Título: Poderosas
Autor: Gois, Chico de
Fonte: O Globo, 30/07/2011, O País, p. 12

Presidentes dos dois maiores países da AL, Dilma e Cristina relembram antecessores

BRASÍLIA. Duas mulheres independentes, geniosas, que estão no comando dos dois maiores países da América do Sul, reuniram-se ontem para discutir os rumos das relações entre Brasil e Argentina, mas o que se sobressaiu nos diversos discursos que fizeram - pelo três cada uma - foi o saudosismo em relação a seus antecessores. Dilma Rousseff e Cristina Kirchner fizeram várias referências aos seus mentores políticos, os ex-presidentes Lula e Néstor Kirchner, com elogios para todos os lados.

Enquanto Dilma lembrava que a estruturação da Unasul (união dos países sul-americanos) foi impulsionada por Kirchner, Cristina destacava que Lula assumiu o poder com uma preocupação social. Depois, quando Dilma frisou que Lula deu destaque à ligação entre Brasil e Argentina, Cristina disse, em lágrimas secas, que Kirchner saíra de uma pequena província para ganhar as eleições e acabar com a alta inflação que assolava o país. Parecia uma disputa entre as duas mandatárias para ver quem elogiava mais o antecessor.

Como faz desde a morte de Néstor, em outubro do ano passado, Cristina chegou ao Planalto toda de preto e com uma bolsa a tiracolo, que desencadeou um burburinho entre as mulheres presentes à solenidade - "Por que a presidente carregava uma bolsa?" Mas, antes da subida da rampa, ela se desfez do acessório, repassado para sua chefe do cerimonial.

Depois de ouvirem os hinos de cada país na rampa, Dilma pegou Cristina pelo braço e a conduziu para o tapete onde a praxe dita que os chefes de governo se cumprimentem para uma foto protocolar, sempre sorrindo.

Mas Cristina quebrou o protocolo e ficou de ti-ti-ti com Dilma, que não conseguia disfarçar o nonsense da situação. O que pouco se conseguiu ouvir é que Cristina disse que havia chegado ao Brasil por volta de 2h da madrugada, vinda da posse de Ollanta Humala na presidência do Peru - Dilma chegou por volta de 1h. Agenda pesada para ambas nas últimas horas.

Diante de uma agenda predominantemente econômica, com as duas presidentes pregando a união para enfrentar a crise financeira dos EUA e da Europa, Cristina, bem ao estilo Lula, disse que a única coisa que separa Brasil e Argentina é o futebol. Bem-humorada, porém, ela lembrou que os dois países acabaram unidos ao serem desclassificados na Copa América.

Embora não constasse inicialmente da agenda, Dilma decidiu ir prestigiar a inauguração da nova sede da embaixada da Argentina, ao lado de Lula, especialmente convidado por Cristina, de quem é amigo. Uma placa no local lembrava Kirchner.

Na inauguração, foi a fez de Lula se desmanchar em elogios a Dilma e Cristina:

- Sou um cristão que acredita que a vida não termina quando nosso corpo se vai. E acredito que Kirchner, neste momento, deva estar pensando: pobre do Lula e de mim. A presidente Dilma e a presidente Cristina vão fazer história na América do Sul e na América Latina.

Segundo Lula, no passado não se imaginava que duas mulheres estariam presidindo as duas maiores nações da América Latina, duas mulheres especiais, disse ele, por serem militantes políticas, terem perfil ideológico definido e por saberem para quem estão governando:

- As duas juntas terão mais forças que Kirchner e eu, porque as pessoas têm mais respeito por mulheres que por homens. As duas juntas no G-20 vão mudar um pouco a política mundial, a geopolítica do Conselho de Segurança da ONU. Essas duas mulheres, com sua história, sua formação, seu caráter, o compromisso que têm de luta, vão deixar bem pequenos Kirchner e eu na História de Brasil e Argentina.

COLABOROU: Isabel Braga