Título: Escoteiro
Autor: Vidor, George
Fonte: O Globo, 01/08/2011, Economia, p. 21

Ao se tratar de finanças públicas, a melhor posição é a do escoteiro: sempre alerta. Espanha e Irlanda, antes da crise de 2008, registravam superávits em suas contas e depois mergulharam em déficits gigantes. Feita a ressalva, economistas do BNDES calculam que a política fiscal este ano já esteja contribuindo no Brasil para uma contração de 0,8% do Produto Interno Bruto (PIB).

E o próprio banco, que pôs muita lenha na fogueira em 2009 (absolutamente necessário) e 2010 (nem tanto), está reduzindo sua participação no total do crédito concedido e, com isso, poderá contribuir este ano com uma contração de 0,2% a 0,4% na variação do PIB.

Se essa tendência for mantida - como prometem as autoridades, e nesse caso devemos permanecer na posição do escoteiro - a política monetária pode mesmo dar uma trégua na escalada das taxas de juros graças à ajuda da política fiscal, que tirou o pé do acelerador, já reduzindo a velocidade. E, quem sabe, até ficar uns tempos no atual patamar, pois a economia brasileira perderá fôlego (não deixará de crescer em 2011 e 2012, mas crescerá menos), e a inflação idem.

A biotecnologia às vezes atira no que vê e acerta no que não viu. Anos atrás, as fundações criadas pelo ex-presidente americano Bill Clinton e pelo maior empresário do segmento de software, Bill Gates, financiaram pesquisas voltadas para neutralização da malária, doença equatorial que ainda ameaça milhões de pessoas na Ásia, na África e nas Américas. Avanços importantes foram obtidos nessa pesquisa, mas como consequência indireta chegou-se a um processo que possibilita a produção de um óleo diesel totalmente verde, a partir da cana- de-açúcar.

Rodando com uma mistura de 10% de diesel de cana, alguns ônibus do Rio de Janeiro começam hoje a testar o novo combustível. Testes preliminares foram positivos e estima-se que os ônibus possam rodar com até 100% de diesel de cana (até mesmo os de frotas antigas, desde que tenham dispositivos eletrônicos, passíveis de pequenos ajustes).

O diesel de cana tem perspectiva promissora, pois, se hoje é mais caro que o diesel comum, estima-se que até 2015 ambos estejam emparelhados. E as pesquisas que caminham para a produção de etanol a partir da celulose (folhas e bagaço da cana) favorecem até mais o diesel verde, que não precisa de um teor de sacarose tão alto na matéria-prima para ser produzido.

A nova geração de motores combinada ao uso de combustíveis mais limpos em veículos pesados proporcionará uma considerável redução nos índices de emissão de poluentes, mas também a racionalização do transporte público é fundamental para a melhora da qualidade do ar nos grandes centros urbanos. Com 300 quilômetros de BRTs (vias expressas), a frota de ônibus no município do Rio reduziria em 50% as emissões de poluentes, por causa da substituição de veículos comuns pelos articulados e do aumento da velocidade média aliada a uma maior eficiência energética. No momento estão sendo construídos 83 quilômetros dessas vias na cidade.

Os chamados BRS, vias seletivas em eixos de grande movimento, vêm dando também bons resultados. Cerca de cem ônibus deixaram de circular por Copacabana depois dos BRS, pois em vez de cada veículo transportar 13 passageiros nos trechos do bairro, a média aumentou para 23. E a velocidade média dos ônibus subiu de 12 quilômetros para 25 quilômetros por hora. A melhora do serviço atraiu mais 5% de passageiros para os ônibus. Com a adoção do BRS em Ipanema e Leblon, menos 10% dos ônibus irão circular pelos dois bairros.

A prefeitura obrigou as empresas de ônibus a repassar para os passageiros, em forma de mais conforto, parte da redução de custo que as companhias tiveram. Em breve, começarão a circular na cidade ônibus semelhantes aos de Paris e Nova York, com suspensão mais adequada, suavizando os balanços e possibilitando, nas paradas, ligeira inclinação do veículo de modo que os passageiros consigam embarcar e desembarcar ao mesmo nível das calçadas. Desde já o país precisa estar preparado para os grandes eventos que sediará nos próximos anos, como a Copa do Mundo e os Jogos Olímpicos.

Por falar em ônibus, uma curiosidade: há alguns anos começou a circular pela orla do Rio um ônibus preparado para transportar surfistas e suas pranchas (são quatro saídas diárias, no sentido de ida e de volta); a ideia agora é que seja criada uma linha na direção da Zona Norte, porque o número de surfistas que moram longe das praias vem aumentando, e muitos deles são obrigados a alugar espaços perto da orla para guardar suas pranchas por não terem como transportá-las. Só no Recreio dos Bandeirantes, estariam guardadas mais 300 pranchas de surfistas da Zona Norte e dos subúrbios.

O estaleiro Eisa lançou ao mar o primeiro dos quatro navios de apoio a plataformas de petróleo encomendados pela empresa Astromarítima, uma das poucas do setor que ainda é mantida sob controle de capitais nacionais. Empresa familiar, agora já com a segunda geração à frente (Renato Cabral assumiu a presidência, depois de uma carreira fora da companhia, na prestação de serviços submarinos para o setor de petróleo), a Astromarítima espera construir 14 novos navios de apoio. Recentemente resolveu estender os negócios para atividades correlatas à navegação de apoio, com a criação da Deepwater. O objetivo é ocupar o espaço de alguns serviços em águas profundas que as grandes companhias, geralmente internacionais, não manifestam interesse.