Título: A imprevisível Marina
Autor: Lima, Daniela
Fonte: Correio Braziliense, 23/08/2009, Política, p. 10

Marqueteiros dizem que ex-ministra embolará a sucessão. Para Lula, PT não perderá votos

Marina empunhará a bandeira do desenvolvimento sustentável

Ela é reconhecida nacional e internacionalmente como uma mulher competente no meio em que escolheu atuar. Tem histórico político pautado pela militância em movimentos de esquerda. Não fosse pelo jeito mais manso e ponderado, qualquer um poderia confundir a descrição com a da ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, escolhida pelo presidente Lula para disputar as eleições de 2010. E são exatamente as semelhanças e diferenças pontuais com a ministra que podem levar a senadora Marina Silva a se tornar uma personagem decisiva em 2010.

Marqueteiros e possíveis adversários políticos afirmam que, se subir ao palanque para disputar o Palácio do Planalto, como quer o PV, Marina pode ampliar os rumos dos debates nas eleições. Com a bandeira da preservação do meio ambiente e do desenvolvimento sustentável, pode influenciar os discursos de Dilma e do governador José Serra (SP), pré-candidato do PSDB, ambos mais alinhados a uma pauta desenvolvimentista. Se confirmada no páreo, Marina também acabaria com uma polarização nas eleições: os que estão com Lula e os que estão contra ele.

Ontem, o presidente rechaçou em visita ao Acre, estado natal de Marina, a possibilidade de ela rachar os eleitores petistas. ¿Acho que nem eu divido o eleitorado do PT. Petista é que nem flamenguista, que nem corintiano, não se divide nunca¿, afirmou Lula. Desde que anunciou sua saída do PT, a senadora tem medido as palavras. Na sexta-feira passada, por exemplo, quando o senador Aloizio Mercadante (SP) disse na tribuna do Senado que permaneceria na liderança do PT, não o atacou. A ponderação, aliás, é uma qualidade de Marina, avaliam os marqueteiros. ¿A Heloísa Helena tem uma agressividade latente que pode assustar um pouco o eleitorado. A Marina não tem isso¿, disse Chico Santa Rita. Seriam favoráveis à senadora ainda a sua biografia e o histórico político sem escândalos.

Televisão Um dos fatores determinantes para o desempenho de Marina na campanha será o tempo de propaganda eleitoral. Se conseguir formar base mais ampla com pequenos partidos, pode chegar a cinco minutos de exposição. Na avaliação de especialistas, o suficiente para construir uma imagem para o eleitorado. Dilma Rousseff, por sua vez, chegará às eleições com um reforço de peso: o presidente Lula. Ainda assim, marqueteiros alegam que a propaganda será imprescindível para fazer deslanchar a candidatura da petista. ¿O Lula pode levá-la a um bom ponto de partida, mas para ganhar a eleição ela precisará se sustentar sozinha¿, declarou Carlos Brieckmann, que já fez campanhas para o ex-prefeito de São Paulo Paulo Maluf.

Mesmo os pré-candidatos da oposição reconhecem que a possível candidatura de Marina Silva modificaria o panorama das eleições. ¿Acho importante que esta eleição não seja plebiscitária, que os temas importantes para o Brasil sejam discutidos, e não apenas quem é a favor ou contra Lula. Marina ajuda nessa direção¿, afirmou o governador Aécio Neves (MG), pré-candidato tucano ao lado de Serra.

Memória Um rosto brasileiro

A senadora Marina Silva nasceu em 1958 em Breu Velho, no Seringal Bagaço, a 70km de Rio Branco (AC). Trabalhou no seringal ao lado dos irmãos e só aos 14 anos aprendeu a contar as horas no relógio e a fazer as quatro operações básicas da matemática. Aos 16 anos, contraiu hepatite e teve de ir para a cidade em busca de tratamento médico. Resolveu ficar, trabalhando como empregada doméstica, porque queria estudar. Tinha o desejo de ser freira. Começou a frequentar as aulas do Mobral.

Na escola, aproximou-se das lideranças do movimento estudantil. A vida política começou em 1984, quando ela fundou a CUT no Acre, ao lado de Chico Mendes. Para ajudar Mendes na candidatura a deputado estadual, Marina filiou-se ao PT em 1985, fazendo, nas eleições do ano seguinte, a dobradinha com o líder seringueiro e candidatando-se a deputada federal. Na ocasião, ficou entre os cinco concorrentes mais votados no estado, mas não conquistou a vaga para a Constituinte.

Desde então, galgou cargos até chegar ao Senado e ao ministério. É essa trajetória que preocupa o Planalto. Marina tem a cara de Lula, ou a fisionomia do povo, como diz um aliado do presidente. Ou seja, um baita trunfo de que não dispõe a ministra Dilma. (DL)