Título: Em Minas, uma estrada que só existiu nas promessas de Lula e Dilma no palanque
Autor: Ribeiro, Marcelle
Fonte: O Globo, 17/07/2011, O País, p. 3
No lugar da BR-367, na região mais pobre do estado, chão de terra e pontes de madeira
BELO HORIZONTE. Quando subiu ao palco armado em Jenipapo de Minas para celebrar a inauguração de uma hidrelétrica, no Vale do Jequitinhonha, em janeiro do ano passado, o então presidente Lula se segurou e guardou a melhor parte do discurso. Não era dele que deveria sair a melhor notícia do dia, e sim da candidata dele à sua sucessão, Dilma Rousseff.
- Eu queria aproveitar e dar uma notícia para vocês. Nós ligamos para o Dnit e o presidente decidiu que vamos agora prometer mais uma obra. Que iremos cumprir o asfaltamento dos dois trechos da BR-367. Será novamente uma obra do PAC. O PAC é isso. Nós cumprimos o que prometemos - disse Dilma, na época chefe da Casa Civil.
Com o público em delírio, Lula coroou o discurso em seguida:
- A companheira Dilma assumiu o compromisso aqui da 367. Nós vamos chegar a Brasília e ver como essas coisas estão, porque dinheiro, nós temos, e, se a obra tem necessidade, o que nós temos é que fazer essa obra.
Daí em diante, a obra, fundamental para o desenvolvimento de uma das regiões mais pobres de Minas, caiu no esquecimento. Ninguém do Dnit apareceu, tampouco foi feito o projeto executivo de pavimentação de cerca de 120 quilômetros de dois trechos da BR-367, que liga Belo Horizonte ao sul da Bahia. A estrada transformou-se em mais um retrato do descaso e da má gestão de recursos pelo Ministério dos Transportes.
Promessa era feita há mais tempo
A promessa de Lula e Dilma não era a primeira: em 2002, o Dnit chegou a assinar um convênio com o Departamento de Estradas de Rodagem de Minas Gerais (DER-MG), cujo objeto era justamente os trechos de terra entre Minas Novas e Virgem da Lapa, e Almenara e Salto da Divisa, no Vale do Jequitinhonha, que somavam 157 quilômetros. O Portal da Transparência do Dnit mostra que a União liberou R$59,5 milhões para a obra, com uma contrapartida prevista do governo Aécio Neves de R$6,6 milhões.
Mas apenas 37 quilômetros foram executados de fato. Uma ponte de R$4 milhões foi levantada perto de Minas Novas, onde, há mais de sete anos paira imponente no ar, simplesmente porque ninguém fez as cabeceiras e o restante da rodovia.
Quando voltaram à região, em janeiro de 2010, ano eleitoral, Lula e Dilma prometeram que a obra seria tocada novamente. Mas, passados 19 meses, o que resta são pontes de madeira caindo aos pedaços, buracos por todos os lados e uma estrada de terra que ainda deixa cidades mineiras isoladas do desenvolvimento.
Para o engenheiro civil da prefeitura de Minas Novas Guilherme Leão, tudo seria muito mais fácil para motoristas e caminhoneiros se funcionasse a ponte de concreto construída para tirar o trânsito de dentro da cidade e melhorar o traçado da BR-367.
- O pessoal que traz carga já sabe que tipo de caminhão entra na cidade. Mas tem uns que vêm despreparados. Carreta pesada não consegue passar pela cidade - diz.
O supervisor do Dnit em Teófilo Otoni, José Carlos Maia Ribeiro, atribuiu os problemas na execução do convênio com o DER-MG à demora do repasse de recursos por parte de Brasília e a supostas dificuldades financeiras vividas pela empreiteira contratada à época para realizar a obra.
Por meio da assessoria de imprensa, o DER-MG questionou os dados apresentados pelo Dnit, informando que apenas R$12,4 milhões dos R$59,5 milhões do convênio teriam sido liberados. Diz que o estado investiu R$1,4 milhão no projeto e culpa a inoperância do órgão federal pela falta de um novo acordo para realizar, de fato, a obra.