Título: Droga vira flagelo social em Pernambuco, onde está presente nos 184 municípios
Autor: Herdy, Thiago
Fonte: O Globo, 28/07/2011, O País, p. 3

"Acho que o crack transformou-se em bomba de Hiroshima", diz coordenador de ONG

RECIFE. Só este ano, a Polícia Federal e as polícias Militar e Civil de Pernambuco já tiraram de circulação no estado o equivalente a 6,810 milhões de pedras de crack, de acordo com a quantidade de pasta-base de cocaína apreendida. Numa média, esse número equivale a 4,43 pedras por habitante da capital pernambucana.

O crack virou um flagelo social no estado e está presente em todos os 184 municípios.

- Acho que o crack transformou-se em uma bomba de Hiroshima, pelo menos aqui em Recife - disse ontem Demétrius Demétrio, fundador e coordenador da Comunidade Pequenos Profetas, que mantém um centro de atendimento a meninos e meninas de rua. No casarão, com três mil metros quadrados de área, cerca de 60 crianças são atendidas por dia.

- Quando comecei a trabalhar com eles, nos anos 80, os meninos cheiravam gasolina. Depois, passaram a consumir cola e injetáveis. Hoje, injetáveis praticamente não existem, e o crack está em quase todas as situações - disse Demétrius, que convive todo dia com jovens que sofrem com agitação, problemas psicomotores, arritmias cardíacas, tosses crônicas e indiferença sexual provocados pelo crack.

As estimativas mais conservadoras indicam que no estado haveria entre 30 mil e 60 mil consumidores. Só na capital, são cerca de 400 pontos de venda da pedra, de acordo com a polícia e autoridades que fazem campanha contra o consumo de drogas, como é o caso do deputado Clayton Collins (PSC), ex-dependente químico que hoje ajuda na recuperação de viciados.

Ele diz que as políticas públicas ainda não se mostram eficientes para o combate e que, no estado, há 50 comunidades terapêuticas mantidas por organizações não governamentais que agora começam a somar esforços com o governo estadual.

Em Pernambuco, desde o ano passado, foram realizadas oito conferências regionais, reservados 72 leitos em dez hospitais para desintoxicação e capacitados dez mil profissionais. Também entraram em funcionamento seis centros de atendimento e foi adotado um programa educacional de resistência às drogas. De acordo com a Secretaria de Direitos Humanos, o programa conta com a participação de oito secretarias de estado. A Prefeitura de Recife, por sua vez, não tem programa de enfrentamento da droga.

- O crack transformou-se em foco não só do Departamento de Repressão ao Narcotráfico, mas de todo o estado - disse o delegado Luiz Andrey Viana de Oliveira, titular do Denarc.

Ele mostrou como o consumo da droga cresce assustadoramente no estado. Em 2009, foram apreendidos 4,5 quilos de pasta-base de cocaína. Em 2011, somando os números do Denarc, de outros órgãos da Polícia Civil e da PM, já foram apreendidos 595 quilos do crack (pronto para ser dividido em pedras). Na PF, a quantidade de pasta-base apreendida em 2011 já é 3,2 vezes maior que a registrada em todo o ano de 2010, e o total de crack quase dobrou no mesmo período.

No Ceará, os problemas causados pelo crack resultaram na criação do Pacto pela Vida, fórum de discussão para propor políticas públicas de prevenção, tratamento, repressão ao tráfico e reinserção social dos usuários. Liderado pela Assembleia Legislativa, em parceria com 220 instituições, o movimento já chegou a 120 dos 184 municípios cearenses.

- A violência está ligada às drogas de uma maneira geral. E, quando junta o crack, ela se torna mais bárbara. Precisamos saber como enfrentar isso - diz o deputado estadual Lula Morais, responsável pelo Pacto pela Vida.

Para Preto Zezé, presidente da Central Única das Favelas (Cufa), ONG que realiza projetos voltados a usuários de crack, dois deles com apoio dos ministérios da Justiça e da Saúde, "as ações, porém, ainda são tímidas para a dimensão do problema".