Título: O terceiro nome
Autor: Coimbra, Marcos
Fonte: Correio Braziliense, 23/08/2009, Política, p. 8

Sociólogo e Presidente do Instituto Vox Populi

Ao que parece, foi para o espaço o plano que estava em curso e quem o detonou foi Marina. Não teremos um plebiscito em 2010, ou, pelo menos, não será essa a eleição para muita gente. Voltamos a um formato mais ortodoxo: vários candidatos disputando o voto, cada um expondo suas propostas e suas biografias

Na semana que passou, aconteceu um fato significativo para a eleição presidencial de 2010. Com sua desfiliação do PT, Marina Silva deu o primeiro passo de um processo longo, que pode levá-la à candidatura a Presidência da República e, quem sabe, ao posto que Lula ocupa.

Ser candidata só depende dela e de seus prováveis futuros correligionários do Partido Verde. Mas não há muita dúvida a esse respeito. Ela certamente não sairia do partido onde militou a vida inteira por outra razão.

Já a vitória em outubro do ano que vem são outros quinhentos. Tudo dependerá de como os eleitores vão perceber sua candidatura e como vão compará-la às outras. Para poder começar a sonhar com a hipótese, ela terá que ter o apoio de muitos milhões de pessoas.

O certo é que existe agora, quase oficialmente, uma terceira candidatura. No mínimo, uma pré-candidatura, que se confirmará ou não em função de fatores que hoje não se podem antecipar.

É pouco? É muito. É o primeiro sinal concreto de que o processo político brasileiro dificilmente seguirá, nos próximos meses, o rígido script que Lula e seus estrategistas traçaram. Quais as consequências disso é que teremos que avaliar.

No mundo perfeito imaginado por eles, não teríamos uma eleição de verdade em 2010. Não discutiríamos candidatos e propostas para governar o Brasil. Participaríamos de um plebiscito sobre o governo Lula, comparando-o ao de Fernando Henrique. Os nomes na urna seriam de importância secundária: quem gostasse mais de Lula, quem achasse que o país está melhor com ele, votaria em fulana; quem optasse por FHC e como era o Brasil, em beltrano.

Nesse mundo, só existiria lugar para Dilma (ou quem fosse identificado como representante de Lula) e um candidato tucano, Serra ou Aécio, de preferência o mais associado a Fernando Henrique (Serra, provavelmente). Já no primeiro turno.

Para que essa polarização funcionasse sem sobressaltos, ela teria que ser buscada desde o início. Em um primeiro turno com diversos candidatos, seria mais difícil (senão impossível) levar a eleição para o formato plebiscitário. Dilma, confrontada com três ou quatro candidatos, teria muitos problemas para centrar seu discurso na comparação Lula vs. Fernando Henrique. Como faria? Fingiria que só tem um adversário, ignorando os outros?

Se, além de quem estiver escalado para representar Fernando Henrique, houver outras opções, como fazer um plebiscito? Ou seria possível dizer que ¿todo mundo¿, fora Dilma, é ¿o passado¿? Como pintá-los como símbolos da ¿herança maldita¿ (¿privatizações¿, ¿desemprego¿, ¿indiferença social¿, etc.)? Alguém acreditaria nisso, se Marina Silva, Ciro Gomes e Heloísa Helena forem candidatos? Se os três são antigos aliados, quando não colaboradores e correligionários de Lula?

Para evitar o problema e viabilizar seu plebiscito, Lula fez (e continua a fazer) tudo o que está a seu alcance. De todas as tentativas, a mais vistosa e esdrúxula foi procurar retirar Ciro Gomes da disputa presidencial, lançando-o candidato a governador de São Paulo. Como se fizesse sentido uma candidatura que todos veriam como paraquedista.

O gesto de Marina Silva é, por enquanto, apenas o primeiro a romper o roteiro escrito para a eleição de 2010. Mas já teve efeitos, provocando reações em Ciro e seu partido, que deram sinais de rebeldia ante ao papel que lhes estava reservado. Agora, ele volta a se mostrar propenso a encarar a candidatura presidencial.

E Heloísa Helena? Se ficassem apenas Dilma e o candidato do PSDB, talvez fosse fácil convencê-la a disputar o Senado por Alagoas, quem sabe até lhe dando uma ajudinha discreta para que se elegesse. Se, no entanto, o quadro não for esse, também ela pode mudar de ideia.

Ou seja: ao que parece, foi para o espaço o plano que estava em curso e quem o detonou foi Marina. Não teremos um plebiscito em 2010, ou, pelo menos, não será essa a eleição para muita gente. Voltamos a um formato mais ortodoxo: vários candidatos disputando o voto, cada um expondo suas propostas e suas biografias.

Quem vai ganhar? A resposta nunca foi fácil. E ficou mais difícil.