Título: Investidor sai de fundos de ação da Petrobras
Autor: Bôas, Bruno Villas
Fonte: O Globo, 01/08/2011, Economia, p. 24

Aplicação teve origem na capitalização e perde até 12% desde setembro com mau desempenho dos papéis na Bolsa

Passados dez meses da capitalização da Petrobras, cerca de 10% dos pequenos investidores que colocaram dinheiro nas ações da companhia via fundos de investimento abandonaram o barco. Seis fundos criados por grandes bancos acumulam prejuízo de 11% a 12% desde setembro do ano passado, quando foram especialmente criados para atender principalmente pessoas físicas na oferta pública da estatal, a maior da história mundial e que levantou R$120 bilhões no mercado.

Dos 18.816 investidores que foram atraídos por esses fundos de investimento em ações, 1.850 tinham vendido completamente suas cotas até a última quinta-feira, segundo dados levantados pelo GLOBO em documentos enviados pelos fundos de ações à Comissão de Valores Mobiliários (CVM). A maior fuga ocorreu no fundo da Caixa, seguida por Bradesco, Banco do Brasil, Santander, Itaú Unibanco e HSBC.

O fracasso desses fundos até aqui está relacionado ao mau desempenho das ações da Petrobras negociadas na Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa). Os papéis preferenciais (PN, sem voto) da companhia acumularam uma queda de 12,26% no ano até sexta-feira passada. Já as ações ordinárias (ON, com voto) da empresa recuaram 13,32% nesse mesmo período.

Gustavo Cerbasi, especialista em finanças, lembra que os investidores que venderam as cotas assumiram um prejuízo. Mas afirma que isso não foi necessariamente uma escolha ruim. Para ele, tudo depende da estratégia que o investidor adota ao deixar o fundo.

- Quem saiu porque adotou uma estratégia defensiva e aplicou num fundo de ações que paga bons dividendos (parcela do lucro distribuído aos acionistas) fez bom negócio. Quem saiu porque ficou assustado, preferiu colocar o dinheiro na renda fixa, deveria ter olhado o longo prazo - afirma Cerbasi.

Papel aparece na metade das carteiras das corretoras

Segundo William Castro Alves, analista da XP Investimentos, o tombo dos papéis reflete, primeiro, o momento de turbulência nos mercados externos, o que tem afetado as bolsas de valores em todo o mundo. O Ibovespa, índice de referência do mercado, acumula este ano uma queda de 15,12%. Essa perda é, portanto, inclusive maior do que a da Petrobras. Mas as ações da estatal também foram vítimas da desconfiança de investidores com a ingerência do governo sobre a companhia.

- Vimos a interferência do governo no caso do reajuste do preço da gasolina, por exemplo. Isso vai afetar o balanço da companhia neste segundo trimestre - avalia.

Os pequenos investidores foram os que mais perderam ao entrar na capitalização da Petrobras, considerando o peso que uma aplicação em ações tem em suas finanças e as dificuldades que eles têm para realizar operações mais sofisticadas e se defender das perdas do papel.

Uma parte dos investidores aderiu à oferta consciente dos riscos. Outra entrou seduzida pela propaganda oficial em torno das ações, algo jamais visto no mercado de capitais brasileiro. Poucos dias antes do fim da capitalização, quando ainda era possível reservar a compra dos papéis, o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse que a capitalização seria importante para garantir que "o pré-sal seja nosso" e fortalecer "a nossa Petrobras".

O empresário Antônio Dias Lopes Filho foi um dos investidores da capitalização da Petrobras. Ele investiu R$14 mil na capitalização da Petrobras ao comprar cotas numa agência da Caixa na Praça Mauá, no Rio. Antônio afirma que conhecia o mercado de renda variável e sabia dos riscos da oferta. Mas não deixou de se decepcionar com o desempenho da ação.

- O preço das ações estava excelente, barato. Por isso entrei na oferta. Só que o preço da ação continuou caindo depois da capitalização e aquele barato, na verdade, agora foi um preço caro. E para piorar, o mercado tem andado muito complicado, com a maioria das ações em queda - explica Lopes Filho, que pretende manter a aplicação e esperar uma recuperação.

Na última semana, investidores tiveram certo alívio após o Conselho de Administração da Petrobras aprovar o Plano de Negócios da companhia, que já havia sido recusado pelo menos duas vezes pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, que preside o conselho. O Plano de Negócios prevê investimentos de US$224,7 bilhões, apenas US$700 milhões acima do valor do plano 2010/2014.

- O plano aumentou investimentos em exploração e produção, o que é importante para o pré-sal. E isso agradou também porque esses recursos foram tirados de áreas menos rentáveis, como refino. A Petrobras aumentou ainda a projeção de produção de petróleo para 2020 - avalia Osmar Camilo, analista da corretora Socopa.

Ninguém no mercado recomenda a venda das ações da Petrobras. Mas nem todo mundo também recomenda a compra. Em julho, o papel da Petrobras estava em uma a cada duas carteiras de ações sugeridas por corretoras a clientes. O potencial de crescimento do papel estimado pela TOV e Souza Barros chegava a 66% nos próximos 12 meses. Mas não existe qualquer garantia de retorno na aplicação. Em relatório, a equipe de pesquisa do banco Barclays considerou positivo o plano de negócios e prevê um potencial de crescimento de 59% no preço do papel.

Ação é a mais barata entre as gigantes do petróleo

Os especialistas apontam um bom potencial de valorização baseados num indicador chamado preço/lucro (PL), que consiste em dividir o preço de uma ação pelo lucro por ação pago por uma companhia. No caso da Petrobras, esse PL é de 6,6 vezes. Outras petrolíferas do porte da estatal tem esse indicador acima de 10 vezes. É o caso da americana Exxon Mobil (12) e Petrochina (11,83).

- A ação está barata. E pode começar a andar se o cenário externo melhorar. Um eventual reajuste da gasolina ajudaria ainda mais isso - lembra Erick Scott, da SLW Corretora, que recomendou a compra das ações aos clientes.