Título: Forças militares sírias matam ao menos 80
Autor:
Fonte: O Globo, 08/08/2011, O Mundo, p. 26
ONU, EUA e Liga Árabe pedem o fim da violência no país, onde cerca de 2 mil já morreram desde março
DAMASCO, Síria
A despeito da severa condenação internacional, pelo menos 80 civis teriam sido mortos ontem na Síria, pelo Exército. O maior número de vítimas, cerca de 50, foi feito durante a invasão de Deir al-Zour, a maior cidade do leste do país e principal cenário dos recentes, e frequentes, protestos por democracia.
O acesso da imprensa internacional ao país foi severamente restrito e, por isso, é praticamente impossível a verificação independente do relato de ativistas e testemunhas. De acordo com ativistas, diversos tanques e veículos blindados invadiram várias áreas da cidade depois de um forte bombardeio que teria começado pouco antes do amanhecer.
Pelo menos 26 outras pessoas foram mortas na província de Homs, e outras seis em Idlib, no nordeste do país, ainda segundo ativistas. Desde que os protestos começaram, em meados de março, em meio às revoltas que varreram diversos países da região, pelo menos 1.700 civis teriam sido mortos e milhares presos.
O presidente Bashar al-Assad defendeu a ação de suas forças militares. "A Síria está no caminho da reforma", ele teria dito ao ministro das Relações Exteriores, Adman Mansour, segundo a agência estatal de notícias, Sana. "Lidar com foras-da-lei que bloqueiam estradas, isolam cidades e aterrorizam moradores é dever do Estado, que deve defender a segurança e proteger as vidas dos civis", acrescentou.
As declarações foram divulgadas logo depois que o secretário-geral das Nações Unidas, Ban Ki-Moon fez um apelo direto ao presidente para que as forças militares do país não fossem usadas contra civis.
Em um telefonema para Assad no sábado, Ban "expressou sua grande preocupação, e de toda a comunidade internacional, em relação à escalada da violência e ao aumento do número de mortos na Síria nos últimos dias", segundo relatou um porta-voz das Nações Unidas.
Foi o primeiro comunicado do tipo em vários meses. De acordo com as Nações Unidas, Assad vem se recusando a aceitar ligações do secretário-geral. Moon não foi o único a reprovar a violência no país ontem. Em comunicado, o Conselho de Cooperação do Golfo condenou "o excessivo uso da força" e pediu "o imediato fim da violência". A Liga Árabe também expressou sua "crescente preocupação" com a situação, de acordo com a agência de notícias do Qatar, QNA.
O rei da Arábia Saudita, Abdulah Abdulah, também afirmou que a violência é inaceitável e ordenou a retirada de seu embaixador na Síria. O primeiro-ministro da Turquia, Recep Erdogan, disse que Ancara "já perdeu a paciência" com o regime de Assad, e que não poderia mais "se manter como espectador" dos eventos que se desenrolam em sua fronteira.
Ele anunciou que estava enviando o seu ministro das Relações Exteriores, Ahmet Davutoglu, a Damasco amanhã com uma dura mensagem ao governo sírio. Fontes ligadas a Assad, no entanto, já disseram que a resposta seria "ainda mais dura".
O embaixador americano na Síria, Robert Ford - que irritou o governo ao participar de um protesto na província de Hama, no mês passado, e se encontrava fora do país -, retornou afirmando que era "importante reunir testemunhas do que o governo sírio está fazendo". Ford afirmou em entrevista ao programa de televisão ABC News que pretende "aumentar a pressão" sobre o regime.
Cerco a Deir al-Zour e atiradores de elite
Testemunhas relataram que o bombardeio de Deir al-Zour, a cerca de 450km da capital Damasco, começou antes do amanhecer de domingo, seguido pela invasão, por um grande número de tanques e veículos blindados, de diferentes áreas da cidade.
- Estamos cercados por forças militares, aparatos de segurança e criminosos a serviço do governo - afirmou um morador local ao serviço mundial da BBC.
Ele contou que nenhum protesto estava ocorrendo na cidade, mas que, mesmo assim, as forças do governo ameaçavam atacar hospitais e ambulâncias.
Os feridos no ataque estavam sendo atendidos em clínicas improvisadas no interior de mesquitas. Alguns corpos teriam sido enterrados em parques, já que o acesso ao cemitério estaria bloqueado, segundo moradores.
O Comitê de Coordenação Nacional da Revolução Síria informou que pelo menos 50 pessoas foram mortas na cidade.
- O número de vítimas aumenta a cada hora - afirmou o membro do comitê Suhair al-Atassi.
O Comitê Local de Coordenação, um grupo ativista que documenta e organiza protestos, afirmou que nove distritos teriam sido atacados, mas que o maior número de vítimas teria sido registrado em al-Joura, onde atiradores de elite ocuparam posições-chave nos telhados dos prédios mais altos da cidade.
Os ativistas contaram ainda que as pessoas tampouco conseguiam sair da cidade, uma vez que havia tropas por toda parte.