Título: EUA: acordo para elevar teto da dívida fracassa
Autor: Eichenberg, Fernando
Fonte: O Globo, 25/07/2011, Economia, p. 19

Obama não obtém consenso e mercados reagem mal. Republicanos e democratas trabalharão com propostas distintas

WASHINGTON. As negociações sobre o aumento do teto da dívida federal americana entram em sua última semana antes do prazo limite definido pelo governo (2 de agosto) sem o consenso em torno de uma solução que evite a moratória. Republicanos e democratas passaram o domingo trabalhando em separado na tentativa de alinhavar uma proposta para resolver o impasse. Diante do fracasso das negociações, o presidente Barack Obama convocou uma reunião de emergência com líderes democratas no fim da tarde para discutir seu plano de redução do déficit público. A conversa tampouco deu resultado.

Democratas e republicanos haviam estabelecido que tentariam chegar a um consenso até as 16h (hora local) de ontem, antes da abertura das bolsas de valores da Ásia. Pela manhã, em entrevista ao canal ABC, o secretário do Tesouro, Timothy Geithner, tentava acalmar os mercados, demonstrando otimismo na aprovação da proposta bipartidária. Mas de nada adiantou. Mercados de câmbio registravam queda do dólar frente a outras moedas, e o ouro atingiu mais um recorde, sendo cotado a US$1.618,71.

- Eles (os parlamentares) precisam apresentar isso (o plano) ao Congresso segunda-feira à noite. Para cumprir esse prazo, precisam ter certeza de que o projeto vai passar, de que será aceito pelo presidente. E isso deve acontecer hoje (ontem). Os olhos do mundo estão sobre nós - disse Geithner.

Republicanos e democratas concordam que o teto da dívida americana, hoje em US$14,3 trilhões, tem de ser elevado, mas discordam quanto ao prazo em que a extensão do limite de endividamento deve vigorar e quanto aos cortes de gastos para reduzir o déficit.

Na reunião com Obama na Casa Branca, o líder da maioria democrata no Senado, Harry Reid, discutiu um plano com cortes de US$2,5 trilhões no orçamento, sem previsão de alta de impostos, como exigem os republicanos. Ele sugere aumento de US$2,4 trilhões no teto da dívida, o que permitiria uma sobrevida para o pagamento das obrigações do Tesouro até o fim de 2012, quando serão realizadas eleições presidenciais.

No lado republicano, está sobre a mesa uma proposta emergencial de execução em duas fases. Num primeiro momento, o limite de endividamento do governo seria elevado em U$1 trilhão, o que provocaria no início do ano que vem, antes das eleições presidenciais, mais um acirrado debate para subir novamente o teto. Numa segunda etapa, seriam promovidos novos e mais profundos cortes no orçamento, determinados por uma comissão legislativa.

Chefe de gabinete de Obama: "dias difíceis"

O chefe de gabinete de Obama, William Daley, admitiu em entrevista à rede NBC ontem que os EUA vão enfrentar "dias difíceis", mas enfatizou que a economia americana e os mercados não podem continuar convivendo com dúvidas sobre a capacidade de endividamento.

O líder republicano na Câmara, John Boehner, ironizou as expectativas do governo:

- O presidente está preocupado com a próxima eleição, mas, meu Deus, ele não deveria estar preocupado com o país? - indagou de forma provocadora, em entrevista ao canal de TV FoxNews.

Boehner deixou claro que, na ausência de um prévio acordo bipartidário aceito pela Casa Branca, encaminhará o processo diretamente ao Congresso.

- Se não for possível (um acordo comum), estamos preparados para agirmos por nós mesmos.

Mais tarde, em teleconferência com membros de seu partido, frisou a necessidade de eles se manterem fiéis a seus princípios, mas deixou uma fresta para a costura de um consenso.

- Acredito numa solução. Mas vai exigir que permaneçamos unidos e vai exigir de alguns de vocês fazer sacrifícios - disse.