Título: EUA a 72 horas do calote
Autor: Eichenberg, Fernando
Fonte: O Globo, 30/07/2011, Economia, p. 29

Senado rejeita plano da oposição que acabara de passar na Câmara. PIB do país cresce só 1,3%

Por apenas dois votos a mais que o necessário, 218 a 210, o líder da maioria republicana na Câmara, John Boehner, conseguiu aprovar no início da noite de ontem sua proposta para elevar o teto da dívida dos Estados Unidos (22 republicanos votaram contra). Mas apenas duas horas depois o projeto de lei foi rejeitado pelo Senado, de maioria democrata, por 59 votos a 41. Este fim de semana, os parlamentares terão de correr contra o relógio - faltam 72 horas - para fechar um acordo que impeça um calote no próximo dia 2, o que agravaria ainda mais a já debilitada economia do país. Essa fraqueza foi reforçada pela divulgação do Produto Interno Bruto (PIB, soma de bens e serviços produzidos no país) ontem, com crescimento de 1,3% no segundo trimestre, na taxa anualizada, abaixo do 1,8% esperado por analistas. O desempenho ruim deveu-se aos gastos do consumidor, que ficaram praticamente estagnados.

O presidente Barack Obama, que havia reclamado do "desperdício de tempo" dos republicanos ao insistirem em uma proposta que seria rejeitada, já se disse disposto a trabalhar todo o fim de semana. Após a derrota da proposta de Boehner no Senado, a própria Câmara se dispôs a discutir o plano do senador democrata Harry Reid. Este propõe cortes de gastos de US$2,2 trilhões em dez anos e a elevação do teto da dívida, hoje em US$14,3 trilhões, até o fim de 2012. O governo disse em nota que o plano de Reid não só reduz mais o déficit que o projeto de lei republicano "como também elimina a incerteza em torno do risco de moratória".

Moody"s não vê moratória imediata

Antes da votação na Câmara, Obama enfatizara a urgência de um acordo bipartidário para "sairmos dessa confusão":

- O que está claro agora é que qualquer solução para evitar uma moratória precisa ser bipartidária. Não é uma situação na qual as duas partes estejam a quilômetros de distância.

Ele voltou a convocar os americanos a pressionarem os parlamentares por Twitter, e-mail ou telefone, porque "o tempo acabou". O plano de Boehner era menos ambicioso que o de Reid: cortes de US$917 bilhões e aumento do limite da dívida em só US$1 trilhão, o que exigiria novo debate antes das eleições presidenciais de 2012. Para obter o apoio da ala mais conservadora do partido, ligada ao movimento Tea Party, ele condicionou o aumento do teto a uma emenda constitucional com regras para reduzir o déficit.

Os 20 sócios privados do Tesouro que participam das negociações da dívida se reuniram ontem em Nova York com diretores da instituição. "Houve um consenso entre os participantes em dizer que o Congresso deveria agir o quanto antes para elevar o teto da dívida pelo maior período possível, a fim de dissipar a nuvem de incerteza que paira sobre a economia", informou o Tesouro em nota.

A agência de classificação de risco Moody"s informou ontem que não haverá um rebaixamento imediato do rating do crédito soberano dos EUA, hoje na nota máxima, "AAA". Mas a perspectiva deve ficar negativa. A decisão dependerá do desempenho da economia em 2012. Segundo a Moody"s, mesmo sem acordo, o Tesouro deve cumprir suas obrigações, o que postergaria o cenário de moratória.

Segundo o Centro Bipartidário de Política (BPC, na sigla em inglês), órgão do Congresso, o governo arrecadará US$172,4 bilhões entre 3 e 31 de agosto, mas deverá arcar, no mesmo período, com despesas de US$306,7 bilhões - ou seja, haverá um rombo de US$134,3 bilhões. Na falta de um acordo para elevar o teto da dívida, o governo terá de estabelecer prioridades nos pagamentos. Segundo o BPC, os principais pagamentos nos próximos dias são os programas Medicare/Medicaid (US$50 bilhões); benefícios da Previdência (US$49,2 bilhões); contratos de defesa (US$31,7 bilhões); vencimentos de títulos do Tesouro (US$29 bilhões); e seguro-desemprego (US$12,8 bilhões). O BPC calcula que, sem elevação do teto da dívida, o Tesouro só tem como cumprir as obrigações até 10 de agosto.

(*) Com agências internacionais