodos; no outro, pretende abrir um aviário. Até o fim do ano, retorna de vez para o Ceará.

- Antes não tinha quase nada por lá, nem hospital, nem banco, nem escola. E agora tem - contou ele, que vai refazer o trajeto semelhante ao de seus cinco irmãos.

O IBGE mostra ainda que, após décadas de deslocamentos intensos do campo para as cidades, com lugares de forte evasão ou atração populacional, o país hoje é caracterizado por áreas de rotatividade migratória, ou seja, há um equilíbrio no fluxo de entrada e saída de migrantes em metade dos estados.

O Brasil que mais cresce em população está em apenas 8% dos municípios, todos com menos de 500 mil habitantes. São lugares onde há associação de atividades agrícolas e industriais, além de forte setor de serviços e comércio.

- As cidades médias não crescem isoladamente. Criam uma dinâmica com as outras cidades do entorno - explica Rosana.

Um dos polos de crescimento do país está no Paraná, que já foi uma área de acentuada evasão.

- É compreensível que aqui agora haja tanta migração de retorno -- observa Ricardo Rippel, da Universidade Estadual do Oeste do Paraná.